Duas palavrinhas que podem significar nada ou tanto, ignorância ou sabedoria. No cotidiano, quantas vezes não as dizemos a propósito de t...

Não sei

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Duas palavrinhas que podem significar nada ou tanto, ignorância ou sabedoria. No cotidiano, quantas vezes não as dizemos a propósito de tantas coisas? Fazem parte de nosso vocabulário comum e necessário, pois quanto desconhecemos de quase tudo! Fazem parte também do léxico dos professores, filósofos e sábios honestos, que não se envergonham nem se diminuem com a admissão eventual do não saber.

Assistindo a uma entrevista de Luiz Felipe Pondé, chamou-me a atenção quando ele disse que, em filosofia, “não sei” é uma resposta profunda. Veja só.
E eu nunca tinha me dado conta dessa verdade, apesar de muito admirar a sabedoria de Sócrates quando afirmou que só sabia que nada sabia. Continuando, Pondé acrescentou que “quem tem muitas certezas é porque leu pouco e pensa pouco”. Sim, como negar?

E no entanto quantas certezas são proclamadas por tanta gente todos os dias. Seria o caso de perguntar quem está com a razão: Sócrates ou esses arrogantes do dia a dia? Algumas coisas sabemos, claro, como as comezinhas do tipo “sei que não gosto de quiabo”, mas e as importantes, relativas às grandes questões existenciais e filosóficas? Podemos dizer, com autoridade indiscutível, que as sabemos?

Não entro aqui, evidentemente, no terreno da fé religiosa. Sei, e isto posso dizer, que os crentes “sabem” muitas coisas e têm muitas certezas. Por exemplo, para os cristãos, existe vida depois da morte, na qual os justos serão abençoados, ao contrário dos ímpios. Outros acreditam que, se morrerem heroicamente pela crença, serão recebidos no paraíso por setenta virgens complacentes. E ainda outros creem em sucessivas reencarnações. Estarão certos? Não sei, não sabemos, não podemos saber.

Muitas pessoas têm vergonha de dizer “não sei”. Um professor deve conhecer os saberes básicos de sua disciplina. Mas não é obrigado a saber de cor o que for muito além de sua obrigação. E, quanto a esse saber que extrapola, deve ter a humildade de, se for o caso, dizer simplesmente “não sei”.
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Usman Yousaf
Entretanto, sabemos, há muito docente que não admite não saber, e aí tenta enrolar os alunos, achando ingenuamente que eles não percebem.

Os políticos, de maneira geral, têm aversão ao “não sei”. Para eles, em regra, as duas palavrinhas demonstram fraqueza, incompetência. Então, é imperioso sempre saber tudo, com total segurança, até mesmo o preço do dólar no próximo ano. O encanador deve saber trocar uma torneira, mas não se pode exigir que saiba exatamente onde é o vazamento subterrâneo que nos tira o sono. Antes de cavar todo o quintal inutilmente, ele apenas deve dizer que não sabe e recomendar que se chame a repartição especializada. O seu honesto “não sei” significará para nós economia de tempo e de dinheiro.

No terreno afetivo, a honestidade de um “não sei” é fundamental e pode esclarecer muita coisa, evitando ou atenuando sofrimentos. Por que temer o(a) parceiro(a) dizer que não sabe se ainda ama o(a) outro(a) ou se ainda quer manter a relação? Nesses casos, um “não sei” já é uma resposta que vale por si, pois o não saber tem implicações, já que muitos não conseguem viver com tais dúvidas.

A importância, a honestidade, a conveniência, a sabedoria e a profundidade de não saber. Desconfiemos de quem sabe tudo. Principalmente dos que querem impor a todos as suas certezas. E prezemos a liberdade (e o direito) de poder dizer “não sei”. Muita vez, não saber — e admiti-lo — já é saber muito.

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  1. Perfeito. Quando v. mencionou a célebre frase de Sócrates, lembrou-me estes versos de "Trigal com Corvos", meu primeiro poema longo ( o "1/6" - que acabo de lançar - é o quinto ):
    "Sócrates disse
    “Só sei que de nada sei”.
    E Arcesilau
    com muito humor e sutileza:
    “Eu
    nem disso tenho certeza”.

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  2. Sua reflexão nos deve acompanhar diuturnamente, Gil. O saber é um poço profundo e perene, e cada homem só consegue retirar desse poço, quando muito, apenas um pequeno balde de cada vez.

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