Rastreando o tempo e os motivos que vieram justificar o renome secular de Castro Pinto, Flávio Ramalho de Brito toca, de passagem, em San...

Santos Netto e Augusto

Rastreando o tempo e os motivos que vieram justificar o renome secular de Castro Pinto, Flávio Ramalho de Brito toca, de passagem, em Santos Netto. Trata-se de um filho do grande Artur Aquiles, legendário do interesse público através de O Comércio, jornal do começo do século 20, que repercute até hoje. O filho, Santos Netto, foi colega de Faculdade e certamente o de amizade mais próxima de Augusto dos Anjos. Não deixa de ter influído na inserção dos primeiros versos do poeta no jornal famoso.

É a Santos Netto que Augusto abre exceção para a dedicatória de um poema, o Poema negro. Duas outras são para Heitor Lima, amizade do Rio, e ao filósofo Farias Brito. E num dos capítulos de seu Perfis do Norte, Santos Netto, delegado no Rio de Janeiro, descreve com minúcias o que se sabe da excentricidade do estudante, do companheiro de Faculdade, do poeta e do homem que encarna a bela metáfora de Órris, o pássaro molhado, repetida por José Américo e da qual me servi para fazer de um discurso de 6 laudas, nos 50 anos do Eu, em 1962, um caderno inteiro, bem arejado, de quatro páginas. Pássaro molhado, todo encolhido, que monologando a feitura do verso ou declamando agigantava-se. É o que descrevem Órris, José Américo, Ademar Vidal, que conviveram ou deambularam com ele. Mas que vai se apequenando, encolhendo-se, fora da sala de aula ou da poesia.

É nessa parte que o depoimento de Santos Netto nos leva a estranhar o completo despreparo do advogado e professor Augusto dos Anjos para o arranjo da vida. Depoimento a que vem se arrimar o infortúnio das vicissitudes. Tinha competência para a cátedra, tanto quanto João Ribeiro, mas não tinha padrinho.
E o mérito nem sempre vinha do concurso, mas do prestígio. No emprego e em tudo: Castro Alves soube ir a Alencar para chegar a Machado, que era o crítico da voga. Augusto não soube ir sequer aos parentes poderosos, como Álvaro Machado senador, depois de governador. A mãe de Augusto reclama em carta: "Volte a Álvaro!” Ele preferia escalar o morro, de pulmões cansados, para garantir a pensão com aulas particulares. Aulas de meninos pobres. José Oiticica, que morou na mesma hospedaria, dá esse depoimento. Vivia de casa em casa, de pensão em pensão, interino de sempre em todos os colégios, do Liceu da Parahyba ao Ginásio Nacional.

Decadência da família com a perda do Engenho? Nem tanto por isso, creio. Os irmãos, do mais velho ao mais novo, souberam escapar ao declínio. Um deles tem anúncio qualificado no Almanack da Paraíba de 1909. Dona Carmem Coelho vai encontrar esse rico irmão do poeta no mais belo palacete de Tambiá. Odilon, advogado no Rio, financia-lhe o livro. Todos souberam superar, e bem, a decadência do Pau d’Arco. Todos souberam ser feras entre feras. O que soube Augusto?:

“Para iludir minha desgraça, estudo,
Intimamente sei que não me iludo.
Para onde vou (o mundo inteiro o nota)
Nos meus olhares fúnebres carrego
A indiferença estúpida de um cego
E o ar indolente de um chinês idiota.”


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  1. Raíssa Romero20/11/21 21:48

    Ótimo texto sobre o escritor paraibano Augusto dos Anjos, retrata de maneira leve e fiel a pouca ambição e o despreparo do poeta para o arranjo da vida. E no entanto, apesar das adversidades da vida e da decadência do engenho de sua família, ele conseguiu se tornar um grande poeta de seu tempo, e escrever poemas belíssimos, que são apreciados por pessoas que entendem de arte e de boa cultura, e também por pessoas mais simples e que apreciam os bons momentos da vida.

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  2. Augusto na letra de Gonzaga Rodrigues, o final de tarde de domingo ficou completo.

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  3. Obg meu amigo Gernano Romero

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