Estivemos em Braga, no final de semana passado (22-24/03), em casa de amigos brasileiros, que nos receberam muito bem. Conversa boa, regada a um bom vinho e bem apascentada com excelente comida e passeios por essa cidade aprazível e florida, apresentando em cada canto e recanto a sua herança histórica e cultural.
Além de máquina de guerra, Roma era, sobretudo, uma máquina de construção civilizatória, levando estradas, aquedutos, fóruns, bibliotecas, circos e anfiteatros, às cidades que ocupava, tornando-as parte do império. É, portanto, com um sentido civilizatório que, a partir de Augusto, Braga se constrói com a lógica romana de uma engenharia prática. Anda-se em Braga, sem qualquer dificuldade, tendo em vista o seu traçado ortogonal, sempre remontando ao seu centro histórico.
Nas nossas andanças, sob um sol de 30 graus, visitamos o sítio arqueológico mais importante de Braga, dentro do perímetro ortogonal da cidade, na Colina do Alto da Cividade — as termas do tempo do
Estátua de Augusto, em Braga.
O teatro físico, construído pelos gregos, era mais apropriadamente chamado de anfiteatro (ἀμφιθέατρος). O termo, em grego, significa “lugar em que se vê tudo ao redor, tudo em torno” (anfi, άμφι, ao redor, em torno; teatro, θέατρος, lugar onde se vê ou se assiste a um espetáculo), cuja raiz se encontra no verbo theáomai (θεάομαι), a mesma de teoria, “a ação de ver e de contemplar”. Em suma, o teatro é o lugar para se ver algo; o anfiteatro é o lugar de onde se pode ver algo, de todos os lados.
O anfiteatro era construído tendo como arrimo uma encosta de pedra, que lhe servia, duplamente, de apoio seguro e de ponto de reverberação do som, devido ao seu desenho semicircular, de tal modo que o que se falava no proscênio ou na orquestra chegava aos espectadores que estavam sentados nos degraus mais altos, construídos em aclive, permitindo ao espectador ver o espetáculo sem ter sua visão perturbada pelos demais à sua frente.
Uma das diferenças visíveis, entre um teatro grego e um romano, é que a orquestra helênica é circunscrita num círculo, enquanto a romana encontra-se em um semicírculo.Abaixo do Proscênio, havia duas entradas laterais, à direita e à esquerda, destinadas ao bailado do Coro (χόρος), o Párodos, na sua entrada (πάροδος), e o Êxodos, na sua saída (ἔξοδος). À frente do proscênio se situava a Orquestra (ὀρχήστρα), lugar em que o coro fazia as suas evoluções (χορεύω), dando voltas em torno de um altar, dedicado ao deus Dionisos, caracterizando a vinculação do teatro trágico grego à religiosidade. Sem o elemento religioso e as suas implicações, não há como se entender a tragédia, na sua essência. As evoluções do coro, em torno do altar, eram chamadas de estrofe (στρροφή, ação de evoluir da esquerda para a direita, em torno do altar) e antístrofe (ἀντιστροφή, evoluções da direita para a esquerda). Em um semicírculo, fechando estes espaços, ficavam os assentos do público.
Uma das diferenças visíveis, entre um teatro grego e um romano, é que a orquestra helênica é circunscrita num círculo, enquanto a romana encontra-se em um semicírculo, onde se nota a ausência do altar a Dionisos, certificando, talvez, a perda do sentido religioso explícito.
Anfiteatro de Epidauros, Grécia.
O sítio arqueológico de Braga nos revela um conjunto de termas e anfiteatro, como já referimos. As termas estão totalmente escavadas e com os seus espaços determinados: a palestra (palaestra, lugar de exercitação e de conversa), o vestíbulo (apodyterium ou ἀποδυτήριον), o frigidário (frigidarium, lugar para os banhos frios), o tepidário (tepidarium, lugar para os banhos mornos), e o caldário (caldarium, lugar muito quente, destinado à transpiração), retornando-se, enfim, ao frigidário.Termas do sítio arqueológico de Braga, Portugal.
O anfiteatro ainda se encontra nas escavações primárias, tendo em vista depender de recursos e da disponibilidade dos arqueólogos. Podemos ver, no entanto, a sua forma, mesmo encoberto pela terra e pela grama. Percebe-se, nitidamente, o espaço destinado à Orquestra, as saídas laterais do Coro e o espaço semicircular, em aclive, destinado ao público. O que é lamentável é o fato de que a Cena e o Proscênio encontram-se, literalmente, embaixo de um condomínio de apartamentos, cujos donos estão isentos de culpa, o que não se pode dizer de quem o construiu, pois as escavações para a fundação devem ter mostrado a existência de uma construção antiga, numa cidade de 2000 anos, colonizada por romanos.Anfiteatro do sítio arqueológico de Braga.