Neste ano de 2023, a publicação da obra A Paraíba e seus problemas, de José Américo de Almeida, paraibano de Areia, completou 100 anos. É, sem dúvida, um dos grandes vultos que a Paraíba forneceu ao Brasil. A natureza aguçada de José Américo de Almeida para a crítica social e sua dedicação aos estudos sobre a Paraíba resultaram, anos depois, na grande obra A Bagaceira, de 1928,
tornando esse importante paraibano o iniciador do regionalismo modernista.
Eu tinha 19 anos quando li pela primeira vez A Paraíba e seus problemas. Passei dois meses deprimida com a leitura interrompida, devido aos trechos da obra que tratavam das misérias provocadas pelas secas e sobretudo pela descrição do cheiro dos corpos dos retirantes cujas reservas se "autoconsumiam" em passagem vista pelo município de Areia. Era a Seca de 1877. A procissão de corpos quase nus e fantasmagóricos.
Para piorar minha depressão, havia a cena antropofágica da menina de cinco anos devorada em Pombal. A fome e a seca levavam a situações inimagináveis no século XIX. Em estudo acurado, José Américo de Almeida parte do primeiro registro oficial de nossas secas ainda no século XVII.
A obra, no entanto, não se refere só a isso. Traz informações importantes sobre despesas públicas, a geografia, história e o elemento humano da nossa querida Paraíba. Foi a partir de José Américo de Almeida que tomei conhecimento do gestor público niteroiense que presidiu a Província da Paraíba, Henrique de Beaurepaire-Rohan, um grande homem que permaneceu muito pouco aqui.
Outra figura interessante é a do francês Jacques Brunet, que, além de fazer o primeiro mapa corográfico da Paraíba, descobriu o talento do menino Pedro Américo, mais tarde reconhecido como um dos maiores pintores do Brasil.
Ainda tratando de A Paraíba e seus problemas, a Seca de 1877, embora José Américo de Almeida (1887) não fosse nascido para testemunhar os horrores da multidão de retirantes, foi um episódio que certamente marcou a memória de Areia, pela narrativa que ele faz, detalhadamente.
O episódio de antropofagia da menina Maria, no município de Pombal, atraída com uma boneca por Dionísia dos Anjos, dá o tom do espetáculo de horrores. Nessa onda migratória do sertão para o litoral, muitas famílias sertanejas se fixaram na capital.
A Paraíba é pouco maior que o Estado do Rio de Janeiro, mas por seu formato comprido, entrando a oeste do território nordestino, o cortejo de retirantes deve ter durado semanas, já que a maioria vinha a pé. Nessa migração em massa, fixou-se na capital a família do escritor paraibano Coriolano de Medeiros, fundador da Academia Paraibana de Letras, hoje conhecida como Casa de Coriolano de Medeiros.
Coriolano era bebê quando chegou à capital. Como legado de sua vida, na década de 1880, na cidade da Parahyba, ele nos deixou a obra Tambiá da minha infância, que narra os costumes, a organização urbana e a vida social da capital verdejante daqueles tempos.