Na manhã da última quinta-feira, dia do natal de Jesus, fui à Academia Paraibana de Letras prestar homenagem ao querido e múltiplo ar...

No adeus a Chico Pereira

chico pereira artista plastico paraibano
Na manhã da última quinta-feira, dia do natal de Jesus, fui à Academia Paraibana de Letras prestar homenagem ao querido e múltiplo artista Chico Pereira, que partira na véspera, após longa enfermidade. Nesses casos, de heroica luta contra a doença, costuma-se dizer que a vitória final de Tânatos representa um “descanso” para o enfermo. E de fato é, não importa o eventual clichê da palavra ou da expressão, pois não era outra coisa senão descanso e paz o que se contemplava no rosto de Chico. E essa paz de sua face afinal descansada se irradiava pela sala e pela casa inteira, penetrando suavemente nas pessoas que chegavam, cada qual com o seu pesar particular.

chico pereira artista plastico paraibano
Hipnos e Tânatos: O Sono e seu Meio-Irmão Morte .John William Waterhouse (1874) ▪️ Coleção privada
Uma frase de Hildeberto chamou-me a atenção: “Que me lembre, nunca estive num velório tão bonito”. Realmente, concordei com ele. E a beleza, nesse caso, era filha da paz que reinava no ambiente e que emanava daquele que, inerte, era o centro das atenções e das conversas. Os familiares de Chico fizeram questão de criar o clima propício à serenidade da despedida: nenhum choro mais ostensivo, nenhuma maior dramaticidade pela perda. E fizeram mais: sobre a antiga mesa da
chico pereira artista plastico paraibano
Os 4 filhos do artista Chico Pereira nas exéquias do pai, em 24 de dezembro último Acervo Flora Agra
sala da Casa, colocaram prodigamente à disposição dos presentes variados e finos licores, café, água, alguns acepipes e pequenos vasos de flores, como se tratasse se não de uma festa ao menos de uma espécie de sóbria confraternização de amigos. Segundo ouvi, tudo isso teria sido orientado pelo próprio Chico, numa derradeira cortesia para com os demais. E essa cortesia, diga-se, essa suave elegância na convivência e no relacionar-se, foram marcas indeléveis de sua personalidade e de seu temperamento.

A preguiçosa manhã de feriado levou à Academia muitos de seus amigos e admiradores. Entre outros, avistei o presidente Ramalho Leite, Damião Cavalcanti, José Nunes, Tarcísio Pereira, Itapuan Botto, professora Neide Medeiros, José Octávio e Amável, Sérgio Botelho, Wilson Figueiredo, Antonio David, Eitel Santiago e seu filho Lucas, Afra Soares, Ana Paula Cavalcanti, Hélder Moura, Lúcia Guerra e Carmélio, Augusto Moraes e Josinato Gomes. Mas havia mais. Todos irmanados num genuíno sentimento de perda que conferia rara autenticidade à homenagem coletiva. Ali, sentia-se, as formalidades sociais ficavam em segundo lugar, cedendo o protagonismo à expressão das subjetividades verdadeiras, para além das conveniências e interesses.

chico pereira artista plastico paraibano
Chico Pereira UEPB
O presidente Ramalho designou Damião para falar em nome da Casa. Antes, disse belamente que sua homenagem a Chico limitar-se-ia a tirar o chapéu para ele, o que de fato fez, sob aplausos. Com a palavra, Damião, emocionado, falou no significado religioso da coincidência da morte de Chico e do nascimento de Jesus. Na realidade, tratava-se de dois natalícios, pois para os cristãos quem morre nesta vida nasce para a vida eterna. E o orador tinha – e tem - autoridade para falar dessas coisas transcendentais, com a teologia que trouxe de antiga e inesquecível temporada em Roma.

José Nunes, na condição de confrade e de diácono, completou o ritual, enriquecendo-o com o convite que fez a um pastor presente para acompanhá-lo, ecumenicamente, na missão. Em seguida falaram os filhos de Chico Pereira, todos calmos, todos conformados com a finitude que é de todos os viventes, mais consolando que sendo consolados, e assim também a viúva, serena maestrina daquele momento especial e tocante.

chico pereira artista plastico paraibano
Chico Pereira
Chico foi o grande responsável pelos trabalhos de restauração e adaptação do Palácio da Redenção em sua transformação em Museu do Estado da Paraíba. Foram anos de muita luta diuturna. E no festivo dia da inauguração, Chico não teve condições de saúde para se fazer presente. Ironia da vida. Mistério da vida, na verdade. Às vezes, é assim. Mas a obra estava pronta. Ele a deixou pronta e acabada, entregando-a ao governador e aos paraibanos como sua derradeira missão cumprida. Esse museu será um de seus legados, sem dúvida. Mas há outros, muitos outros, e tudo isso constituirá a sua posteridade.

Coube a Campina Grande, seu chão natal, acolher o seu corpo definitivamente, em um justo e adequado reencontro. Seu nome abreviado era o mesmo de outro grande conterrâneo nosso, seu confrade Francisco Pereira Nóbrega, honraria recíproca que dividiam. Mas o seu, para que não esqueçamos, era Francisco Pereira da Silva Júnior, nome para se guardar no lado esquerdo do peito dos paraibanos.

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE
  1. Realmente o velório de Chico Pereira foi diferenciado. Gil Messias e Hildeberto retrataram muito bem a despedida e o voo de Chico para a eternidade.

    ResponderExcluir
  2. Obrigado, Frutuoso.

    ResponderExcluir
  3. Obrigado, Lúcia.

    ResponderExcluir
  4. Obrigado, Leo.

    ResponderExcluir
  5. Obrigado, Hildeberto.

    ResponderExcluir

leia também