Com Waldemar José Solha se deu assim: construímos nossa amizade a partir de meado da década de 1970. Ele, volumoso em leituras, ensinava a arte de escrever e de pintar, eu, um jovem sorumbático vindo de Serraria com passagem por Arara, escutava mais do que conversava, ou dava pitaco sobre os assuntos abordados. Ouvia e peneirava tudo o que ele falava e assim aprendi muitas coisas que me têm sido úteis.
Existem amizades edificadas com tijolos e argamassa que as artes possibilitam construir, no sincero aperto de mãos e na troca de experiênc...
Vida Aberta, um poema global
Com Waldemar José Solha se deu assim: construímos nossa amizade a partir de meado da década de 1970. Ele, volumoso em leituras, ensinava a arte de escrever e de pintar, eu, um jovem sorumbático vindo de Serraria com passagem por Arara, escutava mais do que conversava, ou dava pitaco sobre os assuntos abordados. Ouvia e peneirava tudo o que ele falava e assim aprendi muitas coisas que me têm sido úteis.
No dia em que a rosa surgiu entre galhos, as pétalas caíram ao toque de minha mão displicente. Observávamos as manhãs esperando o sol que ...
Meeiro do jardim
As flores do pequeno jardim de nossa casa são atraentes. Sendo poucas, a beleza se torna grande. As roseiras encostadas à parede do muro, na lua cheia que tivemos recentemente, abriram-se em forma de cacho, expelindo perfume e sorriso.
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Até o final dos anos de 1960, na Paraíba vivia um caboclo que tinha a alma cheia de serenidade e sabia cantar o sentimento do povo de sua...
Zé da Luz, iluminai a poesia
Cheguei para morar nesta cidade banhada pelo mar, sem sair do meu cantinho de terra. Há 50 anos, precisamente no dia 27 de junho de 1971,...
Aqui andava como um camponês
No segundo ano de pandemia, em que mais uma vez os festejos juninos foram sem graça, consola-me recordar o tempo recluso na memória. Sã...
Festejos juninos sem graça
Na época de criança no sítio Tapuio, que continua compondo a paisagem da memória afetiva sempre recordada como alimento para a paz do espírito, alguns lembravam das festas juninas na fazenda quando nossos antepassados ali chegaram, de carro-de-boi e facão, abrindo veredas para plantar esperança e cultivar família.
No bairro onde habito, ainda apresentando aspecto rural apesar dos grandes edifícios erguidos em seu entorno, vez por outra aparece um car...
O canto do carcará
Noutra ocasião, ainda à mesa do café, lá fora o carcará mais uma vez anunciava a solidão dos animais que perderam sua paisagem, que catam espaço para viver e repousar. Carregamos a mesma sina de viver cada um sua agonia, num voo rasante entre nuvens nebulosas dos tempos atuais.
Quando fechei o livro Sagrado das leituras diárias, peguei o lápis e as folhas de papel que estavam ao meu lado, com as anotações sobre o período quando perambulava pelas capoeiras e roçados do Tapuio de minha infância, tempo quando escutava e observava gaviões que plainavam sobre a mata espessa e capoeiras de nosso sítio. Agora o canto e seus olhares de outro gavião retornam-me às manhãs chuvosas do meu passado, como lenitivo e emplastro sobre as feridas, fazendo-me prisioneiro da saudade sem fim.
Vai para longe, carcará, leva a saudade que não consigo reduzir nem conter os anseios que atormentam. Caminhar pelas veredas de Serraria, com a camisa aberta ao peito, como cantou o poeta, seria o bálsamo a ungir esta nostalgia. Não é preciso permanecer tanto tempo rondando minha casa, mesmo às escondidas, porque esse seu cantar basta. O retinir do seu canto me faz lembrar as manhãs quando andava pela capoeira, solitário, narrando para as sombras invisíveis - a minha própria sombra - os devaneios atormentadores.
Antigamente no meu caminhar soturno pelas veredas de minha terra escutava o canto dessa ave que ribombava na solidão das grutas, onde também retinia a ária silenciosa do meu coração, que sufocava e ninguém ouvia.
Em todo o momento, fosse em dias chuvosos, nos dias com sol, nas noites enluaradas ou frias quando ocorriam os festejos juninos, seu cantar estava sempre comigo. No sítio andava pelas capoeiras a passos lentos para não espantá-lo. Ele e eu regíamos nossa solitária orquestra, cada um com sua dor.
Naquela manhã, o carcará urbano, solitário, pareceu evoluir das nossas lamentações. Seu canto intermitente, às vezes longínquo, tinia aos meus ouvidos. Olhava pela janela, por onde o vento frio penetrava na sala, mas não o avistava. Retornando aos afazeres, envolto meditações acera de passagens do Cântico dos Cânticos, ainda sem acomodar no papel os pensamentos que vagueavam pela mente, tentava afastar as antigas lembranças do passado que buliam comigo. Agarrei o lápis e comecei a rabiscar este remendo de crônica.
O poeta dos poetas que nasceu entre nós, na juventude viveu à sombra do tamarindo e permaneceu como essa paisagem na alma por toda a vida,...
Artesãos da paz
Desde o primeiro momento do seu Pontificado, o papa Francisco ressalta a necessita de mais artesãos da paz. Essa paz que há milênios se busca e parece cada vez distante das pessoas. Lembra que enquanto são criados mecanismos capazes de contribuir com a convivência pacífica,
Há 25 anos, interessados em registrar a atividade na Imprensa da Paraíba, os jornalistas Jorge Rezende e Nara Valusca publicaram o livro ...
E agora, 25 anos depois?
O poeta Jorge de Lima ao leito da morte, agonizante, sem perder a esperança, registrou em diário pensamentos que ajudam pessoas a edificar...
As últimas páginas são eternas
Ocorreu-me lembrar do gesto do poeta alagoano ao escutar as palavras derradeiras do jovem prefeito da cidade de São Paulo, Bruno Covas, que encarou a proximidade da morte com serenidade. Somente homens penhorados com harmonia espiritual são capazes de elevados gestos.
Certa vez percorri o Rio Gramame, a barco, realizando desejo desde quando aqui cheguei, em meados de 1971. Conhecer os arredores des...
Um rio que entrou na minha vida
Conhecer os arredores deste rio, penetrar na profundidade mítica do manguezal, até certo ponto acalentador, era minha vontade. Foi um passeio inesquecível e de recordações porque, conhecendo-o de passagem, agora eram suas águas que me transportavam lentamente, enquanto observava sua paisagem. Um lenitivo para a alma.
Nas imediações da cidade de Conceição, num recanto sossegado na beira das serras que separam Paraíba e Ceará, próximo de Pernambuco, de so...
As mesmas mãos calejadas
Depois da safra do caju, no rastro das primeiras chuvas do ano, nossos olhares estavam direcionados às jabuticabeiras existentes no sítio....
Jabuticabeiras de Serraria
Numa manhã sem graça, há mais de vinte anos, quando minha irmã comunicou pelo telefone que nossa mãe havia morrido, após deixá-la no hosp...
Duas cadeiras vazias
Sem encontrar palavras para expressar minha saudade e meu agradecimento ao conterrâneo, amigo e mestre Nathanael Alves, nos quarenta ...
Nathanael, 40 anos depois
O poeta Augusto dos Anjos imortalizou o tamarindo do Engenho Pau D’árco com versos primorosos. O professor Milton Marques Júnior trouxe p...
O professor e o tamarindo
São quatro anos de silêncio, sem o riso de Cristovam Tadeu. Num sábado sem graça, o humorista, cartunista e jornalista foi encontrado sem ...
Cristovam agora é silêncio
Confesso sem remorso ter abandonado a leitura das “Confissões” de Santo Agostinho em diversas oportunidades e continuo arrependido pelas l...
Confissões de Agostinho
Há mais de trinta anos Firmo Justino, jornalista que entrou para a Magistratura da Paraíba, retornando às paisagens do Convento São Franc...
O Convento e seus mistérios
Na época da visita do meu amigo, o convento tinha sido restaurado, estava ainda mais imponente e carregava, como ainda mantém, o encantamento do magnífico conjunto arquitetônico barroco. Quem passear por seus longos corredores de largas paredes, pisar no assoalho de madeira dura e olhar as peças ornamentais que a mão humana moldou, silencia e escuta a quietude do lugar.
Se eu fosse rei ou imperador, assim como nas estórias que ouvia no tempo de criança no nosso sítio, em Serraria, recomendaria aos professores a levar seus alunos a este maravilhoso local, onde estão guardadas muitas histórias que ajudam a entender o passado da Paraíba, porque falam como um livro aberto.
Para amar o lugar onde nascemos, é por demais importante conhecer sua história, sabiamente profetizava Nathanael Alves.
Estive pela primeira vez no São Francisco, em 1979. Foi quando, por inspiração de Dom José Maria Pires, o poeta Waldemar José Solha e o maestro José Kaplan montaram a “Cantata pra Alagamar”, apresentada numa noite que me deixou abismado pela aclamação ao espetáculo e pela imponência do conjunto arquitetônico onde o evento aconteceu.
Então, após as revelações de Firmo Justino, levei minha filha Angélica para conhecer aquela inconfundível obra de arte. Grande foi sua admiração, apesar dos nove anos de idade. Pouco indagava, mas o semblante e os olhos arregalados davam pistas de seu encantamento ao contemplar detalhes dos corredores, as grossas paredes e as imagens pintadas no teto das capelas.
Todas as vezes que volto àquele lugar, vagueio na imaginação colhendo remotas imagens e histórias que os livros abordam, desde a fixação das pedras sobre pedras, conduzidas por muque humano até chegar a imponente edificação que conhecemos. Entre as paredes, o silêncio de Deus se manifesta em nós.
Em cada recanto observava-se misterioso silêncio. O vento entrando pelos janelões, espalhando-se pelos móveis antigos, caminha ao nosso lado durante o passeio pelas celas, extensos corredores e o horto florestal recebe a todos com seu frescor.
Meu amigo tinha razão quando convidou-nos a visitar o convento franciscano, e olhar por dentro a fabulosa obra de arte que eles deixaram.
O prédio com a torre apontando para o céu, o cruzeiro que nos recebe à entrada e seus arredores, tudo espalham emoções. Essas imagens carregamos pelo resto da vida.
- Não é uma beleza?...
A menina respondeu com acena da cabeça, e curtas palavras que tento relembrar.
Quase três décadas depois, a filha conduziu meu neto para igual visita, quando a pandemia nem dava sinais.
O convento franciscano continua com seus mistérios, criando emoções aos que ali se dirigem, mesmo em tenra idade.
Quando li pela primeira vez “Grande sertão: veredas”, de João Guimarães Rosa , fechei o livro atordoado porque me levou a caminhos desconh...
O Deus de Guimarães Rosa e Dostoievski
Durante os dias que antecederam a passagem do ano novo, ocorreram chuvas em algumas partes da Paraíba e, suponho, trouxeram alento e esper...