É assim que se diz lá pelas bandas da Serra da Mantiqueira, onde vim à luz numa manhã de primavera, décadas atrás. E o que exatamente se quer dizer com essa máxima? Picada é a passagem que vai se abrindo em mata fechada à foice ou a facão para ir se avançando numa caminhada, Fim da picada é quando se está diante do intransponível e não há como adiantar ou prosseguir na marcha. O caminho, a trilha, se encerram ali.
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Ou, como dizemos por lá, chegamos ao “fim da picada”. Vejam que “fim da picada” se trata de uma simples metáfora que nos alerta estar nossa existência comprometida. Há pouco para se ver à frente, podemos aposentar nossos planos, projetos, devaneios e outras idiossincrasias que alimentavam nosso espírito e que inauguravam nossas manhãs e as enchiam de cor. É essa a alegoria.
Para mim é o fim e que o negócio daqui para frente vai ser o sofá da sala onde deverei descansar minha preguiça até a canja do anoitecer para abastecer o bucho antes de me recolher. Talvez uma leitura, nada substancioso, coisa pouca só para que o ócio não seja completo. Quem sabe um filmezinho bem água-com-açúcar para que não haja necessidade de elucubrações mais sofisticadas.
E de onde viria essa minha angústia? Começou dias atrás, quando numa chaminé lá na Santa Sé saiu fumaça branca anunciando que o conclave elegera o próximo Sumo Pontífice. Até aí nada de anormal, ainda mais para mim que vivera sob a égide de 7 pontificados. Pois vejam:
João XXIII (Angelo Roncalli, 1881—1963) ▪ Wikimedia
Quando nasci, o mandatário da vez era Pio XII, que comandou a Sé de 1939 a 1955. Foi o tal que teve histórias não muito explicadas em relação aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Era garotão ao ser eleito: 63 anos. Em seguida, João XXIII começou a ocupar a cadeira de Pedro aos 76. Era um papa com ares de bonachão. Seu pontificado se estendeu de 1955 a 1963 e sua morte foi devidamente carpida em todo mundo, pois era muito querido. Depois Paulo VI (1963 a 1978) foi ungido à condição patriarca de toda a Igreja ainda jovem, pois tendo o Vaticano como referência se tornou papa com apenas 65 anos.
João Paulo I esteve no comando da Igreja de agosto a setembro de 1978. Morreu aos 65 anos de causas naturais, porque, descobrindo o que descobriu nos subterrâneos do Vaticano, era “natural” que morresse. Não poderia tornar públicos aqueles segredos. Logo em seguida, quebrando a tradição de papas italianos, o eleito foi um polonês: João Paulo II, aos 55 anos, pontificou de 1978 a 2005. Karol Wojtyla foi o caçulinha dessa tropa.
João Paulo II (Karol Wojtyla, 1920—2005) ▪ Wikimedia
Quem veio depois foi Bento XVI, um alemão que assumiu o trono de Pedro aos 78 anos. Ficou até 2013, quando se cansou, mandou tudo às fava, tirou a sotaina branca de 33 botões, descalçou os sapatos encarnados, tirou o zucchetto branco do cocuruto e deixou tudo para nosso “hermano”, o Francisco I, que se tornou o bam-bam-bam de todos os católicos aos 76 anos.
Agora quem chega é um “caba” meio norte-americano, meio peruano, que se graduou em matemática, antes de se dedicar à teologia. Leão XIV vem com ares liberais, mas nem tanto. Assume o pontificado com seus 65 anos.
Leão XIV (Robert Francis Prevost, 1955) ▪ Fonte: Catholic Church England and Wales
Ditas estas, coisas acho razoável declarar nestas linhas de onde vem esses meus aborrecimentos, essas minhas contrariedades, esse meu desânimo quase absoluto. Vou contar.
Em homenagem ao nosso Leão XIV (que antes de ser religioso é um matemático), fiz a média aritmética das idades de cada um desses 8 santos homens quando assumiram o mais alto degrau na hierarquia da Igreja. Somei e dividi por 8. Encontrei 67,9.
Vaticano, 08.05.2025CCEW
Até aí nada de anormal, uma mera estatística eclesiástica. Mas acontece que, quando a fumaça branca deu as caras na chaminé da Capela Sistina, sinalizando estar encerrado o conclave, e a TV passou a anunciar quem era o novo Pontífice, minha cara-metade veio com essa:
⏤ Você é mais velho do que papa!
Aliás, estou mais de um lustro acima da média anunciada linhas atrás. Como vocês acham que me sinto? Quando pensamos num papa, pensamos num moçoilo belo, musculoso, exalando virilidade, ou nos chega à mente um velhote mais para lá do que para cá? A segunda hipótese, claro!
Não é justo esse meu recolhimento? Não é o fim da picada ser mais velho do que papa?
