Johan Vincent Galtung (1930–2024) foi um sociólogo e matemático norueguês que desenvolveu uma compreensão acadêmica inovadora sobre a construção da paz, sendo também cofundador da disciplina de Estudos sobre Conflitos. Em 1959, fundou o Instituto de Pesquisas para a Paz de Oslo (PRIO), do qual foi diretor até 1970. Ao longo de uma carreira de mais de setenta anos, Galtung atuou em mais de 150 processos de mediação, envolvendo nações, religiões, comunidades locais e organizações da sociedade civil. Reconhecido mundialmente como o “pai dos estudos da paz”, escreveu e coescreveu mais de 1.600 artigos e mais de 160 livros, abordando temas relacionados à solução de conflitos, à teoria comparada das civilizações e ao desenvolvimento humano e social.
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A violência estrutural, segundo a perspectiva galtungiana, estabelece-se a partir da própria organização da estrutura social, manifestando-se nas relações desiguais que determinam o acesso a bens, direitos e oportunidades. Ela se expressa em situações marcadas pela distribuição desigual de serviços, aos quais determinados grupos ou indivíduos têm acesso limitado ou dificultado em razão das discriminações que atravessam o tecido social. Exemplos dessa dinâmica são os recursos destinados à renda, à educação, à alfabetização e à assistência médica, cuja distribuição tende a ser deficiente.
Essas desigualdades não se manifestam de forma isolada, mas em estreita correlação no interior da estrutura social, o que faz com que diferentes dimensões da vida se interliguem e se reforcem mutuamente. Em seu artigo publicado no Journal of Peace Research, v. 6, n. 3, intitulado Violence, Peace and Peace Research (“Violência, Paz e Pesquisa sobre a Paz”), Galtung (1969, p. 167–191) defende que “pessoas com baixa renda, por exemplo, tendem a apresentar menor nível de instrução, alimentação insuficiente e, como consequência, condições precárias de saúde”. Essa
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Johan Galtung aprofunda sua análise ao discutir a correlação entre os recursos e introduz a distinção conceitual entre pobreza e miséria. Para o autor, a pobreza refere-se à condição de quem possui poucos recursos, enquanto a miséria significa possuir tão pouco que essa escassez se converte em sofrimento e prejuízo à vida. Está, portanto, correlacionada à doença — ou à falta de saúde — e dá origem a um círculo vicioso que perpetua o sofrimento humano.
O indivíduo em condição de miserabilidade vive em um ambiente no qual seus recursos são continuamente insuficientes em termos de emprego, moradia, alimentação, conforto e oportunidades de desenvolvimento pessoal. Esse estado permanente de carência não apenas limita as possibilidades de ascensão social, mas também compromete o bem-estar físico e psicológico, uma vez que a pessoa, afetada de modo contínuo por sua condição de indigência, permanece em situação crônica de vulnerabilidade. Do mesmo modo, a miséria tende a gerar doenças múltiplas e persistentes, que impedem o indivíduo de alcançar um estado saudável, tanto do ponto de vista biológico quanto social. Isso fere — e deixa o cidadão doente — por toda a vida.
Johan GaltungIPRI (Oslo)
A análise de Galtung demonstra que a violência estrutural constitui um sistema interligado de privações, no qual os recursos sociais, econômicos e simbólicos são distribuídos de forma desigual, gerando efeitos duradouros sobre a saúde, o bem-estar e as possibilidades de vida das pessoas. Essa perspectiva é essencial para o campo dos estudos da paz, pois revela que a construção de uma paz duradoura exige mais do que a simples ausência de conflitos armados: requer a superação das estruturas de injustiça que perpetuam o sofrimento humano.
Somente pela transformação dessas estruturas desiguais será possível romper o ciclo da miséria e promover uma paz positiva, alicerçada na justiça social, na equidade e na dignidade humana.



















