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A quanto dista o zelo do cientista ao abuso apaixonado do poeta com a palavra? Aprendi assim, colhendo poesia no coração lúdico das p...

poesia medicina cardiologia
A quanto dista o zelo do cientista ao abuso apaixonado do poeta com a palavra?

Aprendi assim, colhendo poesia no coração lúdico das pessoas; era um tempo em que desconhecia o bombear cardíaco, apesar de sentir aquela aceleração gostosa no peito - condição comum para os apaixonados platônicos de todos os tempos.

      Alguma coisa acontece no meu portão Nascido de um sonho Eu mordiscava os mundos a medida que percebia algo de doce...

poesia capixaba jorge elias
 
 
 
Alguma coisa acontece no meu portão
Nascido de um sonho Eu mordiscava os mundos a medida que percebia algo de doce (a presença) Espiava futuras andanças, tecia despedidas para a imagem muda do pai (Era a menina que partia pela fresta amarela) Chuva, testemunha de minhas urgências, este consolo no sem sentido. (pai, você já pensou em pegar o sol e jogar lá longe?) Alguma coisa acontece no meu portão (Pai, meus olhos estão encharcados de sono) Ficou a casa, entrecortada de silêncios (E se lançarmos o silêncio para longe,

Enterrou seu filho, sua mãe e seu marido, entrou em casa e trancou a vida do lado de fora. Colocou o insulfilm mais escuro do mercado ...

conto literatura capixaba genealogia
Enterrou seu filho, sua mãe e seu marido, entrou em casa e trancou a vida do lado de fora. Colocou o insulfilm mais escuro do mercado em suas janelas e fechou-as. O barulho das ondas, anunciando o incansável ciclo das marés, não penetrava aquele esquife, elas não podiam rivalizar com sua sede de passado. Na árvore genealógica de metal colocou as fotos de seus homens.

      PERTENCIMENTO Eu, que atentei contra as lendas, devo participar calado da ceia dos ausentes. (O brilho do dia nad...

poesia capixaba jorge elias neto
 
 
 
PERTENCIMENTO
Eu, que atentei contra as lendas, devo participar calado da ceia dos ausentes. (O brilho do dia nada sabe sobre o vazio que se desprende nas asas sem destino, dos trocadilhos dos fartos, da soberba que ofusca no horizonte o templo dos desesperados, do pânico dos ascensoristas buscando um andar que caiba o homem)

Para que compartilhar a loucura? Tem-se que guardar em segredo a penúria dos instintos que nos avassalam a alma. A loucura transborda, ...

solidao retorno
Para que compartilhar a loucura? Tem-se que guardar em segredo a penúria dos instintos que nos avassalam a alma. A loucura transborda, atordoa, é inventiva demais.

Diriam que ela é suportável nas crianças e em alguns endemoniados perdidos nos acostamentos das autoestradas – sempre carregando nas costas suas sacolas cheias de coisas-nenhumas. Elas não aprenderam ainda a ser gente;

A cidade cresce, se descaracteriza, fica cinza. Os faróis dos carros só são belos nas fotos noturnas com longa exposição do diafragma ...

crianca esperanca morro inocencia favela
A cidade cresce, se descaracteriza, fica cinza. Os faróis dos carros só são belos nas fotos noturnas com longa exposição do diafragma – se disfarçam em fachos luminosos. Os indivíduos não se apercebem, é massa disforme à espera do sinal verde que chega e parte sem que eles saiam do lugar.

      LIVRO NEGRO (Do canto obscuro a beira do mito, percorre-se o possível.) Medusa, Sangre minha língua, Recubra de vida ...

poesia capixaba jorge elias
 
 
 
LIVRO NEGRO
(Do canto obscuro a beira do mito, percorre-se o possível.) Medusa, Sangre minha língua, Recubra de vida a hóstia - alento do passado. Musa, surpreenda o que no sossego dos dias tingidos, simplesmente - ignora.

Em qual categoria de poeta eu me insiro ? Sou um pintor de luas tortas. Tombadas sobre a terra frágil. Ou seja, trato da poesia fra...

poesia capixaba jorge elias neto livro
Em qual categoria de poeta eu me insiro ?

Sou um pintor de luas tortas. Tombadas sobre a terra frágil.

Ou seja, trato da poesia fragmentada de nosso tempo, dos seus andrajos sustentando uma terra inóspita para a beleza.

Meu poema não é passivo, não enleva a alma ao paraíso, ele lambuza o leitor com a realidade, com a angústia do ser consciente.

O pasto é para todos, por isto cuido do arado, planto, colho, engulo, mas, ao acaso, rumino versos que são a minha fome perseguida.

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Premek Hajek
Aquela palavra-frase que me ignora as súplicas e me arrebata ao seu bel prazer.

Chamo de estalo da palavra este açoite aguardado da musa. Mas luas tortas carecem de aplicabilidade.

Daí ser ignorado tal arquiteto e seu anacronismo.

A lua suspensa e seu telescópio já não dizem nada.

Os irmãos Lumiére não se reinvetam na poesia.

O espaço-tempo não tem fragrância, ele é um galope doido de imagens e informações.

Sei que o poeta não é um ser prático, mas é rico em praticâncias e desassossego.

E assim acordei sendo. Esta é minha última pele. Visto o que sobra das luas que picoto e remendo em minha vida.

Quem sabe aprenda a amanhecer em algum olhar. O que me diz leitor?

(Introdução ao livro Tratado da última pele a ser lançado em breve pelo autor)

A ARTE DO DESAPARECIMENTO Em algum momento há de se aprender sobre o desaparecimento Os dentes assinam as raizes das ...

poesia literatura capixaba jorge elias
A ARTE DO DESAPARECIMENTO
Em algum momento há de se aprender sobre o desaparecimento Os dentes assinam as raizes das coisas (algo desapercebido - o lapidar da esfinge) A vida tem sua fome de glória e guerra pela verdade e estende seu piso até a Terra que nos preenche com a derradeira surpresa.

      PARANOIDE CAMARÁ Já marquei as circunstâncias com alfinetes coloridos Não me perderei revirando prejuízos no Nada E...

poesia capixaba jorge elias neto
 
 
 
PARANOIDE CAMARÁ
Já marquei as circunstâncias com alfinetes coloridos Não me perderei revirando prejuízos no Nada E se a imprecisão no poema for uma renúncia, um estar solidário ao conjunto dos passos autômatos, rítmicos, dos exércitos, me calarei de desprezo pelo ofício da escrita.

Vejo como necessária a celebração da vida, da condição racional do homem, de sua possibilidade de escolhas. Mas bem sei do quão é d...

morador rua pobreza injustica fotografia padre antonio vieira
Vejo como necessária a celebração da vida, da condição racional do homem, de sua possibilidade de escolhas. Mas bem sei do quão é desigual esse direito de escolha em nossa sociedade.

Chega-se ao ponto de ser quase um absurdo discutir o já tão repisado tema do livre arbítrio após um olhar para a foto que motivou este texto.

Convido o leitor que passe o olho na imagem, deixe que ela se fixe, que ela o veja e seja vista, que ela turve os seus olhos e suas certezas, suas verdades.

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Vitor Nogueira
Em seu sermão sobre São Roque, o Padre Antônio Vieira nos diz que “em todo ato, em cada ser humano habitam muitas verdades”. Falo sobre as verdades que essa foto de Vitor Nogueira me despertou.

Dizem muito da inteligência artificial, da possível empatia que pode ser inserida na forma como a frase é elaborada, como as palavras ...

preconceito discriminacao racial
Dizem muito da inteligência artificial, da possível empatia que pode ser inserida na forma como a frase é elaborada, como as palavras são dispostas no texto. Digo inserida pois a formatação do virtual passa, pelo menos por muito tempo, pelo controle humano. Já ouçof muitos colegas de profissão afirmarem que isso já está ocorrendo e apresentam alguns exemplos nos nossos grupos de whatzapp. Chegam a dizer que a IA (esta é a forma mais usual de se referir a inteligência artificial) já consegue, em alguns exemplos que veicularam, superar um diálogo presencial.

      ANCESTRALIDADE (Não sei o que faço falando por sua boca, brotando sabe-se por qual poro de sua existência....

poesia capixaba jorge elias neto
 
 
 
ANCESTRALIDADE
(Não sei o que faço falando por sua boca, brotando sabe-se por qual poro de sua existência. ) O som como se soletram os mortos, o remorso, a solidão da passagem das sombras, o interlúdio, o ludibrio das expectativas, as cartas reembaralhadas e seu cheiro de saudade, algum resto de tinta revestindo as paredes dos sonhos, e o testemunho da História que é sua, dentre tantos esquecidos.

      PROMESSA DE CONTRATO O cavalo - este que em mim galopa - sou eu sóbrio, farto de portar certezas e testemunhas que cat...

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PROMESSA DE CONTRATO
O cavalo - este que em mim galopa - sou eu sóbrio, farto de portar certezas e testemunhas que cato pelo caminho Talvez por não resistir à história, insisto nas fábulas dos ladrilhos revirados pelos cascos das mãos nuas Mas quem sabe, em uma manhã despercebida das ausências, eu desabe sobre uma almofada, aqui mesmo nesta sala, onde por vezes, me vejo um tolo E desista de assinar meu nome; de distribuir elogios à loucura.

Aos poucos estão trocando o piso das calçadas de Vitória; novas normas para tornar mais seguro o dia a dia dos pedestres. Podem achar ...

prosa poetica jorge elias neto
Aos poucos estão trocando o piso das calçadas de Vitória; novas normas para tornar mais seguro o dia a dia dos pedestres.

Podem achar estranho, mas não me atraem calçadas regulares. Os buracos, as irregularidades e os desníveis me servem como camuflagem do relógio do tempo, como um sinal de que mantenho momentos de distanciamento, de contemplação, de ausência.

Uma ilha dentro da ilha. Poderia definir assim o local onde conversávamos, tranquilamente, sobre literatura. A constante discussão, en...

anu branco ecologia vitoria espirito santo
Uma ilha dentro da ilha. Poderia definir assim o local onde conversávamos, tranquilamente, sobre literatura. A constante discussão, entre os raros interessados, sobre a evolução – aí já se encontra embutida uma fonte de discordância excitante – que ocorreu na poesia brasileira nos últimos cem anos ... Bravos companheiros e fantasmas, nós, na ante-sala do auditório da Biblioteca Pública Estadual. Uma ilha dentro da ilha…

      As velhas casas escoam seus sapatos a cada chuva, a cada partida Mas há um íntimo que perpassa a ausência: O peso da...

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As velhas casas escoam seus sapatos a cada chuva, a cada partida Mas há um íntimo que perpassa a ausência: O peso das solas, dos passos, das meias volta indecisas, do andar em devaneio e um certo calor despido de inocência Velhas casas, cenário do canibalismo dos justos, dos que se largam sobre o espaldar do trono da misericórdia

      QUANDO ESTENDI SEU CORPO NA AREIA Não sei mais de nada. O infortúnio é próprio da falta de sentido. (Ou será a fortuna...

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QUANDO ESTENDI SEU CORPO NA AREIA
Não sei mais de nada. O infortúnio é próprio da falta de sentido. (Ou será a fortuna de ter te conhecido sob o efeito do álcool?) A razão são as estrias que acumulamos na pele, e descamam a cada verão escaldante. Quando estendi seu corpo na areia, à semelhança dos fósseis, um outro tempo dizia qual o nome e o motivo de nosso encontro, e o quanto de surpresa preencheria o vazio de nossa existência.
SILÊNCIO ÁCIDO
Falo agora do seu silêncio, dizendo: se afasta de minha boca Eu queria me recordar, mas o vazio tem a força que aspira os sonhos, e a memória é um tempo perdido no não encontrar o seu abraço (O cinza não suporta o negro das noites e seus redemoinhos) Não aceito esta morte, perder o amor arrebatado do paraíso do seu nome, e a balança que rege as mãos, e o sentido dos gestos, a mentira de rosto limpo nas manhãs de paz Não quero ser obrigado a parar a noite, uma parte constrita de minha existência pertence ao desespero de sua sombra Eu me curo no tardar de sua partida.
DE IRMÃO PARA IRMÃO
Meu irmão tinha uma mala de livros um dia ele a abriu na minha frente e partiu para o desmedido entrei na mala e me cobri com as páginas de seus sonhos.
O DECLÍNIO DO ÚLTIMO DIA
Os restos de ontem combinam com os corpos de outras eras. São os mesmos mortos, as mesmas taças, o mesmo desperdício. A tradição das luvas e das meias, as fendas na carne, as porções de nozes sobre a mesa e as varejeiras, tranquilas, sobre os castiçais
BRUMADINHO
Eu não saberia dizer, estou atordoado, pisar o sem fundo das casas, entrar pelos telhados na vida das pessoas, saber os muitos tons da verdade, que a terra engole a fala dos homens e os aniquila com esse funil de lama tragando o ar e a voz de Minas. O mito é o pássaro que sobrevoa a tarde? Não, isso é poesia, e estou falando da morte.


As horas não são confiáveis, traiçoeiras, se repetem com sua vulgaridade sem fim, ostentando seu desejo de consumir cada espanto que nasce, cada corpo que tomba.


Desenterre os ossos ─ e seus medos sem face ─ deixados em outro tempo. E sobre a areia despeje o brinquedo de armar, essa cama da carne da marionete adormecida.

(do livro XXI Sombras, em fase de edição)

      A CASA QUE ME RECEBEU DE PÉ Olhá-la sobre os ombros da primeira mulher Depois do gosto do leite, o pão, o ovo frit...

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A CASA QUE ME RECEBEU DE PÉ
Olhá-la sobre os ombros da primeira mulher Depois do gosto do leite, o pão, o ovo frito na manteiga - a saciedade Cantos escuros, lascas de madeiras e a correria das formigas nos tacos brilhantes E o erguer-se, esse simulacro de liberdade das patas A primeira janela, o canto das Nereidas, e o enigma da luz (Ficou, de fora, a promessa do azul)

MANUAL DA ARQUITETURA DO VAZIO “ Os quartos por onde eu deito são pedaços de parede ” (Roberto Almada) Divida a casa por circuns...

poesia capixaba jorge elias neto

MANUAL DA ARQUITETURA DO VAZIO

Os quartos por onde eu deito são pedaços de parede
(Roberto Almada)
Divida a casa por circunstâncias (o que fica na mobília são lembranças) o canto é o lugar secreto, ouvinte paciente, discreto já as paredes, labirinto, não duvide, segue ouvindo cada greta guarda um nome uma reticência e a fome os grandes segredos morrem quando as memórias escorrem mágoas no porta-retrato, amargas como o passado nos canos, todo o defeito, enganos, crimes desfeitos o som percorrendo tudo de uma ponta a outra, absurdo