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Nelson Gonçalves e Adelino Moreira lançaram em 58 o samba-canção Escultura , em que o boêmio – cansado de tanto amar – começa a... escultu...

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Nelson Gonçalves e Adelino Moreira lançaram em 58 o samba-canção Escultura , em que o boêmio – cansado de tanto amar – começa a... esculturar... uma mulher-fantasia, contando, para isso, com a voz de Dulcineia, a malícia de Frineia, a pureza de Maria, além do sorriso e o olhar de Gioconda, de du Barry, o glamour, e o porte de nobreza... de madame Pompadour.

Alguém disse que é preciso estar sob teto da Sistina para se ter ideia do que um ser humano é capaz. Eu diria o mesmo sobre a leitura de q...

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Alguém disse que é preciso estar sob teto da Sistina para se ter ideia do que um ser humano é capaz. Eu diria o mesmo sobre a leitura de qualquer dos maiores poemas — clássicos e contemporâneos —, embora a pintura tenha a vantagem de que, numa vista d'olhos, se mostra, de imediato, inteira. Mozart dizia que, ao imaginar um concerto ou sinfonia, podia abarcar a obra com um único olhar, “como se se tratasse de um quadro ou estátua”, e esse momento, assegurava, “é indescritível”.

Se lhe mostro uma sequência de fotogramas, depois digito e lhe exibo e/s/t/a// s/é/r/i/e// d/e// c/o/n/s/o/a/n/t/e/s//e//v/o/g/a/i/s, alé...

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Se lhe mostro uma sequência de fotogramas, depois digito e lhe exibo e/s/t/a// s/é/r/i/e// d/e// c/o/n/s/o/a/n/t/e/s//e//v/o/g/a/i/s, além de uma tira numa revista de h/i/s/t/ó/r/i/a/s//e/m// q/u/a/d/r/i/n/h/o/s, você terá vivido três experiências semelhantes.

Os gibis e o cinema funcionam com idêntica magia (ainda maior) da escrita — que se processa em sua mente, não fora dela — como se vê neste trecho:
L/a/n/c/e/l/o/t ar/r/e/m/e/s/s/a o m/a/c/h/a/d/o, q/u/e s/a/i g/i/r/a/n/d/o n/u/m v/ó/r/t/i/c/e a/t/é e/n/c/r/a/v/a/r-s/e n/o p/e/i/t/o d/e M/o/d/r/e/d/:

Quando o maestro José Alberto Kaplan ficou paraplégico (em virtude da siringomielia que terminaria por derrubá-lo em 2009), passei a levá...

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Quando o maestro José Alberto Kaplan ficou paraplégico (em virtude da siringomielia que terminaria por derrubá-lo em 2009), passei a levá-lo em meu carro, todas as manhãs de sábado, à residência de seu grande amigo – logo meu, também - advogado Dr. Paulo Maia -, dono da maior coleção de LPs, vídeos, CDs e DVDs de música erudita da Paraíba. Era um hábito do amigo judeu argentino – de quem eu fora parceiro na Cantata pra Alagamar e no musical Burgueses ou Meliantes - , que vinha de décadas. Tomando um bom gin com tônica (“a bebida da rainha”, dizia o Dr. Paulo) , vendo o mar logo ali, atrás da vidraça, era incrível, naquelas sessões matinais, não só acompanhar as riquíssimas programações de grandes concertos em som e imagem de alta fidelidade, como absorver algo da vasta cultura musical dos dois e dos outros frequentadores, os benditos poucos, the happy few, band of brothers: jornalista Luiz Carlos Nascimento Souza, Yerko Pinto – então spalla da Sinfônica local e integrante do prestigiado Quinteto Paraíba, além de Hector Rossi - que fora professor de contrabaixo de meu filho Alexei Dmitri (1966-2017), mais o ex-governador Tarcísio Burity (1938-2003) que, em tempos áureos, não só construíra o gigantesco Espaço Cultural José Lins do Rego da capital,

         RANGEM AS ENGRENAGENS, TREME A TERRA, Há UM RUMOR. E horror!, ... mas a multidão se deslumbra: na sombra que a todos obu...

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RANGEM AS ENGRENAGENS, TREME A TERRA, Há UM RUMOR. E horror!, ... mas a multidão se deslumbra: na sombra que a todos obumbra, tudo, agora, relumbra: a Pedra... se abre... como em corte de sabre, e o que se vê ... é estupor! Na escuridão resplandece, com todos os seus vitrais, com profusão de torres

Prêmio Jabuti de Poesia 2015 Por coincidência, poucos dias antes de ler esse livro de ALEXANDRE GUARNIERI, eu resenhara o ERRE BALADA...

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Prêmio Jabuti de Poesia 2015


Por coincidência, poucos dias antes de ler esse livro de ALEXANDRE GUARNIERI, eu resenhara o ERRE BALADA, de Biu Ramos, em que o dito R. morre “com uma faca nas entrelinhas”, daí que se lê no seu epitáfio, isolado na última página:



Aqui jaz Digitus Erre Linhares.
Cap. 1, pag 13 – cap. 25, pag. 98.
Sua vida foi um livro aberto.



Guarnieri escreve na página 16 de Corpo de Festim, em
sangue | suor / e celulose (ii):



... W. J. Solha tem recado curto e grosso : Leiam O LABORATÓRIO DAS INCERTEZAS. Paulo Vieira (UFPB 2013) é dono de um senhor currículo, ...

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... W. J. Solha tem recado curto e grosso:

Leiam O LABORATÓRIO DAS INCERTEZAS. Paulo Vieira (UFPB 2013) é dono de um senhor currículo, que vai de pós-doutorado em Paris, junto ao grupo Théâtre du Soleil (1996), ao doutorado na USP com tese sobre Plinio Marcos (A Flor e o Mal, Firmo, 1994); e do mestrado com dissertação sobre Paulo Pontes (A Arte das Coisas Sabidas, UFPB 1998), à publicação de bons romances – como O Ronco da Abelha (Beca) e O Peregrino (FCJA) -, mais um Bolsa Funarte de Estímulo à Dramaturgia (2007), com o texto Anita, etc, etc, além do que é chefe do Departamento de Artes Cênicas da UFPB, universidade para a qual criou o Mestrado Institucional em Teatro e, com seus colegas, a Especialização em Representação Teatral.

Entre tantas outras coisas, impressionou-me, no romance “O Jogo da Amarelinha” (“Rayuela”) , de Júlio Cortázar, o problema de seu persona...

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Entre tantas outras coisas, impressionou-me, no romance “O Jogo da Amarelinha” (“Rayuela”) , de Júlio Cortázar, o problema de seu personagem Horácio Oliveira:

“el sentimento de no estar del todo”,

que deu nome para algo estranho que eu também vivia.

Num ensaio posterior a respeito, Cortázar diz se sentir “siempre un poco más a la izquierda o más al fondo del lugar donde se debería estar”.

Quando lancei pela Codecri, em 84, ZÉ AMÉRICO FOI PRINCESO NO TRONO DA MONARQUIA, em que apontava semelhanças d"A Bagaceira" - ...

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Quando lancei pela Codecri, em 84, ZÉ AMÉRICO FOI PRINCESO NO TRONO DA MONARQUIA, em que apontava semelhanças d"A Bagaceira" - "que rompia com a influência da literatura inglesa sobre a brasileira" - com o "Hamlet" - do mais inglês dos ingleses - Shakespeare -, semelhanças que incluíam pontos marcantes na vida do próprio autor, que literalmente transitava num palácio, o da Redenção, nas tramas que nos levaram à Revolução de 30, tive o livro contestado por Hildeberto Barbosa Filho, José Octávio de Arruda Mello e Wellington Aguiar - três nomes de peso, no estado - cada um num dos nossos grandes jornais, na época: Correio da Paraíba, A União e Jornal da Paraíba. Meu "ensaio com estrutura de romance policial" foi encarado pelos três como coisa tipo cloroquina do Bolsonaro, conceito com que permanece até hoje.

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Quando meu livro saiu em capítulos, pelo Correio da Paraíba, bem antes da publicação no Rio, o escritor, já longe das palavras entredentes que me dirigira quando eu fora à sua casa lhe falar da obra, me mandou um cartão contido: “Você leu meu romance com lentes de aumento. Seu estudo é lapidar e profundo. Mas não pode ter havido influência. Os dramas humanos se repetem”.

Na verdade, eu via algo, ali, como o que Joyce - explicitamente - fizera com a "Odisseia" ao criar o "Ulisses", publicado oito anos antes d’A Bagaceira". Talvez até ... inconscientemente, pois quando - depois do primeiro choque nosso - ele me acompanhou até o portão de sua casa, em Tambaú, eu lhe perguntei se já notara como o começo do romance dele, com os flagelados indo à casa-grande do Marzagão pedir ajuda, repetia o começo do "Édipo", com o povo de Tebas, assolado pela peste, fazendo o mesmo no palácio real, parou e disse: "É mesmo!"

Em 2005, por sinal, em minha HISTÓRIA UNIVERSAL DA ANGÚSTIA, publicada pela Bertrand Brasil, eu incluiria um romanceamento, meu, do "Édipo" e, outro, do "Hamlet".

Tudo isso começou quando associei o Lúcio - angustiado filho do Dagoberto e "que se faz de doido pra viver melhor" - a Lucius Junius Brutus, modelo evidente da saga dinamarquesa de Shakespeare: morto, em Roma, seu pai, Rei Tarquinius, o jovem – pra escapar com vida e vingar-se – fizera-se de doido (daí seu apelido de Brutus, que acabaria sendo o de sua família).
O resto foi fácil. Se o angustiado estudante de direito, Lúcio - de férias na fazenda Marzagão, em Areia - era o angustiado Príncipe universitário de Wittenberg - de férias na Dinamarca, o pai, Dagoberto Marçau, dono da terra, era o Rei Cláudio, padrasto de Hamlet. Soledade, paixão de Lúcio (e do pai dele), era Ofélia - paixão do Príncipe - e, ao mesmo tempo, Gertrudes, Rainha da Dinamarca (paixão do padrasto e - segundo Freud - também do filho). O falastrão Valentim - pai de Soledade - era o falastrão Polônio - pai de Ofélia, que ao vê-lo morto, enlouquece e sai cantando algo que falava de uma donzela que, no dia de São ... Valentim, perdera a virgindade. Pirunga - irmão de criação de Soledade - era Laertes - irmão de Ofélia.

'HAMLET E O COMPLEXO DE ÉDIPO, de ERNEST JONES, discípulo e biógrafo de Freud, foi essencial para mim, nesse estudo. Tudo que, nele, é hipótese, encontra, n’A BAGACEIRA", possibilidade da confirmação. Pergunta-se, por exemplo: Laertes teria, mesmo, um amor incestuoso pela irmã Ofélia, como assegura Jones? N'A Bagaceira”, Pirunga é apenas irmão de criação de Soledade e a deseja ansiosamente, quer casar-se com ela. O Príncipe sentiria, mesmo, um amor criminoso pela mãe? N'A Bagaceira”, Lúcio não consegue possuir Soledade, porque ela se parece tanto com senhora do Marzagão - falecida no parto em que o rapaz nascera - que ele chega a fazer que desenha o retrato da moça, mostrando-lhe, em seguida, a fotografia da finada. É isso.

A vida fascina justamente por seu intrincado modo de agir, que não se esclarece quando cloroquinamente tratado.

O fascínio de ver Ivo Barroso comentando a tradução de L'Amant – De Marguerite Duras – feita por Denise Bottmann Em maio de 2007, e...

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O fascínio de ver Ivo Barroso comentando a tradução de L'Amant – De Marguerite Duras – feita por Denise Bottmann


Em maio de 2007, ele publicou na FOLHA DE SÃO PAULO o artigo “Duras: A Doença Mortal de Escrever”. Quatro anos depois, no blog Gaveta do Ivo, acrescentou:

- Denise costuma dizer que não gosta de traduzir literatura, mas quando o faz é com resultados irrepreensíveis, como neste caso.

Como Ivo Barroso é o grande tradutor de autores como Ítalo Calvino, Breton, Jane Austen, Umberto Eco, Herman Hesse, Rimbaud e Shakespeare, pedi-lhe – com viva curiosidade - que justificasse o adjetivo “irrepreensíveis”. Ele me atendeu, quatro dias depois, no mesmo blog, com a matéria DURAS AINDA:

- Em primeiro lugar, no perfeito conhecimento das línguas, de partida e de chegada. Depois, seus dotes de escritora. Finalmente sua vasta cultura humanística, que lhe permite avaliar estilos, fases, tempos, adequações enfim.

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Ele nos passa, então, um trecho do original, seguido de tradução de Denise Bottmann. Para que se sinta melhor a comparação, junto cada frase em francês, à que ela verteu para o português. Mesmo que você – como eu – não domine o francês, é gostosa essa aproximação às duas vozes:

Très vite dans ma vie il a été trop tard. Muito cedo foi tarde demais em minha vida. A dix-huit ans il était déjà trop tard. Aos dezoito anos já era tarde demais. Entre dix-huit ans et vingt cinq ans mon visage est parti dans une direction imprévue. Entre os dezoito e os vinte e cinco anos, meu rosto tomou um rumo imprevisto A dix-huit ans j’ai vieilli. Aos dezoito anos envelheci. [...] Ce vieillissement a été brutal. [...] Esse envelhecimento foi brutal. Je l’ai vu gagner mes traits un à un, changer le rapport qu’il y avait entre eux, faire les yeux plus grands, le regard plus triste, la bouche plus définitive, marquer le front de cassures profondes. Eu o vi ganhar meus traços, um a um, mudar a relação que existia entre eles, aumentar os olhos, entristecer o olhar, marcar mais a boca, imprimir profundas gretas na testa. Au contraire d’en être éffrayée j’ai vu opérer ce vieillissement de mon visage avec l’intérêt que j’aurais pris par exemple au déroulement d’une lecture. Ao invés de me assustar, acompanhei a evolução desse envelhecimento de meu rosto com o interesse que teria, por exemplo, pelo desenrolar de uma leitura Je savais aussi que je ne me trompais pas, qu’un jour il se ralentirait et qu’il prendrait son cours normal. Sabia também que não me enganava, um dia ele diminuiria o ritmo e retomaria seu curso normal . Les gens qui m’avaient connu à dix-sept ans lors de mon voyage en France ont été impressionnés quand ils m’ont revue, deux ans après, à dix-neuf ans. As pessoas que haviam me conhecido aos dezessete anos, quando estive na França, ficaram impressionadas ao me rever dois anos depois, aos dezenove. Ce visage-là, nouveau, je l’ai gardé. Eu conservei aquele novo rosto Il a été mon visage. Foi o meu rosto. Il a vieilli encore bien sûr, mais relativement moins qu’il n’aurait dû. Claro, ele continuou a envelhecer, mas relativamente menos do que deveria. J’ai un visage lacéré de rides sèches et profondes, à la peau cassée. Tenho um rosto lacerado por rugas secas e profundas, a pele sulcada. Il ne s’est pas affaissé comme certains visages à traits fins, il a gardé les mêmes contours mais sa matière est détruite. Ele não decaiu como certos rostos de traços finos; manteve os mesmos contornos, mas sua matéria se destruiu. J’ai un visage détruit. Tenho um rosto destruído.



Ivo comenta:
- A perícia com que a frase francesa é vertida para o português, mantendo-lhe o mesmo timbre, a mesma inflexão, o mesmo contorno, o mesmo sentido, a mesma validade emocional – mas sendo sem dúvida uma frase NOVA – é o que distingue a excelência da tradução. Além disso, é necessário um envolvimento com o que se traduz – seja para amá-lo, criticá-lo ou odiá-lo – mastigando-o, ruminando-o sem deixar qualquer dúvida quanto ao significado explícito ou meramente intencional.

A tradutora lhe confidenciou:

- como vc vai ver, é um ritmo basicamente recitado, para ser lido em voz alta – como uma história que a gente vai lembrando e contando para alguém, em que as repetições não são tanto para dar ênfase, mas como quando a gente repete alguma palavra para continuar o fio da narrativa, tentando lembrar direito o que aconteceu. o léxico é absolutamente simples (como kafka – com 3 meses de alemão a gente já consegue ler o kafka porque é o vocabulário mais simples que há). isso reforça muito a sensação de que é uma história contada em voz alta para algum amigo. a sintaxe é muito interessante, como se fosse um francês reformado, tirado da caixa tradicional (vc deve saber que a língua mais formalizada, mais petrificada do mundo é o francês…) e reposto numa ordem mais simples também, mais direta, mais enxuta, embora repetitiva – muito, muito desbastado, com algumas poucas liberdades. tentei manter a simplicidade e o ritmo (li várias vezes em voz alta, em surdina, só mentalmente – acho que deu pra passar um pouco esse ritmo de cantilena). quanto a essa “purificação” sintática que ela faz, é mais difícil sentir em português, mas faz com que desapareça aquele ar meio emproado que as traduções do francês costumam ter.

O editor Maurício Ayer:

- A tradutora Denise Bottman comenta que sua atenção se deteve naquilo que chama de “untuosidade” da fala da personagem. “Pareceu-me um tipo de texto eminentemente oral – quando lido em voz alta, você sente uma espécie de onda, não fluida, não líquida, não avassaladora nem, ao contrário, ‘embaladora’. É uma fala untuosa, diria eu – não chega a envolver nem arrastar, mas como que impele leve e inexoravelmente o leitor, como se seus pés estivessem mergulhados (não presos) em um ou dois palmos de lama.

Ivo encerra:

- São cuidados e envolvimentos dessa natureza que levam a uma tradução irrepreensível.

A dedicatória, no “Grande Sertão: Veredas”: Aracy, minha mulher, Ara, pertence este livro não me levou a me perguntar sobre ela...

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A dedicatória, no “Grande Sertão: Veredas”:

Aracy, minha mulher, Ara,
pertence este livro

não me levou a me perguntar sobre ela, nem o símbolo que encerra o romance, o “oito deitado”, do infinito, a lemniscata ou laço de Moebius, ou Moebius - sobrenome original, dela.

Foi necessária uma conjura mineira pra que eu viesse a ter alguma noção acerca dessa pessoa fora do comum. O escritor mineiro, meu amigo Hugo Almeida, fez a orelha do romance do também mineiro Eustáquio Gomes – O Vale de Solombra - , que saiu pela Geração Editorial, que pertence ao escritor, outro mineiro, Luiz Fernando Emediato, onde, nas páginas 21 e 22, se lê que no consulado brasileiro de Hamburgo o vice-cônsul... mineiro - João Guimarães Rosa (depois “escritor traduzido e celebrado”) – facilitava a fuga de judeus para o Brasil, inclusive com vistos e passaportes, estes sem a “estrela de Davi” e o “J” vermelho. Lê-se, também, que isso na verdade não era iniciativa dele, mas de sua companheira, a paranaense Aracy Moebius - chefe da seção de passaportes do consulado - que liberava tudo em prazos recordes, sendo conhecida, nos círculos judaicos, como “o anjo de Hamburgo”.

Ficção do Eustáquio?

Não. Há uma pedra com o nome de Schindler no Jardim dos Justos, de Jerusalém. E outra, com o de Aracy Moebius Carvalho Guimarães Rosa.

Conta a “Concise Encyclopedia of the Holocaust”, que nem a Kristallnacht - Noite dos Cristais, de 09/11/1938 - , em que os nazistas destruíram sinagogas, residências, e estabelecimentos comerciais de judeus na Alemanha e na Áustria, dando início ao que seria a chamada de “solução final”, nem a ordem do Itamarati – então pró-Hitler – que, na Circular Secreta Nº 1.127, de Getúlio, determinava que não se mandassem hebreus pro Brasil, fizeram com que essa Aracy parasse. Metia os vistos no meio da papelada que o cônsul-geral – coisa bem de brasileiro - assinava sem ler, e chegava a esconder seus protegidos em casa, para, depois, transportá-los no porta-malas do carro do consulado, um Opel Olympia alemão.

O casal Aracy/Guimarães Rosa foi obrigado a voltar ao Brasil em 1942, quando o virandum, numa virada de casaca muito misteriosa, declarou guerra ao Deutschland über Alles.

Ela, bela filha de português com alemã, separara-se do primeiro marido, alemão, em 34, e se mandara com o filho Eduardo Tess para a terra do Führer, onde se empregara no consulado brasileiro de Hamburgo, cujo cônsul adjunto era o jovem João Guimarães Rosa, que também vinha de um casamento arruinado. Amaram-se, casaram-se no México, viveram juntos até a morte do escritor em 1967, aos 59 anos.

Mas, voltando à dedicatória no Grande Sertão: Veredas. Olha que pergunta cavilosa de Alfredo Fressia, num pequeno ensaio sobre a mulher do escritor:

- “Por qué Guimaraes le dedicó ese libro, de 1956, y no los precedentes, como Sagarana, de 1946? La historia de Grande Sertao…, recreada por la memoria caprichosa de Riobaldo, quien va recomponiendo su amor por otro hombre - que se revelará un travesti masculino -, tiene una parte de desobediencia, un juego entre la rebeldía y la aparente aceptación, que podría contener algo de Aracy, la mujer que supo desafiar el orden y las órdenes de su tiempo.”

Claro. Ela não deu a mínima pros nazistas, pro Estado Novo, nem pra nossa ditadura pós-64, quando, por exemplo, um ano após a morte de Guimarães Rosa, escondeu em seu apartamento, no Arpoador, ninguém menos do que o paraibano Geraldo Vandré, perseguido por causa da canção “Pra não dizer não falei das flores”.

Mas parece que ela foi além.

A judia alemã Maria Margarethe Bertel Levy era lindíssima. De pais ricos e liberais, falava sete linguas e viajava muito. Até Hitler chegar ao poder. Aí, com a ajuda de Aracy Moebius, ela e seu marido Hugo partiram da Alemanha no navio Cap Ancona e chegaram ao Brasil com a fortuna intacta. Uma - brasileira, católica -, a outra - alemã, judia, as duas, belíssimas, iniciaram ali uma ligação que se prolongaria no Rio até o fim de suas longas vidas.

Na entrevista que deu à repórter Eliane Brum, da Revista Época, já no fim da vida, Margarethe disse:

- Entre mim e Aracy foi um golpe de amor. Só que entre duas mulheres. Eu era sexy. E Aracy?Linda, provocante, um corpo maravilhoso.

"Quando uma ficava doente – conta a reportagem - , a outra também ficava. Parecia que sentiam as mesmas coisas. Em 2003 as duas caíram, uma em casa, outra na rua, e acabaram ficando de cama até o final."

Enquanto Margarethe morria no hospital, a respiração de Aracy Moebius, em casa, começava a falhar. Maria Margarethe Bertel Levy morreu em 21 de fevereiro de 2011– e Aracy Moebius de Carvalho Guimarães Rosa em 3 de março. Ambas com 102 anos.
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É de Piero della Francesca o afresco que a vila de Sansepolcro caia, sem reação, como indigno da terra de tão bello e sinistro nome , que ...

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É de Piero della Francesca o afresco que a vila de Sansepolcro caia, sem reação, como indigno da terra de tão bello e sinistro nome, que assim o amortalha, com Piero vivo, no interior da Itália.

O que há de ser, no entanto, tem muita força, como se lê n´A Bagaceira, em que se reformula, queira ou não queira, o que diz o vidente do Édipo Rei: o mesmo Que será, será, sucesso da Doris Day. A cal pura conserva a pintura.
<br

Logo depois de O SOM AO REDOR, ainda em 2010, fui convidado a trabalhar como ator em ERA UMA VEZ EU, VERÕNICA, do Marcelo Gomes – célebre...

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Logo depois de O SOM AO REDOR, ainda em 2010, fui convidado a trabalhar como ator em ERA UMA VEZ EU, VERÕNICA, do Marcelo Gomes – célebre autor de CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS. Para me preparar e à Hermila Guedes, o jovem cineasta Pedro Freire foi chamado do Rio e teve um trabalho enorme pra que eu deixasse de lado o personagem – gozador rico e abusado – do filme do Kleber Mendonça Filho, pra me tornar o doente terminal que sustentava o curso de medicina da filha com bicos de contador.

1 Santos Dumont, ao construir o 14-bis — não havendo, na época (evidentemente) motores para aviões —, serviu-se de um Antoinette V-8, cri...

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Santos Dumont, ao construir o 14-bis — não havendo, na época (evidentemente) motores para aviões —, serviu-se de um Antoinette V-8, criado por Léon Levasseur, no ano anterior, para barcos de corrida.
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Em 1941, o engenheiro suíço George de Mestral intrigou-se com a forma com que carrapichos grudavam nas pernas de suas calças. A partir de observação ao microscópio, notou que o desgraçado é cheio de pequenos ganchos e, ao atentar para as roupas em que ele sempre... se enganchava, o homem sacou que os tecidos são sempre compostos de enorme quantidade de laços, daí que a hastezinha grudava no pano. E assim surgiu o... velcro.

Eu tinha 13, 14 anos quando meu pai me deu o livro “Primeiro Encontro com a Arte”, da Melhoramentos, do alemão-depois-baiano Karl-Heinz Ha...

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Eu tinha 13, 14 anos quando meu pai me deu o livro “Primeiro Encontro com a Arte”, da Melhoramentos, do alemão-depois-baiano Karl-Heinz Hansen, com fotos de quadros famosos de vários museus do mundo. De repente dou com um autorretrato de Rembrandt, do... Museu de Arte de São Paulo – o MASP, a uma hora de trem ou de ônibus de Sorocaba. De tanto insistir, mandaram minha irmã Wilma - então jovem e muito bonita, que perdi há não muito tempo com 88 anos – que me levasse.

Datilografei meus primeiros romances – nos anos 70 - e algumas peças de teatro – nos anos 80. Os filmes de que participei como ator, naq...

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Datilografei meus primeiros romances – nos anos 70 - e algumas peças de teatro – nos anos 80. Os filmes de que participei como ator, naquele tempo - O Salário da Morte (de 69 ), Fogo Morto e Soledade ( de 76 ) não tiveram som direto, por isso eu e a maioria dos atores fomos dublados no Rio. Os comerciais que criei pra TV eram feitos em 16 milímetros e levados ao Recife, pois não havia o vídeo e não tínhamos emissoras locais.

O quadro " Intervalo" - de Edward Hopper -, que ilustra este texto, capta o vazio que já senti tantas vezes entre duas sessões ...

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O quadro " Intervalo" - de Edward Hopper -, que ilustra este texto, capta o vazio que já senti tantas vezes entre duas sessões de cinema, ansiedade que não conseguiria definir melhor do que Bráulio Tavares num de seus extraordinários artigos do Jornal da Paraíba, que cito de memória:

Não há o que mais me impressione no ser humano do que vê-lo pintando bisontes e mamutes nas paredes e tetos das cavernas, há 15 mil, 30 mi...

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Não há o que mais me impressione no ser humano do que vê-lo pintando bisontes e mamutes nas paredes e tetos das cavernas, há 15 mil, 30 mil anos. Talvez por isso, a primeira forma de arte que encarei tenha sido a pintura e, antes dela, o desenho. Posaram para mim o meu avô, meu pai, mãe e irmãos.

O momento que vivemos no país me levou ao Minory Report , que Spielberg lançou em 2002. O brasileiro Miguel Angelo Laporta Nicoelis , que ...

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O momento que vivemos no país me levou ao Minory Report, que Spielberg lançou em 2002. O brasileiro Miguel Angelo Laporta Nicoelis, que foi o primeiro cientista a receber, no mesmo ano, dois prêmios dos Institutos Nacionais de Saúde estadunidenses, o primeiro brasileiro a ter um artigo publicado na capa da revista Science, e que lidera um grupo de pesquisadores da área de Neurociência na Universidade Duke, Durham (Estados Unidos), disse, ante os mais de 350 mil mortos pela covid 19 no Brasil, que “podemos chegar a 500 mil na metade do ano”.

Minority Report:

“No ano de 2054, há um sistema que permite que crimes sejam previstos com precisão, o que faz com que a taxa de assassinatos caia para zero”.

Nicolelis fala, portanto, como um dos três chamados Precogs, que "previsualizam" crimes , recebendo visões do futuro, uma delas, a de que Anderton (Tom Cruise) vai assassinar um homem chamado Leo Crow – que ele sequer conhece - em 36 horas.

Isso me remete, por sua vez, ao “Édipo Rei”, de Sófocles, em que o oráculo de Delfos prediz que ele matará o pai e se casará com a mãe, o que significa que – em 429 a.C e no ano 2054 – continuamos com o velho problema envolvendo Liberdade e Determinismo.

Anderton, no entanto, fica sabendo que um dos Precogs tem uma visão diferente dos outros dois, um "relatório minoritário" - o Minority Report do título - de um possível futuro alternativo.

A vida imita a arte:

Alessandro Vieira, Jorge Kajuru e outros senadores cobram de Rodrigo Pacheco – presidente do Senado - a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) , destinada a investigar as ações do governo no combate à pandemia de coronavírus.

Mas…

Pacheco – que deve o cargo a Bolsonaro - reiterou que o momento atual não favoreceria a abertura da comissão parlamentar de inquérito e que aguardaria a posição do STF sobre o pedido apresentado à Corte pelos senadores. E é informado pelo senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) sobre decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, que determinou a instalação da CPI.

Falei em Édipo, em Precog, em Nicolelis, no STF, no Pacheco. Leiam isto:

Mateus 13, 13-15:

- Por essa razão eu lhes falo por parábolas: "Porque vendo, eles não veem e, ouvindo, não ouvem nem entendem”.

Neles se cumpre a profecia de Isaías:

"Ainda que estejam sempre ouvindo, vocês nunca entenderão; ainda que estejam sempre vendo, jamais perceberão. Pois o coração deste povo se tornou insensível; de má vontade ouviram com os seus ouvidos, e fecharam os seus olhos. Se assim não fosse, poderiam ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, entender com o coração e converter-se, e eu os curaria”...

No gigantesco poema que é A Catedral de Colônia, o imenso poeta que é o Affonso Romano de Sant´Anna - com todos os seus efes e enes - diz ...

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No gigantesco poema que é A Catedral de Colônia, o imenso poeta que é o Affonso Romano de Sant´Anna - com todos os seus efes e enes - diz ser natural que no país de catedral tão magnífica, florescessem pensadores como Nietzsche, Kant, Heidegger, Schopenhauer. "Mas eu queria/ era ver/ o nada / nascer /do nada". "Queria ver/ era ali/ no Catolé do Rocha e Nanuque".