Aprender as lições que a vida oferece é dever não só dos filósofos mas de todos nós, simples mortais, que almejamos, mesmo sem maiores er...

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Aprender as lições que a vida oferece é dever não só dos filósofos mas de todos nós, simples mortais, que almejamos, mesmo sem maiores erudições e metafísicas, um mínimo de sabedoria que nos permita viver (e morrer) melhor. Tive um amigo, um dileto amigo, que teve, como poucos que conheci, a graça desse aprendizado existencial, cujo acesso não é propriamente gratuito, pois que exige um mínimo de sensibilidade perscrutadora para as experiências banais e extraordinárias da existência

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Esse amigo, pode-se dizer, teve uma vida plena de vivências fundamentais. Conheceu, na carne e na alma, altos e baixos da Fortuna, e teve a Virtude de saber colher os ensinamentos, não raro dolorosos, ofertados pelo instável girar da roda da vida. Tudo isso com um detalhe precioso: não tornou-se amargo, nem irônico nem ressentido. Pelo contrário. Conservou até o fim uma saborosa leveza de espírito, uma capacidade sempre renovada de achar graça nos e dos acontecimentos, como se dissesse a todo momento para si e para os outros: “É assim mesmo. Vamos em frente”.

Sua máxima filosófica resumia-se a uma frase que repetia a cada contratempo, a cada contrariedade: “É preciso colaborar com o inevitável”. Máxima que ele muitas vezes tratava de explicar, como que para reforçar o significado do que dizia: “Não adianta sofrer demais com o que não se pode mudar. O mais certo – e mais producente – é aceitar o inevitável, administrá-lo, e, se possível, superá-lo”. Em outras palavras, seguir com a vida, ir sempre em busca do que ainda poderá vir, não prender-se melancolicamente ao ingrato presente ou ao passado sombrio, ter olhos abertos para o futuro, o qual costuma nos acenar, ilusoriamente ou não, com a possível realização de nossas humanas esperanças.

Lendo recentemente um texto sobre os estoicos, antigos filósofos gregos e romanos (Zenão, Epiteto, Cícero e Sêneca, entre outros), constatei que o meu amigo pertenceu, em alguma medida, e mesmo sem sabê-lo, a essa escola do pensamento, cuja ideia central era – e é - “a de que só deveríamos nos preocupar com as coisas que podemos mudar e não deveríamos nos perturbar com mais nada”. Os estoicos acreditavam (e acreditam) que “podemos escolher como será nossa reação à boa e à má sorte”. Ou seja: “não temos de nos sentir tristes quando algo que queremos dá errado; não temos de sentir raiva quando alguém nos engana”. Vejam só.

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Não digo que o meu amigo tenha sido um estoico na plena expressão da palavra, ao ponto de não sentir raiva nem entristecer-se com os reveses. Mas o certo é que ele, passado o primeiro e humano desabafo, logo voltava ao sábio refrão: “É preciso colaborar com o inevitável”, o que demonstra que procurava, dentro do possível, manter o extravasamento das emoções sob controle. E nisso estavam, simultâneas, a sua humanidade e a sua sabedoria.

É certo que, levado ao extremo, o estoicismo pode nos conduzir à indiferença, o que também não é bom. Segundo o professor britânico Nigel Warburton, “o estado de indiferença defendido pelos estoicos pode diminuir a infelicidade diante dos eventos que não conseguimos controlar. Contudo, talvez tenhamos de pagar o preço de nos tornar frios, insensíveis e talvez até menos humanos. Se esse for o preço da tranquilidade, talvez seja alto demais”. Concordo plenamente. Nem tanto nem tão pouco, como se diz. Tenhamos bom senso. Controlar as emoções e as paixões, sim, mas não ao ponto de suprimi-las de nossa experiência.

Uma frase célebre, atribuída parece que equivocadamente a José Américo de Almeida, em seu livro “A bagaceira”, insere-se também nessa linha estoica. Refiro-me a “O que tem de ser, tem muita força”. Sim, porque reconhecer a força do que tem de ser é aceitar sua inevitabilidade, o que implica renunciar a brigar com o que não pode ser diferente. No fundo, trata-se tão só de aceitar nossas limitações, nossos pequenos recursos perante o poder imenso das circunstâncias, dos acontecimentos, do acaso, do destino, da Providência ou seja lá do que for. Trata-se de baixarmos humildemente a orgulhosa cabeça diante do que é maior do que nós. E aqui, claro, não se está defendendo um generalizado conformismo por parte dos homens, mas apenas a ciência de não se dar, inutilmente, murro em ponta de faca, como bem recomenda a sabedoria popular.


Sabemos por experiência que não é fácil suportar as vicissitudes. Nossa tendência, quase incontrolável, é nos zangarmos, nos revoltarmos. Mas nada que uma noite de sono não acalme e esclareça. E aí, sim, com a ira dominada, podermos nos dar ao luxo de humanamente colaborarmos com o inevitável.

A Tadeu , nosso irmão, de quem não nos despedimos, apartado que foi de nós, repentinamente, tendo encontrado sepultura nas terras das Min...

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A Tadeu, nosso irmão, de quem não nos despedimos, apartado que foi de nós, repentinamente, tendo encontrado sepultura nas terras das Minas Gerais.

Catulo, poeta latino do século I a. C. (84—54), é o único dos neóteroi (literalmente, "os mais jovens"), assim chamados, polêmica e pejorativamente, por Cícero, para designar os novos poetas que procuravam inovações na poesia latina, imitando os alexandrinos gregos. Desses novos, Catulo é o único cuja obra sobreviveu, sendo considerado um dos criadores da lírica latina.

O episódio nº 10 da Pauta Cultural entra no ar na ALCR TV com atualidades do mundo cultural participação dos autores leitores e telespec...

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O episódio nº 10 da Pauta Cultural entra no ar na ALCR TV com atualidades do mundo cultural participação dos autores leitores e telespectadores do Ambiente de Leitura Carlos Romero.

Nesse dia 26 de outubro próximo passado, foi comemorado o Dia do Dentista no Brasil. Aqui, a sua existência vem desde os primórdios da des...

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Nesse dia 26 de outubro próximo passado, foi comemorado o Dia do Dentista no Brasil. Aqui, a sua existência vem desde os primórdios da descoberta do Brasil por Pedro Álvares Cabral em 22 de abril de 1500, quando se restringia quase que só as extrações dentárias, cujas técnicas eram bem rudimentares, com o instrumental inadequado e ainda por cima, sem anestesia. É considerada uma das profissões mais antigas do mundo, tendo os arqueólogos egípcios descoberto que as primeiras três tumbas de dentistas datam da época faraônica, encontradas nas escavações do Egito do Império Antigo, (2575-2170 a.C.). Noutros países, é comemorado o Dia Mundial do Dentista, no dia 3 de outubro.

Era uma caixinha mágica. Tinha muitos poderes: Falar, cantar, sorrir, emocionar... Isso era feito em muitos idiomas. Das minhas primeiras...

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Era uma caixinha mágica. Tinha muitos poderes: Falar, cantar, sorrir, emocionar... Isso era feito em muitos idiomas. Das minhas primeiras lembranças ainda moleque ela estava lá. Engraçado como está gravado na memória afetiva mais devido ao que eu ouvia da sua "boca" do que à minha percepção de como era fisicamente aquela caixinha falante. A invenção atribuída ao italiano Guglielmo Marconi chegava aos meus ouvidos antes de ganhar forma aos meus olhos.

"Mãe, só tem uma". Pois é, crescemos ouvindo essa máxima. Embora ginecologicamente seja correta, a história mostra que, bem... ...

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"Mãe, só tem uma". Pois é, crescemos ouvindo essa máxima. Embora ginecologicamente seja correta, a história mostra que, bem...

... Não é bem assim!

Em 2018, meu amigo cronista Luiz Augusto Paiva da Mata teve um encontro inusitado que mudou sua vida. Viajando a noite por terras brejeiras...

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Em 2018, meu amigo cronista Luiz Augusto Paiva da Mata teve um encontro inusitado que mudou sua vida. Viajando a noite por terras brejeiras, topou com um saci, na verdade, dois, um casal, conforme nos relatou no jornal A União em pelo menos sete crônicas, discernindo com competência as muitas características. Mas quem teria coragem em acreditar no relato desse escritor sobre essa livusia que perfaz nosso folclore?

TODO OUVIDOS O eu lírico sofre de delírios esquizofrenoides: Ponge ouve coisas; Bilac ouve estrelas; Gullar, muitas vozes.

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TODO OUVIDOS
O eu lírico sofre de delírios esquizofrenoides: Ponge ouve coisas; Bilac ouve estrelas; Gullar, muitas vozes.

Em 1997, foi inaugurado, em Campina Grande, o Museu Vivo da Ciência e Tecnologia . Em uma das conferências realizadas quando da abertura d...

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Em 1997, foi inaugurado, em Campina Grande, o Museu Vivo da Ciência e Tecnologia. Em uma das conferências realizadas quando da abertura do espaço, um renomado pesquisador do Instituto Butantan, de São Paulo, discorria sobre as consequências da extinção de algumas espécies para o ecossistema da Caatinga. Na explanação sobre os aracnídeos, citou o cientista brasileiro Mello Leitão, reputando-o como um dos nomes mais importantes nessa área em todo o mundo.

Os sinos do campanário Dobram os velhos sinos A cantarem êneos fados, No campanário carcomido, Pelas rezas dos tempos passados.

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Os sinos do campanário
Dobram os velhos sinos A cantarem êneos fados, No campanário carcomido, Pelas rezas dos tempos passados.

Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni, não menos famoso que Leonardo da Vinci, nasceu em um castelo em ruínas do Casentino, na Toscan...

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Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni, não menos famoso que Leonardo da Vinci, nasceu em um castelo em ruínas do Casentino, na Toscana, construído sobre uma crista rochosa no alto de um despenhadeiro, onde abaixo corre o Tibre seguindo seu curso em direção a Roma, em 6 de março de 1475, falecendo em Roma no dia 18 de fevereiro de 1564, aos 89 anos. Era 23 anos mais moço que Leonardo da Vinci.

Não basta ao homem a informação. Ele — o conhecimento — não se instala como “verdade” na vida de quem o procura. Na maioria dos casos,...

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Não basta ao homem a informação. Ele — o conhecimento — não se instala como “verdade” na vida de quem o procura. Na maioria dos casos, ele remenda o que a vida e as circunstâncias históricas trataram de esgaçar e ferir.

Quando celebramos os noventa anos de nascimento do poeta Ferreira Gullar, prefiro falar dele como estudio...

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Quando celebramos os noventa anos de nascimento do poeta Ferreira Gullar, prefiro falar dele como estudioso do universal Augusto dos Anjos, sobre o qual escreveu um primoroso estudo crítico acerca da obra do nosso conterrâneo.

“O senhor tem uma casa para alugar em Mussumago?”… Se não conhecesse o nome do bairro, pensaria em algum lugar distante, além-mar… ou mesm...

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“O senhor tem uma casa para alugar em Mussumago?”…

Se não conhecesse o nome do bairro, pensaria em algum lugar distante, além-mar… ou mesmo em um engano. Mas já não é tempo de trotes telefônicos. A identificação visualizável de qualquer chamada os afugentou. Ademais, o tom de voz parecia sincero.

Certo jornalista de bom papo e excelente profissional (saudosa memória) me narrou o que passo a vocês agora. Bem conceituado como profissi...

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Certo jornalista de bom papo e excelente profissional (saudosa memória) me narrou o que passo a vocês agora. Bem conceituado como profissional, com timbre nas melhores folhas da cidade, resolveu se candidatar a um assento na Associação Paraibana de Imprensa. Afinal, já dera suas respeitadas opiniões, fora repórter, com muitas passadas na redação, ao ar livre, e dispunha de currículo na imprensa local que lhe permeava a ser presidente da entidade da classe.

“No princípio era o verbo”. Esta é uma das mais controvertidas frases do Evangelho, menos pela doutrina do que pelo o que ela significa. Mu...

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“No princípio era o verbo”. Esta é uma das mais controvertidas frases do Evangelho, menos pela doutrina do que pelo o que ela significa. Muitos têm se debruçado sobre o significado de lógos, em grego. Como traduzi-lo? Verbo ou razão? As discussões quase sempre se encaminham para argumentos isolados do contexto. Não há como negar a dificuldade da tradução, mas ela não pode ser feita considerando-se apenas a palavra. O contexto em que ela se apresenta, diga-se que é um contexto único no Evangelho de Cristo, deve ser considerado. Essa frase que inicia o Evangelho de João e que só aparece nele está dentro de um texto que se quer assertivo e predicativo.

Como seria viver no ano de 1794? As pessoas viviam sem conforto, com dificuldades, condições de vida muito precárias. Para se iluminar as ...

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Como seria viver no ano de 1794? As pessoas viviam sem conforto, com dificuldades, condições de vida muito precárias. Para se iluminar as casas, usava-se banha de carneiro nas luminárias, plantava-se para o próprio sustento e confeccionavam-se as próprias roupas.

“Escavação e transmutação são ingredientes fundamentais da minha produção e se fundem a interesses por temas como corpo, passado, memória...

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“Escavação e transmutação são ingredientes fundamentais da minha produção e se fundem a interesses por temas como corpo, passado, memória, saudade, morte, relação público-privado e oprimido-opressor... Cada obra resgatada assume aqui a tarefa de complementar outra para compor um corpo só, um arquivo quimérico ou uma corda do tempo feita de fios de várias idades e diferentes matérias.”
José Rufino

Há dois anos, José Rufino, artista plástico paraibano, escritor, professor de Artes da UFPB e UFPE, autor do livro "Afagos" — ou geólogo, paleontólogo, jardineiro — ou artista simplesmente, e tantas outras coisas —, participou da 5ª edição dos Debates Psicanalíticos "Arte e Trauma". Fui assistir-lhe e sou grata por ter mergulhado nessa noite do saber.

Rufino, professor que é, preparou uma palestra irretocável e eloquente sobre o mistério da criação, sobre a linguagem, enfocando o seu próprio processo criativo. Para tanto, mergulhou em assuntos diversos, como o papel do artista pesquisador, sua família, infância, estudos, formação, interesses, vida em Recife, referências a outros artistas, vida política dos familiares, mágoas, tabus, rastros, engenhos, pegadas, eurekas e epifanias. Concluiu a exposição com o seu trabalho sobre os Desaparecidos Políticos, acreditando ele que isto remeteria ao passado, quando, na verdade, infeliz e ironicamente, seria falar do presente.

“O artista trabalha para a linguagem, para estabelecer paradigmas!”. Com slides, percorremos as artes rupestres, Stonehenge, paisagens bíblicas, até chegarmos em Van Gogh, Antônio Dias, a fotografia, o cinema e outras artes contemporâneas que não mais desejam representar a realidade, mas um conjunto de novas experiências/fragmentos e relações... no lugar da obra em si. O artista e o coletivo: o ateliê, o crítico, o mercado (que agora terá que entender, provocar e se adaptar) e toda a cadeia, a visão sistêmica do criador x observador, que se contrapõe ao artista isolado.

Logo foi exibida "A Fonte", de Duchamp, transgredindo todos os conceitos... até hoje! O deslocamento do objeto, do olhar, do óbvio para a sensualidade de um outro corpo. Uma bicicleta que gira fora de um guidão, mas agora num busto. O busto do desvio. Uma coisa que é outra coisa, e mais um monte de ressignificados.

E Rufino lançou o susto: “A criação artística é livre?”. Como formular isso tendo em vista a tradição e a ruptura?. A questão da autoria; a pulsão da criação é livre? — “A ideia torna-se uma máquina de fazer arte” — citou Sol LeWitt. "Será que a Arte perdeu a sua capacidade de criar? Provocar?" — instigou o palestrante.

O artista quer ser revolucionário. Mas também quer ser assimilado. Eis a questão! Essa revolução vai ampliar o simbólico e o mercado vai à reboque. Exemplos como o Projeto Coca-Cola de Cildo Meireles, a calça Jeans e o caminho que percorreu (desde os operários americanos até os dias de vitrine de hoje) ilustram algumas das ideias discutidas.

A artista/performer feminista cubana Ana Mendieta unia seu corpo com a terra para tornar-se uma extensão da natureza. Rufino utiliza a "criação e a cura", o "eu lírico", o "poético" para falar de assunto que sangra. Frida Kahlo utilizou o corpo para falar das suas dores. E seguimos interessados naquele caminho sem fôlego.

Enquanto o artista falava das cartas familiares e todo o seu trabalho ruminante de escavações literárias/simbólicas/poéticas, fiquei a pensar na instalação "Intolerância" de Siron Franco, que visitara em São Paulo, alguns anos antes, trabalho que me marcou muito. Aconteceu no Memorial da Liberdade (antigas salas do DOI-CODI). Uma amiga — que viveu os tempos da ditadura em São Paulo, tendo sido presa e torturada — ficou incomodada com o título. “Como tortura é intolerância? Isso é minimizar! Intolerância é algo menor do que se viveu nas galerias desse lugar sangrento” – exclamava ela com todas as suas razões. Hoje, olhando em perspectiva, até acho forte o termo "intolerância", pois é nele que tudo se inicia.

Fiquei transtornada ao me deparar com uma montanha de sapatos des-encontrados. Gastos. Maltrapilhos. E mais uma outra de bonecos do tamanho de gente, vestidos como se gente fossem. Os "corpos" amontoados, jogados em valas, tenebrosos. Quase tive ânsias, de tão fortes esses corpos me pareciam; esgotados e no mais sub-humano que os humanos podem estar; subjugados por seus algozes. "Tortura Nunca Mais!" — pensei naquele momento. Hoje, esse slogan se perde nas fake news! Um horror que se anuncia sorrateira e agressivamente.

Rufino seguia a falar dos seus métodos, processos, persistências, listas, arquivos, desafios, obras inimigas e riscos. Pensei, então, na complexidade dos seres humanos. Observei o artista inquieto, que trabalha com o passado, com a memória e com o esquecimento, com o corpo e o espírito, a opulência e as faltas. Sua arte já vem nas profundezas das Terra. Uma carta não é mais uma carta! E a arte ressignifica sim.
É uma única forma de se viver a catarse e redimensionar um trauma. No filme Desejo e Reparação (2007), só a literatura salva tanta mentira irreversível quando se tem a morte. A artista francesa Sophie Calle também tomou emprestado uma carta do companheiro que rompia o amor, e criou uma instalação: "Cuide de Você". Exorcizando sua dor em público e assim, quem, sabe, superando-a. Calle, Duchamp, Rufino, assim, refazem dores, fontes, mágoas, lágrimas, rancores, para poderem transcender significados anteriores e lançarem outros olhares e leituras de um fato, de um desejo, da morte e principalmente da vida.

"Plasmatio" foi uma das exposições na Bienal de São Paulo que deu foco à palestra. Recentemente, tivemos a oportunidade de ver uma outra exposição: "Limbo", resultado de um processo de resgate de obras que estavam guardadas, perdidas, esquecidas, desprezadas, inconclusas ou apenas à espera de uma chance para aflorar pelas brechas. É também repleta de caminhos, peças, cronologias e perdições, talvez daquilo que tem nesse espaço suspenso: o limbo de nossa existência.

Em 30 anos de trabalhos fortes, enigmáticos, com rasgos de vida na frente e no verso, percebi que conhecia quase nada daquele artista escavador, tão diverso, perfeccionista e determinado, conforme as minhas impressões. Um pesquisador da alma, dos rastros de sua família, não só da família autobiográfica (que ele se transveste pelo nome do avô (para ter ainda mais legitimidade dessa escavação do passado), mas da família ampla da humanidade. Um pesquisador de um período histórico, como neste tempo em particular, da Ditadura Brasileira.

Rufino encerrou dizendo: ”Artistas são como bola de soprar! Podem estourar!" — Fiquei de olhos bem abertos durante quase três horas ouvindo-o discorrer com tanta propriedade sobre seu trabalho, sobre Arte, sobre História e sobre os enigmas dos processos criativos... dele e de outros.

Aplausos sempre!




Ana Adelaide Peixoto Tavares é doutora em teoria da literatura, professora e escritora

Quais seriam os segredos guardados há séculos nos pavimentos e nas paredes das construções do Centro Histórico de João Pessoa? Ou mesmo no...

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Quais seriam os segredos guardados há séculos nos pavimentos e nas paredes das construções do Centro Histórico de João Pessoa? Ou mesmo nos paralelepípedos das ladeiras e ruas daquela região? Os amores impossíveis, os açoites implacáveis, porres sofridos, sorrisos perdidos. Cada história silenciada, testemunhadas por seres que se foram, ficaram abafadas e de alguma forma registradas em pedra e cal.

Eis que retornavam então dos campos aqueles caçadores, atraídos dessa feita pelo surpreendente superávit alimentar que agricultores vinham ...

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Eis que retornavam então dos campos aqueles caçadores, atraídos dessa feita pelo surpreendente superávit alimentar que agricultores vinham conseguindo acumular. Esse excedente era em grande parte fruto da cultura do arado que, a par com a domesticação de animais pesados, provocara uma reviravolta no cultivo das plantas, e dando origem assim aos primeiros afastamentos e diferenciações no modo de vida aldeã.