A revista “Entrelivros” publicou, em abril/2006, trechos de minha entrevista ao poeta Fabrício Carpinejar sobre Mário Quintana , cujo cent...

Entrevista na 'Entrelivros' (Parte 2)

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A revista “Entrelivros” publicou, em abril/2006, trechos de minha entrevista ao poeta Fabrício Carpinejar sobre Mário Quintana, cujo centenário de nascimento foi comemorado naquele ano. Por razões de espaço, o texto da entrevista não foi publicado de forma integral, razão pela qual veiculo os trechos que foram omitidos.


Fabrício Carpinejar: “Longe daqui, aqui mesmo” é um dos poucos estudos publicados sobre Mario Quintana. Por que Quintana é pouco valorizado na Universidade?
Sérgio de Castro Pinto: Creio que, durante algum tempo, as vanguardas e um certo estruturalismo tornaram mais ou menos corrente a idéia segundo a qual o poeta deveria trabalhar o poema “Longe do estéril turbilhão da rua”.
Quer dizer: se, no circuito universitário, os textos eram estudados na sua imanência, os poetas não deixavam por menos: cada vez mais investiam no discurso metalingüístico, como se ao poema cumprisse tão somente questionar a linguagem; e ao poeta, ostentar a sua performance, o seu virtuosismo, no tratamento da palavra escrita. Uns e outros, então, fizeram-se reféns de breviários estéticos, enquanto o lírico Quintana, embora não fosse matriculado em nenhuma escola, freqüentasse todas indistintamente. Mas isso sem sacrificar a alma boêmia das ruas, as quais ocupou ora de corpo inteiro, ora espiando-as através das muitas janelas que abriu nos seus poemas.

Exceção feita a Fausto Cunha e alguns poucos, pouquíssimos, os críticos brasileiros jamais aceitaram o lírico Quintana como um poeta superior, capaz de figurar entre os maiores da poesia nacional.


FC: Comenta-se que a poesia de Quintana carece de envolvimento social. Isso é verdade ou o ato de falar de coisas banais e prosaicas, das relações perecíveis, já é um envolvimento social e não parece à primeira vista?
SCP: Para melhor explicitar o sentido do social na obra do autor gaúcho, recorro a um trecho do meu ensaio “Longe daqui, aqui mesmo – a poética de Mario Quintana” (Editora UNISINOS, São Leopoldo, Rio Grande do Sul, 2000), cuja 1ª edição já foi esgotada: “O seu ‘sentimento do mundo’ passa, necessariamente, pelo crivo de uma visão intimista da realidade,
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o que embarga a fatura de uma poesia de cunho meramente doutrinário. Quer dizer: os jargões, as palavras de ordem, o proselitismo, não encontram guarida nos seus poemas, pois, para ele, o social extrapola os estreitos limites dos credos políticos e religiosos para abranger, em toda a sua plenitude, os atos mais comezinhos e prosaicos da existência humana.

“Nabucodonosor”, por exemplo, é um poema social por excelência, já que o poeta vai demolindo o porte catedralesco, litúrgico e régio do nome do rei da Babilônia para, no final, abreviá-lo e reduzi-lo a um simples e nada majestático apelido: Bubu. Ou seja, ele o despe das muitas letras perfiladas, contritas e solenes para anunciar, desta feita com todas as letras, que o rei está nu.


FC: Quintana mereceria receber a mesma consagração de Manuel Bandeira?
SCP: Quintana estreou com um livro de soneto quando esse gênero poético já havia sido posto em disponibilidade pelos modernistas de 22. E, mais do que isso, com uma poesia de ressonâncias neo-simbolistas, ao passo que Bandeira, mesmo discretamente, sem bazófias e pirotecnias, participara do movimento de 22. Ora, mas o próprio Bandeira, à época da Semana de Arte Moderna, ainda cultivava uma poesia de extração parnaso-simbolista, embora não faltasse quem identificasse, mesmo em “A Cinza das Horas”, seu livro de estréia, algum desejo de mudança.

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Mas há quem, a exemplo de Fausto Cunha, minimize a influência parnaso-simbolista na obra do lírico de Alegrete, sobretudo quando chega a assegurar que as suas “relações (...) com o modernismo parecem óbvias no texto da Rua dos Cataventos”. Isso sem contar que, ainda para o crítico e ficcionista pernambucano, “a metrificação de Quintana está longe de ser a tradicional entre nós”.

Já o humor e a ironia de Bandeira e de Quintana, mais do que decorrentes da alegria que se estampa no rosto através do riso fácil, provêm do riso difícil, cáustico algumas vezes, pungente outras, mas quase sempre oriundo de um aparente não-me-importismo diante da triste condição humana.

O reconhecimento de Bandeira por parte da crítica veio cedo, praticamente desde a sua estréia, embora a consagração somente tenha ocorrido a partir de “Libertinagem”, livro com o qual ele embarca de uma vez por todas na aventura modernista.

Já quem consagrou Quintana foi o público, o que lhe valeu a reavaliação de alguns críticos, não obstante a maioria deles ainda permaneça como alvo principal do irônico e jocoso “Poeminha do contra”:

Todos esses que aí estão Atravancando o meu caminho, Eles passarão... Eu passarinho.


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