Essa coisa de vocação umas vezes é muito simples e outras é muito complexa. Há crianças que praticamente já nascem chamadas para um ofício ou arte, como Mozart. E há idosos que nunca descobriram verdadeiramente sua aptidão mais profunda. Claro que Mozart foi um gênio e uma exceção, mas há casos e casos semelhantes. O que quero dizer é que identificar a vocação e poder segui-la com algum êxito é uma dádiva, uma felicidade que se reflete em todos os outros aspectos da vida da pessoa.
Fazer o que se gosta e viver disso decentemente, eis a glória. Mas quantos conseguem juntar as duas coisas? Posso estar enganado, mas acredito que esses privilegiados não constituem a maioria. De minha parte, sempre me surpreendo, admirado, quando encontro um espécime dessa tribo feliz. Todavia, eles existem e estão espalhados por aí, nas mais diferentes atividades. Na família, bem próximo, tenho um exemplo indiscutível: um cirurgião cuja alegria é estar no hospital exercendo sua profissão. Para ele, não há feriado nem fim de semana nem férias. Seu lazer é o próprio trabalho. Descansa carregando pedras, como se costuma dizer. Extraordinário.
Chego agora ao caso do conterrâneo Paulo Sérgio Oliveira Carvalho, nosso PS Carvalho, compositor e cantor que vem se destacando na cena artística local nos últimos tempos. É certo que a música sempre esteve presente em sua vida, o violão o reconhecia – e reconhece - como amigo, assim como um cãozinho ou um gato sabe instintivamente reconhecer suas afinidades humanas, mas era algo periférico, eventual, sem comprometimento. Nos encontros com os amigos, nas festinhas familiares e até mesmo em casa, sem público, ele tocava e cantava só pelo gratuito prazer de fazê-lo, como quem dá uma “canja” aos outros e a si mesmo. Seu trabalho e seu ganha-pão eram outros. Engenheiro e professor, mestre e doutor, distribuiu na UFPB e fora dela os seus saberes técnicos, que não são poucos. Teve suas competência e retidão profissionais merecidamente reconhecidas. Enfim, nessa área teve êxito e, suponho, realizou-se, tanto quanto possível. E a música discretamente, secundariamente o acompanhando nessa jornada, à espera de sua hora, que haveria (ou não) de chegar.
E chegou. No tempo certo, quando ele já podia dedicar-lhe a atenção requerida, em meio a outros afazeres, ela foi assumindo seu protagonismo, tomando finalmente seu lugar na vida do artista, para transformar-se, prazerosamente, numa ocupação relevante de seus dias. A coadjuvante virou atriz principal, o acessório virou a essência, o namoro virou casamento. Aos poucos, ele foi mostrando seu trabalho, nas redes, nos palcos, onde fosse. E aos poucos foi sendo reconhecido, consagrado, pode-se afirmar, como um dos novos valores musicais paraibanos e nordestinos, quiçá brasileiros. Suas mais recentes parcerias com renomados artistas daqui e de fora, o que por si só é um feito, permite prever muitas conquistas para o futuro de sua carreira. Quem diria.
Pois é. Mas a vida tem dessas surpresas. A vida muda e a de PS mudou – tem mudado continuamente. Até sua imagem é outra: deixou crescer a barba, lembrando um pouco Cat Stevens após sua conversão ao islamismo. Os artistas, de modo geral, cultivam uma ou outra excentricidade, talvez para expressar gostos pessoais ou recados político-comportamentais, talvez apenas para se diferenciar dos mortais comuns, os “burgueses” enquadrados no “establishment”. É um direito deles – e de qualquer um.
Uma coisa bonita de se ver no caso de PS é o total e incondicional apoio que recebeu e tem recebido de seus pais, os oitentões Mariazinha e Wallace, ambos respeitáveis pilares da sociedade local. Afirmam sempre sobre a opção artística do filho: “O que queremos é que ele seja feliz”. Veja só. Tem coisa melhor?
Também não se pode ignorar a coragem do cantor/compositor. Coragem para desbravar seus novos caminhos numa selva difícil e competitiva como é o mundo artístico, cheio de egos inflados, invejas e que tais. E também coragem para enfrentar possíveis resistências em seu próprio ambiente de origem, inegavelmente de viés conservador, menos aberto a ousadias.
Mas o fato é que PS Carvalho já não é uma promessa, é uma realidade. Diria mais: já é uma estrela do firmamento musical da cidade e da região. Em rota ascendente, subindo, subindo ...