Quando no ano de 1970, minha mãe, meus irmãos e eu saímos de Serraria pelas circunstâncias que um dia haverei de narrar, a casa e as imagens daquela época continuram comigo. Muitas vezes retornei a Taquio de passagem, olhando pela lente do coração e pelo recanto do olho, sem coragem de entrar nas salas, nos quartos e na cozinha da casa que foram nossa, porque preferia que estes lugares continuassem como os guardei na memória.
José Nunes
No decorrer de cinquenta e cinco anos, todas as vezes que passei na frente da casa onde eu nasci, olhava de soslaio para esconder as lágrimas, mas observava a parede frontal com o beiral e a platibanda apontando para o alto.
José Nunes
Planejava meu mundo nos arredores de Tapuio, nunca passando do Rio Jacaré, da Alagoinha dos Mendes, do engenho Tapuio e de Matinhas de João Boi, sítios que andam comigo. Serraria era meu mundo, pequeno e importante, onde refloresciam as minhas fantasias. Quando muito, o mundo se estendia até Arara, onde depositava meu olhar no entardecer avermelhado ou nas noites cortadas de relâmpagos.
Serraria (PB) José Nunes
Quando saímos daquela casa, eu tinha quinze anos e carregava no matulão somente incertezas, porque a partir de então as esperanças nasciam quando os dias foram definindo os rumos da vida nova. Afinal, antes meu futuro estava resumido a Tapuio. Caminhando na cidade como um camponês, conduzindo a quicé de faca à cinta, olhava estrelas para definir a qual seguir, sem nunca esquecer o que passamos juntos - meus pais, meus irmãos e eu. Na escuridão, por menor que fosse, havia uma estrela que brilhava.
Serraria (PB) José Nunes
Os anos passaram, vencido os aperreios, fui construindo esperanças e alcançando os êxitos reservados a mim conforme meu merecimento. Os anos transcorram lentamente, lentos para que pudesse entender que é pelo sofrimento que se valoriza a vitória.
Nunca esquecerei a casa de minha páscoa e do meu batismo para a vida.