Verdes Versos I O escrito, o exposto, essas meias verdes verdades, já não se escondem atrás de máscara. Vegetariano...

Estalo da Palavra (II)

poesia capixaba jorge elias
   
 
Verdes Versos I
O escrito, o exposto, essas meias verdes verdades, já não se escondem atrás de máscara.


Vegetariano
O esquecimento jamais devolve seus reféns. FABRÍCIO CARPINEJAR Somos formigas demais para o verde que resta. A escada de Tistu* já não existe mais, perdeu-se no fogo verde. Ele, felizmente, está salvo, é um anjo... Legou-nos a metáfora de seu toque, mas nessa fila de ir e vir só a pele interpreta e julga o que o olhar não entende. Somos deuses demais para o verde que resta. Pode chorar ingazeira, pois não se volta do esquecimento. O tropel segue polvilhando cinzas sobre o cobre do entardecer, e a consciência não segue os passos de seus atos. Afinal, criamos Deus à nossa imagem, temos a chave da vida, Somos dementes demais para o verde que resta.


Reflexão
Não interrompa o cotidiano das serpentes, elas não buscam nos homens o seu veneno.


A realidade de cada um
Desconheço a ordenação dos anjos, mas sei das cores nas fachadas das casas. Na foto antiga, as casas já receberam O insofismável tom trazido pela areia do tempo. Naqueles olhos ausentes, que cruzaram desapercebidos a falsa eternização do momento, surpreendo o olhar humano. Desconheço a verdade dos santos, mas tenho aprendido sobre a mutilação do desejo.


Ofertório
Certas bocas não vestem bem as palavras.


Hóstia verde
Vó Bela! O homem é assim: cultiva a ausência do verde, e, quando este finalmente falta, vende o que resta aos idólatras. Benditos os iconoclastas derrubadores do ídolo verde! Vó Bela! Será que chegará o dia em que tomaremos em nossas bocas uma folha verde como hóstia?


Beijo
Quero comer a tua boca, para misturar nossas palavras. Quem sabe assim, com as frases embaralhadas, voltemos a criar caminhos.


Duo
Sou do tipo de poeta que não tem cisma de beijar o diabo na boca. Sou poeta; aprendi cedo a mordiscar os lábios de Deus.


Decreto
(para ser lido tomando água de coco à beira-mar) Atenção! Está suspensa a transitoriedade das insignificâncias. Não é permitida a inspirabilidade do óbvio. É mandatório o afogamento das circunstâncias. O statu quo deverá ser limpo com papel higiênico. Será suprimido do vocabulário o beijo sem língua. No cardápio das quartas-feiras o prato principal será o ócio. Cada bocejo deverá ser celebrado como profecia. Ao homem, que não lhe faltem ovos fritos com torresmo, chicletes e água fresca. Que todos os reflexos sejam queimados nas piras da reflexão. Para cada ser humano, um momento lento de aurora.


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  1. José Augusto Carvalho11/6/24 10:56

    Tenho orgulho de chamar de amigo uma pessoa como você, com essa imensa estatura intelectual. Adorei os poemas. Alguns eu já conhecia. Gostei até mesmo da citação do Carpinejar, de quem não sou muito fã. Um verso que adore: "Somos deuses demais para o verde que resta." O nome Tistu, se o tradutor respeitou a pronúncia, não respeitou o trocadilho do nome do personagem central do livro O menino do dedo verde. Tistu = Tistou = tisse tout (tece tudo). Os franceses são ótimos nesses truques linguísticos. Parabéns pelos poemas. Você é prolífero. Tenho inveja de sua capacidade criadora e criativa. Quisera eu ter essa capacidade, mas só volto meu interesse para coisas sem interesse, como linguística e gramática. Um abraço fraterno com votos por uma excelente terça-feira.

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