Em Pervertido Querubim (2024), Chico Viana estreia na poesia trazendo à tona memórias íntimas, reflexões existenciais e lirismo. A obra não segue roteiro fixo, nem doutrinas – surge do tempo cultivado e da inspiração aliada ao labor. Professor, cronista e agora poeta, Viana busca oferecer beleza e provocar reflexões sobre a vida e a morte.
O título do livro remete-nos ao “anjo torto” de Carlos Drummond de Andrade. Viana parece se valer em muitos momentos dessa figura drummondiana para explorar o vasto mundo da poesia. Essa ambivalência está presente no poema Exílio, que inicia
Em Dual, o eu poético se apresenta em constante contradição: “Do que me lembro, esqueci.”; deslocamento interno: “Parti para onde me encontro.” – indicando uma busca de si mesmo num movimento que aparenta fuga, mas é também retorno; religiosidade ambígua: “Professo a fé na descrença.”, o que reforça o caráter paradoxal do sujeito.
Muitos poemas são marcados por uma angústia filosófica, com oxímoros e paradoxos como instrumentos poéticos centrais, prevalecendo em boa parte um lirismo existencial, por vezes melancólico, com ecos da psicanálise (inconsciente, desejo, repressão). Em Escolha, afirma: "A solidão é meu retiro. Prefiro ouvir meu coração."
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Também é recorrente o tema da efemeridade da vida. A “indesejada das gentes” – como diria Manuel Bandeira – aparece em O quarto, Para Ruth e Dalila, sendo este um poema no qual se aponta o quanto um animal irracional é capaz de nos ensinar sobre a morte e o morrer.
Recurso frequente em sua prosa, a metalinguagem de quando em quando também eclode em seus poemas. Nessa obra, a reflexão sobre o fazer poético está na apresentação e em O que vale um poema. Na estrofe: "Um poema vale a espera/ de que aconteça, um dia, / sua eclosão entre ritmos, / cadências e harmonias", o poema é comparado a algo latente, que amadurece até florescer — como se cada poema estivesse em gestação. Fala-se da espera, da paciência e do tempo necessários para que a poesia encontre sua forma – em ritmo, cadência e harmonia.
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Chico Viana, professor, escritor, poeta e cronista paraibano, doutor em Literatura pela UFRJ. ▪ @chicovianaw
Denise e Chico Viana ▪ Amsterdã, 2023@chicovianaw
▪ Texto originalmente publicado no jornal A União, em 30/5/25.