Mostrando postagens com marcador Célio Furtado. Mostrar todas as postagens

Mandacaru é uma planta verde, mas não é um verde feito verde de esperança. É um verde escuro, fechado e que está mais para saudade. E tem m...

Mandacaru é uma planta verde, mas não é um verde feito verde de esperança. É um verde escuro, fechado e que está mais para saudade. E tem muito espinho, muito mesmo, uma infinidade. Sombra, quase não existe, pois no lugar de folhas, tem uns galhos feito esbirros escorando o nada, qual os braços de um espírito clemente, de um cristão crucificado. Deve se por isso que ninguém se encanta com mandacaru.

Estou cansado. Chega uma hora em que a gente cansa, cansa de agradar, de fazer e de sorrir. Porque nada motiva a sorrir. E só se deixa de s...

ambiente de leitura carlos romero celio furtado conto poesia literatura paraibana heranca briga decepcao familia cariri riacho seco testamento seca nordeste

Estou cansado. Chega uma hora em que a gente cansa, cansa de agradar, de fazer e de sorrir. Porque nada motiva a sorrir. E só se deixa de sorrir em duas situações, ou quando o corpo está enfermo ou quando se é esquecido.

No fim do século XVIII os Tapuias ainda cruzavam o Agreste da Paraíba, fugindo da seca e dos bandeirantes. Os tropeiros também cruzavam ess...

ambiente de leitura carlos romero celio furtado conto era dos bandeirantes batalha indigena tropas curimatau interior paraiba

No fim do século XVIII os Tapuias ainda cruzavam o Agreste da Paraíba, fugindo da seca e dos bandeirantes. Os tropeiros também cruzavam essas terras, e viviam assustados. Cada curva do caminho guardava a possibilidade de uma emboscada. Para se prevenirem contra os ataques dos ferozes Tapuias e Tarairiús, os viajantes, na maioria das vezes, andavam em grupo, geralmente acompanhados por uma pequena guarda. Contudo, para os mais destemidos, a própria tropa já bastava.

Numa das encostas da Serra das Velhas, nas proximidades da Vila de Santa Fernanda, um olho d’água escorre suavemente, entre as pedras e a v...

ambiente de leitura carlos romero celio furtado conto amor proibido magia passaros jura de amor premonicao

Numa das encostas da Serra das Velhas, nas proximidades da Vila de Santa Fernanda, um olho d’água escorre suavemente, entre as pedras e a vegetação, formando um pequeno riacho. Mais adiante, em suas margens, dois majestosos jatobás sombreiam a correnteza, um de frente para o outro. Nessas árvores há dois pássaros.

Uma zoada muda, abafada, distante. Chega mais perto, cresce, até irromper na esquina. Quem estava em casa corre para ver. O palhaço Perna...

ambiente de leitura carlos romero celio furtado palhaco circo infancia perdida

Uma zoada muda, abafada, distante. Chega mais perto, cresce, até irromper na esquina. Quem estava em casa corre para ver.

O palhaço Perna-de-pau é um homem jovem, animado e falante. Acena para quem está nas calçadas. As pessoas correspondem, fascinadas.

No caminho da vila do Bujari, na região da Serra de Cuité, havia uma casa bem caiada, de três varandas com piso de tijolo e esteios de aroe...

ambiente de leitura carlos romero celio furtado conto misticismo mediunidade consciencia cosmica transcendencia espiritual sabedoria autoajuda

No caminho da vila do Bujari, na região da Serra de Cuité, havia uma casa bem caiada, de três varandas com piso de tijolo e esteios de aroeira. Era agradável de ver: ela arrodeada por canteiros de roseiras e plantas medicinais, cerquinha de ripa para amparar dos bichos, frondosas jaqueiras com sombra depois do meio dia e terreiro varrido onde se viam dois pavões criados soltos para o encanto de quem por ali passava.

O rapaz se chamava Josué e tinha cavalgado quatro léguas para assistir a primeira missa do domingo na Matriz de Nossa Senhora das Mercês. E...

celio furtado amor perdido ambiente de leitura carlos romero

O rapaz se chamava Josué e tinha cavalgado quatro léguas para assistir a primeira missa do domingo na Matriz de Nossa Senhora das Mercês. Era uma manhã deserta e silenciosa porque não havia ninguém pelo caminho e também porque nada parecia importar, a não ser os pensamentos que lhe martelavam o coração, assim como os cascos do cavalo nas folhas secas do terreno arenoso. Nem a beleza da névoa azulada que pouco a pouco se dissipava através dos galhos e folhagens das árvores que margeavam a estrada parecia importar. E nem mesmo o último mata-burros sombreado por frondosas algarobas e touceiras de aveloses que chamavam a atenção pela exuberância e onde havia uma casa secular com janelinha perto da cumeeira e telhado com chaminé, parecia importar.

Naquele distante janeiro de 1963 o sol impiedoso castigava a fazenda Malhada da Cruz, no agreste paraibano…

celio furtado pintiura

Naquele distante janeiro de 1963 o sol impiedoso castigava a fazenda Malhada da Cruz, no agreste paraibano…

O alimento da vaidade é a atenção, assim como o alimento do artista é o aplauso. O que seria da bailarina sem a plateia que se encanta com ...

celio furtado pintor paisagem

O alimento da vaidade é a atenção, assim como o alimento do artista é o aplauso. O que seria da bailarina sem a plateia que se encanta com seus movimentos? O que seria do palhaço sem a graça do riso? E o pintor, que consumiu uma eternidade para compor sua obra em troca do deleite da contemplação? Do mesmo modo é a vaidade, que depende do oxigênio da atenção para alimentar-lhe a infinda chama.

É o que se vê nesse momento tão singular por que passa toda a humanidade. De repente, o asfalto e as calçadas ficaram desertos. Pessoas até que saíram às ruas, mas a aparência ilusória ficou no cabide e no estojo da maquiagem. As regras de etiquetas e os ditos códigos de civilidade foram substituídos por outros, primários e mais humanos, como lavar as mãos e exercitar a compaixão e a humildade, além de compreender que ninguém é tão diferente, como se quis ou se imaginou.

Há quem diga que a vida sem vaidade é quase insuportável, sobretudo no mundo moderno. O cotidiano proporciona mais opções, o que demanda tempo, que pede pressa em tudo. Acontece que o estágio entre o nascer e o pôr do sol continua absolutamente o mesmo, desde a formação do planeta. Daí tanto estresse na atualidade.


detalhe de quadro do pintor celio furtado
Assim como a vaidade carece de mimos e afagos, requer tempo para arrumar-se. Preparação que demora uma vida para uma exibição de um minuto. Imaginemos esse tempo consumido com a família, os filhos, os pais, ou com pequenas tarefas ou atividades do dia a dia. Talvez pudéssemos melhor apreciar o que tanto custou para ser adquirido, mas que a rotina e a cegueira do encantar-se pelo novo deixaram perder a importância. É como mesmo diz a canção de Raul Seixas: “ ...há tantas coisas novas para conquistar, e eu não posso ficar aí parado”.

Para Aristóteles, controlar a vaidade é ter postura para caminharmos em direção à nossa realidade, a fim de entendermos o quanto imperfeitos somos. Sobre esse pensamento e preocupado com as próprias imperfeições, um famoso marqueteiro paulistano decidiu fazer a famosa peregrinação dos caminhos de Compostela, cujo trajeto demora semanas. A rota escolhida envolvia um trecho mais longo e enladeirado. Depois de dispensar o guia, ele colocou a mochila nas costas e pôs-se a seguir. No terceiro dia de caminhada estava exausto e tinha os pés inchados e cheios de bolhas. Ao anoitecer, do albergue, ligou para o guia. Conhecendo o quanto era vaidoso, este mandou abrir a mochila. E falou: “ Você não vai conseguir desse jeito, meu amigo. Sua bagagem está pesada! Livre-se do que não precisa!”

As crises sempre existiram, e ocorrem por ciclos. Assim como a chegada da chuva, depois da estiagem prolongada, e assim como o surgimento do sol, depois do inverno sombrio, o efeito delas é o renascimento das espécies, pois o que parecia cansado, revigora-se, e o que se fizera gasto e cego, afia-se e se enche de energia e vida.

Ao fim dessa pandemia teremos vivido muitas experiências, feito reflexões e abraçado oportunidades, e certamente renascidos num mundo novo, mais leve e menos desigual. E talvez tenhamos aprendido pequenas lições, como a que disse Honoré de Balzac: “ deixemos a vaidade aos que não têm outra coisa para exibir.”


Célio Furtado é artista plástico e cronista