P ois é, deu-me vontade de escrever sobre meu tio torto, José Leal, ou Zé Leal para os mais íntimos. Um grande homem, que não tinha nada de ...

Pois é, deu-me vontade de escrever sobre meu tio torto, José Leal, ou Zé Leal para os mais íntimos. Um grande homem, que não tinha nada de torto. Pelo contrário, o homem era muito espigado. Parece que estou o vendo no seu trânsito diário em direção ao jornal O Norte, mas antes de ter dado um dedo de prosa na Associação Paraibana de Imprensa, que ele fundou e que era a sua segunda casa.
José Leal rima com jornal e este foi sua cachaça a vida inteira. Jornalista sem diploma, seja de Mestre, seja de Doutorado, muito menos de pós-doutorado...
Sua grande universidade foi a vida. Mas antes de vir lá de Alagoa Nova para cá, José Leal trabalhou na conservação de estradas. E foi nesse trabalho que ele foi soterrado com a queda de uma barreira. Deram-lhe como morto. E quando retiraram a terra que o cobria, eis que o encontraram totalmente sujo, mas sorrindo. Ninguém quis acreditar no que via. Assim me contaram.
Mas deixemos o trabalhador de estradas e voltemos a falar sobre o jornalista que aprendeu jornalismo sem se ensinar, como diria o poeta Ascenso Ferreira.
José Leal não foi apenas meu tio, e sim meu amigo. Davam-nos muito bem, Sabendo do meu gosto pela música erudita, convidou-me, justamente com Gonzaga Rodrigues, para organizar, naquela casa, a sua A.P.I., uma discoteca com discos de Bach, Beethoven, Chopin e vários outros gênios, Os discos eram pesados e grandes. A vitrola era enorme e movida a corda. Não sei se Gonzaga se lembra disso. Só sei que a nova discoteca veio modernizar aquela casa.
José Leal foi um homem de uma tenacidade admirável. Se não me engano (me ajuda, Wilis Leal!) ele ignorava o que era medo. Outra coisa: não sabia o que era ociosidade. Levou toda a vida trabalhando. Enquanto seus dedos dançavam no teclado da Remington, o cigarro ia enchendo a sala de fumaça. José Leal foi um fumante inveterado. Até andando a caminho de casa, lá para as bandas de Trincheiras, o cigarro não saía de sua boca. Outra coisa: nada o perturbava. Podiam jogar uma bomba aos seus pés, que ele não se incomodava. Parecia que tinha nervos de aço, tal era a sua serenidade. E José leal conhecia bem a história da Paraíba. Escreveu bons livros sobre essa matéria.
Meu tio José Leal... Fui vê-lo no hospital. Estava arquejante. Calado, o olhar fixo no teto. Tossia com muita dificuldade Os pulmões, completamente avariados em conseqüência do enfisema. O silêncio dominava a sala. Que diferença do burburinho agitado da sala da redação... Por fim, ele olhou para mim e cochichou: “Carlos, só levo um desgosto da vida: o de ter fumado. “E virou o rosto para a parede. Seu pulmão estava profundamente comprometido. Não havia mais cura... Ainda bem que eu, que fui fumante, deixei o vício em tempo.

 Meu tio José Leal, tão forte para tantas coisas, mas se deixou dominar pelo venenoso e fedorento vício... Assim mesmo não podemos deixar de dizer: Zé Leal, que legal!...  

D ifícil encontrar um homem bom, simples e que sabe cultivar amizades. A prova é que um homem assim nunca está só, mas sempre em boa companh...

Difícil encontrar um homem bom, simples e que sabe cultivar amizades. A prova é que um homem assim nunca está só, mas sempre em boa companhia. Estou me referindo ao desembargador Francisco Espínola, que já saiu de nossa convivência física, mas jamais da memória. E é em louvor a essa memória, que a família, em boa hora, pretende prestar-lhe uma homenagem póstuma pelo centenário de seu nascimento.
Não participei de sua intimidade, mas muito aprendi com ele. Falava pouco e ouvia muito, mas sempre com um sorriso nos lábios. Espínola tinha um bom senso admirável.
Magrinho, sempre bem vestido de linho branco, o magistrado Espínola foi, antes de tudo um excelente chefe de família. E Ana Cândida, minha amiga e sua filha querida, colega de meu filho caçula, muito nos impressionou, sobretudo, pela maneira poética e sensível de ver a vida. Fomos vizinhos por muito tempo, na avenida Nossa Senhora dos Navegantes, onde nossas residências se confrontavam.
A verdade é que os filhos, muitas vezes, falam pelos pais. Honesto, integro, o desembargador Espínola estará sempre na nossa memória, também através do exemplo dos filhos. Impossível esquecê-lo.
Não tenhamos dúvida, repito. Essa homenagem da família que ele tanto amou é um verdadeiro bálsamo para o seu espírito, que, decerto, deixou este mundo com a paz de consciência. A paz de consciência que é o verdadeiro paraíso.
Feliz daquele que sai do mundo sem mágoas, sem ressentimentos, deixando saudades, uma ótima impressão, e, sobretudo, sem ódio.

 Chico Espínola foi, sobretudo, um homem bom. Que se fazia respeitar, não pela carranca, ou pela austeridade, mas pelo puro sorriso que esboçava.

A  primeira vez que o vi foi na livraria do Xavier, lá na rua Maciel Pinheiro. Quem m'o mostrou, foi meu irmão Orlando, que vendo-o, coc...

primeira vez que o vi foi na livraria do Xavier, lá na rua Maciel Pinheiro. Quem m'o mostrou, foi meu irmão Orlando, que vendo-o, cochichou-me aos ouvidos, num entusiasmo de quem fez uma rara descoberta: “olhe ali o Dr. Flóscolo, uma das maiores cabeças da Paraíba”. Olhei, era um homem magro, calvo e silencioso, que estava, a escolher livros, alheio completamente ao ambiente. E o proprietário, decerto, nunca imaginou a presença em sua livraria de personagem tão importante.
Flóscolo comprou um livro e saiu, numa lentidão de sombra. Que livro seria aquele? Fiquei curioso. O tempo foi passando e eis que encontro o Dr. Flóscolo na Faculdade de Direito, ensinando “Introdução ao Direito”. Vez por outra saía artigos seus neste matutino, abordando temas científicos.
Flóscolo da Nóbrega! Como me impressionou, o seu silêncio interior, a sua sólida cultura, a sua sabedoria...
Ao tempo em que eu mantinha, na Rádio Tabajara, o programa de música erudita “Paisagem Sonora”, fui surpreendido com um pedido seu, por telefone, para incluíssemos no programa, “Nabuco”, de Verdi, o que muito nos lisonjeou.
Flósculo era desembargador do nosso Tribunal e muito honrou aquela Corte, não só com sua conduta, mas, sobretudo, com sua erudição. Seus acórdãos eram curtos e objetivos.
Em suas aulas, o silêncio dos alunos era grande. O mestre sabia trocar em miúdos a disciplina mais importante do curso de Direito. Teve como auxiliar o bacharel Jovani Paulo Neto, que me contou um caso interessante a respeito do mestre. Certa vez, os alunos foram surpreendidos com sua risada diante do jornal que estava lendo, criticando a compra de votos. Flóscolo não quis acreditar no que lia, tal a pureza de seu caráter.
Um homem calado, respeitado por todos, o nosso mestre, com o objetivo de facilitar o estudo do Direito, escreveu o livro “Introdução ao Direito”, em que consegue simplificar o assunto, tornando-o accessível aos iniciantes das ciências jurídicas. É que de um modo geral, os mestres do Direito complicam o ensino dessa matéria. É Flóscolo quem diz com muita modéstia: “O presente trabalho não tem outra pretensão além de servir de itinerário aos que iniciam o estudo do Direito. Não é livro para mestres, para doutos, para juristas”. Mais adiante, acentua “A nossa preocupação dominante foi simplificar e clarificar a exposição da matéria”. E conclui: “Evitemos as digressões eruditas, o criticismo exagerado, o abuso de transcrições cansativas de obras estrangeiras”.
Estejamos portanto, vigilantes. Esta obra do professor Flóscolo precisa ser sempre reeditada e a nossa universidade deve estar atenta a isso.
Mas o erudito mestre foi também escritor dos melhores. Seu estudo sobr Augusto dos Anjos é uma profunda interpretação da obra única do poeta. Com esse estudo, ele entra na nossa Academia sendo saudado pelo escritor, jurista e parlamentar João Lélis, que cognominou o nome do novo acadêmico de “devorador de livros”.
Flóscolo da Nóbrega... Há alguma rua com o seu nome? Não, mas uma penitenciária... Que absurdo. Ele nunca foi criminalista. Decerto, rejeitaria tal homenagem. Fiquemos por aqui e jamais esqueçamos o Dr. Flóscolo.

Lembrar que o grande jurista e homem de letras chegou a pedir ao marechal Rondon para fazer parte de sua famosa marcha Brasil a dentro. O marechal negou o pedido, por achá-lo muito jovem, fato que João Lélis cita no seu discurso de saudação ao novo acadêmico.

C hapéus... Antigamente, era só o que se via, seja em homens ou mulheres. O homem desprovido dele era considerado um pobre marginal. O chapé...

Chapéus... Antigamente, era só o que se via, seja em homens ou mulheres. O homem desprovido dele era considerado um pobre marginal. O chapéu definia a personalidade. Eu me lembro que minha mãe falava muito numa tal “Joaninha chapeleira”, onde adquiria seus chapéus, lá na avenida Beaurepaire Rohan.
Não me lembro onde se compravam chapéus para homens... Só sei que meu pai, que sempre foi um homem elegante, usava chapéu de palhinha e de massa. O chapéu era usado tanto pelos ricos como pelos pobres. E era com os chapéus que os homens cumprimentavam as pessoas. Que chique. Tirando o chapéu... Tal costume acabou-se. Vejam como a moda muda. Ontem prevalecia a roupa de linho branco... E o alfaiate Caldas era quem melhor roupa fazia com aquele tecido. Hoje, o tecido para as calças, por incrível que pareça, é aquele Jeans que, quanto mais desbotado, desfiado e rasgado, mais chique parece. Até que ponto chegou o exagero da moda...
Mas eu falava em chapéus, que aqui na nossa cidade só são usados pelo conselheiro e imortal Luiz Nunes e pelo ex-prefeito Luciano Agra. Ora, ora, mas não é que em Paris é só o que se vê e se vende até nas calçadas. Chapéus elegantes, bem confeccionados. E eu terminei comprando um... Fui ao espelho e este me disse, na sua linguagem muda, que o chapéu se deu muito bem no formato do meu rosto. Melhor ainda: fiquei mais jovem. Fui até honrado com uma foto usando o meu chapéu parisiense na respeitada coluna cidadã de meu amigo e vizinho de página, Abelardo Jurema Filho. Não me lembro se seu pai, o ministro e imortal Abelardo Jurema, que era um gentleman e símbolo de elegância da cidade, usou chapéu, hein Abelardinho?

 Mas eu desejo ver chapéus em muita cabeça ilustre, além das de Luiz Nunes e de Luciano Agra. E, aqui para nós, o chapéu dá mais dignidade ao seu usuário. E as mulheres, como elas ficavam elegantes de chapéu!... Será que vão voltar a usá-los? Sei não, só sei que gostei do meu, que serve até para os cumprimentos. Já houve quem dissesse que ele ficou ótimo em mim. E eis-me, novamente no espelho. Ah, cronista vaidoso... Mas, aqui pra nós, quem não é vaidoso nesta vida? Que mal faz minha vaidadezinha inocente? Culpa de Nunes, de Agra, e de Paris...

M anhã de muito sol, aqui no jardim. E faz de conta que não estou num jardim, mas numa sala de concerto. Tudo ainda é expectativa. E existe ...

Manhã de muito sol, aqui no jardim. E faz de conta que não estou num jardim, mas numa sala de concerto. Tudo ainda é expectativa. E existe nada mais gostoso do que a espera de uma boa coisa? Há silencio, e onde há silencio, há paraíso. O inferno, como dizem, além de quente é barulhento. E eis que começa o espetáculo. As borboletas, por sinal, amarelas, começam saltitar sobre as flores. Depois aparece o beija-flor, que deve ter um bico muito perfumado. Ele não chega a beijar as flores, mas suga o mel que há nelas. Não se contenta com uma somente. É grande a fome de beijos. Beijar... Haverá coisa mais gostosa? Já imaginou se não houvesse beijo no mundo? O beijo é uma transfusão de amor.
Mas voltemos ao espetáculo, aqui do jardim, com o céu azul lá em cima e a brisa desejando também beijar estas flores.
De repente, eis que aparece no cenário uma feia lagartixa, que também deseja participar da cena. Ela fica parada num canto, aguardando que lhe venha à boca um colorida borboleta. E eu fico torcendo pelas borboletas. Tão lindas!... A lagartixa decerto tem uma inveja danada das borboletas, por que elas são coloridas e podem voar.
Mas, por que condenar as lagartixas? É e compreensível que todos aqueles que se arrastam no chão tenham inveja dos que se elevam nos ares. As lagartixas não voam, embora corram que nem uma bala.
O sol já está chegando muito forte, e já é tempo de sair do jardim. A lagartixa desistiu de abocanhar a borboleta, que ainda saltita delicadamente sobre as flores, como as mãos do pianista sobre o teclado do piano.
A lagartixa agora resolveu subir no pé de palmeira, para lá do alto ficar contemplando as borboletas, no seu belo bailado.

 Como foram terapêuticos para este cronista estes minutos aqui no jardim! A gente sai com a alma perfumada de poesia. E saber que há tanta gente que passa indiferente por um jardim... Ah, Jesus venha de novo convidar os homens prosaicos a contemplar os lírios do campo. E com eles aprender a lição da transcendência.

O poeta, jornalista e historiador Eudes Barros, em uma de suas crônicas, chamou-o de “Bernardo Shaw de Chapéu de Couro”. Sim, ele era um gr...


O poeta, jornalista e historiador Eudes Barros, em uma de suas crônicas, chamou-o de “Bernardo Shaw de Chapéu de Couro”. Sim, ele era um grande humorista. Levou a vida sorrindo das nossas incoerências. Um mestre arguto, mestre na ironia e de uma sinceridade impressionante.
Era assim o nosso Silvino Lopes, nome, hoje, de uma das avenidas de Tambaú. Quem teve a iniciativa de tão justa homenagem?...
Escrevo esta crônica bastante emocionado, porquanto me fiz seu amigo. Amigo que muito admirei e respeitei. E com quem muito aprendi. Não foi meu mestre apenas, mas meu ídolo. Ao tempo em que trabalhava como revisor deste jornal, Silvino era redator-chefe. Escrevia crônicas maravilhosas, diariamente. Mas antes de sair do Ponto de Cem Réis para o bate-papo com os amigos, ele, em passos lentos, ia subindo para o jornal, devagar, com a cabeça cheia de assuntos para a crônica diária.
Silvino Lopes era realmente meu ídolo, mais do que mestre. Não era simpático de rosto. Sorria nas crônicas. Mais do que isto: dava gargalhadas intimas quando escrevia. Nada de máquinas datilográficas e sim a caneta. Eu, novato na redação, admirador incondicional de suas crônicas ocupava o birô defronte do dele. Silvino, quando não estava escrevendo, estava conversando, e para isso não faltavam amigos e admiradores. Certa vez, notei que todo aquele pessoal caiu na gargalhada apontando para mim. O que teria dito Silvino a meu respeito? Depois veio a informação, o Mestre havia dito: “Lá está Carlos Romero com aquela cara de virgem de Murilo”. O mestre fazia menção ao renomado pintor espanhol.
E de seu permanente bom humor lembro também de que quando passou por aqui, em João Pessoa, o filme clássico “À noite sonhamos”, com Cornel Wilde, sobre a vida de Chopin e com muitas interpretações de suas músicas, Silvino ficou tão encantado que foi ver de novo, mais de uma vez. Ao perguntar-lhe por que ele tinha ido assistir ao filme novamente, ele respondeu: “Carlos, hoje foi que ele tocou bem!”...
De outra vez, ele me contou que um encarregado da faxina doméstica de seu apartamento estava a varrer a sala e levantou os olhos para um retrato na parede, perguntando: “Seu Silvino, quem é esse? ”. E ele: “Esse é Eça”. Como não fazia ideia de quem era Eça de Queiroz, o rapaz saiu ainda mais confuso... Essas e outras davam a medida do bom humor de Silvino Lopes.
O tempo foi passando, e a verdade é que Silvino se tornou meu mestre e amigo. Confidenciou-me muita coisa. Certa vez chegou a me confiar a conclusão de uma de suas crônicas. ”Termine aí” - disse se levantando do birô, pois tinha um compromisso. Suei de medo. Mas exultei com a confiança do mestre.
Escreveu dois livros de crônicas: “Sombras que tiveram nomes” e “Memórias de um sargento de malícias”. ” Livros que tive a agradável surpresa de encontrá-los no Sebo Cultural, do meu amigo Heriberto Coelho.
Não esquecer que o grande cronista foi também um grande teatrólogo. Escreveu as peças “Ladra”, encenada no Teatro Santa Roza, e que me fez chorar; e “Homem bom”, que não tinha nada de bom. Pura ironia do grande humorista.

Q uando eu era menino, não gostava muito de meu aniversário. E sabe por que? Porque, como é em Junho, só me davam fogos de São João...


Quando eu era menino, não gostava muito de meu aniversário. E sabe por que? Porque, como é em Junho, só me davam fogos de São João: mijão, estrelinha, traque de chumbo, diabinho, e nada de brinquedos, caixa de chocolates e assim por diante. Não fiz como fez meu filho caçula, menino ainda, que, em certo aniversário, devolveu todos os presentes que recebera, tal a sua sinceridade que superou a delicadeza. Ansioso por brinquedos, naquele dia só recebera roupas, daí a devolução.
Mas voltando a mim, houve um aniversário em que, mesmo em época junina, deram-me de presente um pequeno livro de História do Brasil, todo ilustrado. Uma beleza. Esqueci os fogos, deitei-me na cama e fui ler aquele presente saído das mãos de minha tia Autinha, professora da Escola Normal e muito culta.
Livro ainda é o maior presente. E que tal uma camisa? E que tal uma gravata, um ipod? Sei lá. Ha tantos presentes bons. Mas o cronista-menino só não gostava da festa junina, que coincidia com a data de seu aniversário.
A verdade é que aniversário é muito gostoso, mesmo sabendo que é mais um ano na vida da gente. Mas o que querem? Aquela tão cantada modinha do “parabéns para você” não termina desejando muitos anos de vida ao aniversariante, depois que apagam a vela espetada no bolo?...
É preciso lembrar que velhice é experiência, e experiência é sabedoria. E o que seria da vida sem a sabedoria?
Mas continuemos a crônica. Já que falei em aniversário, que tal falar do meu, ocorrido, um dia desses? Que belo momento em que recebemos beijos, abraços e votos de parabéns. É por ocasião do aniversário que a gente vê se tem ou não amigos...
E os presentes? Um bocado. Todos embrulhados em papel-colorido, menos o do meu filho caçula, meu galego de coração, Germano, que insiste em ser meu pai. O presente foi uma visita a Paris, a cidade que eu adoro. Paris, e de quebra Lisboa. Mas lembrar que ele foi um grande presente que Deus me deu, juntamente com o que tem meu nome, o primogênito Carlos. E fico por aqui, de olhos molhados...

A qui para nós, eu nunca vi em minha longa vida, uma amizade tão profunda, tão reverencial, da parte do neto. Mas qual o neto que tem a feli...

Aqui para nós, eu nunca vi em minha longa vida, uma amizade tão profunda, tão reverencial, da parte do neto. Mas qual o neto que tem a felicidade de ter um avô como aquele? Um mestre por excelência, integro até demais, incapaz de um deslize, que, como Secretário do Interior de nosso Estado, me impressionou pelo zelo com a coisa pública. E eu fui seu assessor. Assessor e aluno ao mesmo tempo. Ele, vez por outra, me chamava para ouvir um de seus eruditos arrazoados. Tinha grande confiança em mim, e isto fazia aumentar ainda mais minha responsabilidade.
E sabe de uma coisa? Foi ele quem arrumou o meu primeiro emprego, depois de formado. Nomeou-me Juiz Substituto de Santa Rita. E para quem estava necessitado de prática forense, aquela nomeação foi um maná do céu.
Mas já é tempo de revelar o mestre e amigo, não esquecendo o talentoso neto: Osias Gomes e Cleanto Gomes Pereira, hoje advogado de nota e cronista.
Osias muito me impressionou, não só pela cultura, como pela ética. Profundamente religioso, conhecia a Bíblia palavra por palavra. Escreveu uma excelente biografia, sob o pseudônimo Baruque. Fez parte de nossa Academia de Letras, aumentando ainda mais o conceito daquela magna instituição.
Osias Gomes foi um exemplo de conduta e cultura. Escrevia com uma invejável presteza, enchendo laudas e mais laudas de papel.
Mas cometeria uma injustiça se esquecesse de mencionar, aqui, o belo trabalho biográfico, de autoria do neto Cleanto, e que me chegou às mãos como uma dádiva. Um trabalho que vale por uma enciclopédia sobre o ilustre e querido avô. Presente do neto privilegiado. Trata-se de “Permanência de Osias Gomes”, que nenhum paraibano pode deixar de ler.
Osias era todo dinamismo, nunca estava parado. Perspicaz, às vezes irônico. Lembro de um fato que dá a medida de seu humor. Fomos a Pilar, numa homenagem a José Lins do Rego. Uma comitiva ilustre, a maioria de membros de nossa Academia. No alpendre da casa, onde nos hospedamos, podia faltar tudo, menos amendoim, já torradinho sobre uma larga mesa. Porém, ninguém quis prová-lo. Mas, Osias, observador, cochichou-me aos ouvidos, sorrindo: “o padre foi a exceção”. Sim, um sacerdote, que não me lembro quem, fazia parte da comitiva, e comeu muito amendoim.

 Assim era Osias, culto, cheio de idéias, sincero e com grande apetite para a vida.

F ui, por recomendação do nosso médico de família, Marco Aurélio Barros, tomar meu bom banho de sol, e o local escolhido foi a praia de Mana...

Fui, por recomendação do nosso médico de família, Marco Aurélio Barros, tomar meu bom banho de sol, e o local escolhido foi a praia de Manaíra, um dos locais mais bonitos do mundo, com o mar querendo derrubar a parede que o impede de um maior avanço de suas ondas. E eu fiquei todo aberto ao sol. Uma beleza. Disse-me o nosso médico que o sol, até às dez horas, é medicamento excelente para os ossos e metabolismo de vitaminas. E viva o nosso esqueleto, pois sem ele seriamos um amontoado de carnes sem nenhuma consistência. E o pior é que não temos esqueleto de reserva. Jamais iremos a um shopping comprar uma armadura óssea nova...
O sol, lá do alto, sorria o seu sorriso de luz. Sorriso medicamentoso. Não sei se o Dr. Marco Aurélio tem tempo para fazer o que fiz. Claro que não. Mas valeu a pena ficar ouvindo o mar, vendo o sol e ouvindo o vento. Não durou uma hora e me levantei, já pensando que, à noitinha, vinha outra recomendação. Não do Dr. Marco Aurélio, mas do Ronald Farias, o homem que andou mexendo nos meus ossos, e que terminou me fazendo andar, coisa que não estava conseguindo. Lembrar que foi em Jerusalém, há mais de dois anos, que começou minha estenose lombar, obrigando-me a andar de cadeira de rodas, até mesmo em Londres ao som do Big-Ben.
E sabe um exercício receitado pelo Dr. Ronald? Hidroginástica. Que gostosura entrar numa piscina morna e se sentir leve com uma pena. Fui entrando na piscina, onde já estavam outros companheiros, inclusive meu filho-arquiteto Germano, pensando em Arquimedes, o homem que descobriu a hidrostática, isto é que na água perdemos peso.
E assim, eis-me com os meus companheiros, sob as ordens da jovem professora Catarina Guimarães, fazendo uma porção de exercícios, e até umas partidas de voleibol. Tudo disso dentro d'água.

 E viva os cuidados com o nosso corpo. Nada de estragá-lo com má alimentação, cigarro, álcool e ociosidade. Não esqueçamos que o nosso corpo nos foi confiado por Deus. Daí nossa grande responsabilidade para com ele. Saímos da água como se estivéssemos com o corpo e a alma limpos. Graças às recomendações médicas.

Esqueça Pindamonhangaba, Itaquaquecetuba, Birigui e outros locais com denominações excêntricas. Pelo Brasil afora existem cidades e vilare...



Esqueça Pindamonhangaba, Itaquaquecetuba, Birigui e outros locais com denominações excêntricas. Pelo Brasil afora existem cidades e vilarejos batizados com nomes bem mais diferentes e curiosos. Veja esses:

V amos fazer desta crônica uma conversa. Aliás, toda crônica é uma boa conversa fiada. Fiada ou confiada, pouco importa. Assim, vamos à crôn...

Vamos fazer desta crônica uma conversa. Aliás, toda crônica é uma boa conversa fiada. Fiada ou confiada, pouco importa.
Assim, vamos à crônica, ou melhor, à conversa. Conversa íntima. E sabe qual o seu tema? As coisas detestáveis da vida. Será que o leitor concordará comigo? Vamos lá.
Comecemos por esta coisa odiável, que se chama barulho excessivo. Nossa capital, há muito, que é líder em poluição sonora. E não se vêem campanhas educativas do poder público para esclarecer sobre os seus malefícios e sobre o desrespeito ao sossego alheio.
Vamos adiante. Que tal uma visita inesperada, que chega sem avisar? Como é constrangedora! Mais outra: certos telefonemas, oferecendo seguros de vida, cartões de crédiot, e sempre com aquele antipático e artificial sotaque sulista...
E que dizer do trânsito engarrafado? Quanto a mim, costumo sempre botar uma boa música, no som do carro, abrir um livro. Ou senão fazer uma reflexão filosófica.
Outra coisinha detestável é ver uma cara de mau humor, uma carranca, pois existem pessoas que olham a vida como se estivesse cheirando mal... Coitadas.
E que dizer de gente que buzina sem necessidade na rua, às vezes de forma insistente e prolongada? É de a gente tapar os ouvidos. A mesma coisa diremos no que diz respeito à linguagem vulgar, pornofônica de certas músicas populares. Além do linguajar, um péssimo hábito de que, lamentavelmente, a juventude de hoje está contaminada. Outrora, se não me engano, havia uma polícia de costume para coibir tais abusos.
Vejamos, agora, outra coisa chata, chata não, detestável: os fogos de São João. Dessa comemoração ao santo, só se salva mesmo é a comida. Cangica, milho assado, milho cozinhado, , pamonha.
Sim, já ia me esquecendo de outra coisa abominável: as bombas de São João. Fogos, só os de artifício, que silenciosamente iluminam as nossas noites.
E que dizer do mau humor? Ah, é preciso muito bom humor para suportar um sujeito mal humorado.
E antes que se acabe a crônica, ou melhor, essa conversa fiada, que tal mencionar as salas de espera dos consultórios médicos, sobretudo com aquela TV ligada para entreter as pessoas?

 Fiquemos por aqui, e pensemos nas coisas boas da vida.

Muitas vezes precisamos fazer um pequeno ajuste em uma fotografia e não dispomos de nenhum editor de imagem. No trabalho, por exemplo, temo...


Muitas vezes precisamos fazer um pequeno ajuste em uma fotografia e não dispomos de nenhum editor de imagem. No trabalho, por exemplo, temos aquela foto especial que necessita de um simples retoque, um pequeno corte, uma clareada, mas o velho PC corporativo não tem nem mesmo o pré-histórico Paint para essa tarefa básica.

A s batinas de antigamente eram pretas. A Igreja evoluiu e elas desapareceram. O sacerdote, então, passou a usar roupa como os demais homens...

As batinas de antigamente eram pretas. A Igreja evoluiu e elas desapareceram. O sacerdote, então, passou a usar roupa como os demais homens. Mas, falemos dos padres da batina preta que cruzaram o caminho de minha existência. Foram tantos! E muitos deles me ensinaram muita coisa. É o caso de dizer, não é o hábito que faz o monge.

E eu não sei por onde começo. Ah, já sei, vou começar pelo padre Abath, que foi meu vizinho, quando eu vim morar na Rua Nova. Ele ainda era seminarista. Bonito, educado, as meninas do colégio faziam tudo para namorar com ele. O seminarista, porém, só tinha um amor. O amor a Deus. Foi fidelíssimo ao seu sacerdócio. Depois, tornou-se padre, e por algum tempo ocupou o microfone da Rádio Tabajara com suas inspiradas mensagens.

Como disse, ele morava na Rua Nova, vizinha à nossa. Uma residência de espíritas ao lado de uma residência de católicos. Meu pai era presidente da Federação Espírita Paraibana. Meu pai desencarnou, e pouco tempo depois, padre Abath, encontrando-se comigo, disse em voz alta, do outro lado da calçada: “Seu pai foi um santo” Ah, como isto me consolou e como aquele sacerdote cresceu na minha admiração... Padre Abath, jamais o esquecerei.

Mas vamos a outras batinas pretas. E quem me chega agora à imaginação é o padre Zé Coutinho, estendendo-me a mão e dizendo ’Um dinheirinho para os meus pobres, prezado”. Não, nunca houve na Paraíba um missionário como aquele, um verdadeiro amigo dos pobres, cujo Instituto ensinava muita coisas, a começar pelos cursos de datilografia. Padre Zé Coutinho vestia uma batina meio rota, terminou sua missão aqui na Terra numa cadeira de rodas e munido de uma vareta com que cutucava as pessoas pedindo dinheiro para o seu Instituto.

Curioso, ele, toda vez que se encontrava com o meu pai, a primeira pergunta era: “Como vai teu Espiritismo, Zé Augusto? “Sim, ambos tinham sido colegas no Seminário Diocesano, desta Capital.

Minha gente, padre Zé Coutinho foi um santo, um verdadeiro discípulo de Jesus. Uma batina que só fez amar ao próximo, não apenas com os atos, mas com a palavra, usando o microfone de seu programa na Rádio Tabajara, todos os dias.

Mas vamos a outras batinas. No antigo Liceu Paraibano, tive professores padres, desde o Monsenhor Pedro Anísio que ensinava português; o Monsenhor Odilon Coutinho, professor de matemática; disciplina que não consegui aprender, e o padre Matias, que ensinava Geografia, mas que, um dia, achou de examinar as unhas dos alunos para saber quem as tinha sujas...

E o Padre Matias, político, inteligentíssimo, e, sobretudo, homem de letras? Foi um dos fundadores de nossa Academia. E vou encerrar a crônica com o padre Hildon Bandeira, que tinha horror ao Espiritismo, a ponto de escrever uma série de artigos, no jornal católico A Imprensa, sob o título geral “Guerra ao Espiritismo”. Mas quem enfrentou o padre foi Horácio de Almeida, advogado, homem culto e que adorava polêmica. O padre não resistiu aos argumentos de Horácio, e terminou saindo da polêmica por ordem do arcebispo Dom Adauto.

S im, quem era aquele homem de linho branco, que está ali, a conversar com os amigos, e só ele falava? Estávamos, no Ponto de Cem ...


Sim, quem era aquele homem de linho branco, que está ali, a conversar com os amigos, e só ele falava? Estávamos, no Ponto de Cem Réis, que, naquela naquela época, era uma espécie de pátio cultural, onde se reuniam políticos, jornalistas e escritores, sem esquecer os juízes e os desembargadores.
Naquele grupo, só o homem de branco falava, os outros só faziam ouvi-lo Elegante no vestir, no falar, ele me chamou a atenção. E veio a resposta à minha indagação: aquele é doutor Mário Moacyr Porto, juiz de Bananeiras. E fiquei a imaginá-lo caminhando pelas silenciosas ruas de sua comarca, certamente sem público para ouvi-lo. Mas aquele homem simples sabia pensar e quem sabe pensar nunca esta só.
E eis que chegou a vez de o homem de branco ser promovido a desembargador. Viria agora para a capital. E vez por outra, vestiria uma toga preta.
Foi daí em diante que começou minha amizade com ele. Ele desembargador e eu juiz. Mas ele não via em mim um magistrado e sim um cronista, um homem de letras, um homem de jornal, que era mesmo a minha vocação.
Fomos amigos, para a minha honra. E com ele só fiz aprender. Ele era, sobretudo, um homem de Letras, tanto é assim que terminou aterrissando na nossa Academia de Letras. E, aqui para nós , num cochicho ele me disse gostava de ler minhas crônicas.
Mario Moacyr Porto foi, antes de tudo um homem de muita ética. Um verdadeiro príncipe. Um varão de Plutarco.
Escreveu vários textos de Direito Civil, sua especialidade. Que estilo! Que maneira elegante de dissertar, sem querer mostrar erudição.
Uma vez, ele me disse, “cronista, você é, antes de tudo, um admirador do sexo feminino”. E disse uma verdade.
E agora aconteceu o que ele não esperava. Escrevi um livro com o título “O Papa e a mulher nua”. E para apresentá-lo, não pensei duas vezes: Mário Moacyr Porto. Nesse tempo ele já tinha se aposentado e morava em Natal. Escrevi-lhe uma carta formalizando o convite. Ele respondeu, ironizando, “mas, cronista, você quer me incompatibilizar com a Igreja?”
E concluiu a carta, aceitando o convite. Eu quase caí de emoção. O lançamento se deu no restaurante Pedra Bonita, na cobertura do Espaço Cultural, que, infelizmente acabaram.
O jurista e homem de letras Mario Moacyr Porto apresentou meu livro. Foi aquele um dos melhores momentos de minha vida, que jamais esquecerei.
O lançamento do livro foi uma beleza. Mario Moacyr foi a grande estrela. Todo mundo desejava ouvi-lo. Formou-se uma grande roda de cadeiras em torno do jurista e homem de letras. E eu morrendo de alegria, da boa vaidade.
Não me saem da memória as palavras do ilustre apresentador, cheias de muito humor. Mas, não devo esquecer, para alegria minha, a presença da minha Alaurinda, de Márcia Kaplan, viúva do maestro Kaplan, e de sua filha Ana Elvira, que muito me ajudaram na preparação do lançamento.
O lançamento teve gosto de “quero mais”. Mas o nosso príncipe não ficou apenas na apresentação. Mais tarde, já em Natal, ele me escreve elogiando o livro e a festa.
Fico por aqui, com medo de que venham lágrimas aos meus olhos.

E , de repente, eis o cronista num salão de beleza, acompanhando a esposa, informando que iria demorar um pouco. Fiquei meio tonto ...


E, de repente, eis o cronista num salão de beleza, acompanhando a esposa, informando que iria demorar um pouco. Fiquei meio tonto em ver tantas mulheres cuidando de seus cabelos, de suas unhas, de seus pés, de seu rosto, que a beleza ainda é a grande meta, sobretudo para o outrora sexo frágil. Mais de cinquenta mulheres, de tesoura na mão mexendo nos cabelos das clientes, que dormiam ou faziam que dormiam.
E vi como é difícil o trabalho dessas profissionais da beleza, sem esquecer os homens, também muito eficientes no seu ofício de embelezamento. Quase caí da poltrona, que me ofereceram, quando vi uma frequentadora do salão, rica dos anos, sair inteiramente rejuvenescida. E me veio aquela recomendação de minha mãe: “meu filho, velhice quer trato”. E ninguém melhor do que ela cumpriu este preceito. O relaxamento com a própria pessoa é uma ofensa à Natureza.
Mas voltemosao salão. Vi um homem, por sinal muito bem vestido, cochilando, enquanto a manicure cortava-lhe as unhas. Pelo jeito, tratava-se de um deputado ou um executivo. Curioso é que parecia dormir. Decerto era solteirão, viúvo ou desquitado, porquanto uma mulher ciumenta não o deixaria assim, mesmo cochilando.
Ainda bem que levei um livro para aproveitaro tempo. Mas diante daquelasdezenasde mulheres, preferi ficar olhando o espetáculo, pois gosto muito de observar as pessoas. E pus-me a pensar na transitoriedade da vida.
Quantas pessoas desejando ser belas, principalmente as mulheres que têm horror à velhice. E como se preocupam com o cabelo. Ainda bem que nunca houve uma moda careca. Quando uma mulher é olhada, se sente observada(e ela vê pelos poros), graças à sua inata intuição, a primeira coisa que faz é dar um jeitinho, uma sacudida no cabelo.
Vieram me oferecer um Capuccino, que adoro. Gentileza da casa. E cadê minha Alaurinda? Certamente está em outra secção. O salão de Anthony é imenso. O deputado já se foi com as unhas dos pés bem cortadinhas. E viva a aparência. Somos julgados por ela. Equem me ajuda a aparar as unhas dos pés, estes adoráveis pés que me levam às caminhadas, é minha Lau.
Eu corto meu cabelo aqui perto, no salão de beleza “Semper Bela”, com o meu cabeleireiro Josias, um grande conhecedor da Bíblia, mestre na tesoura, nascido em Riacho dos Cavalos

V ou concluir, hoje, minhas impressões sobre a Nova Zelândia, aquela ilha paradisíaca que dorme, isolada, no oceano Pacifico. Como já mencio...



Vou concluir, hoje, minhas impressões sobre a Nova Zelândia, aquela ilha paradisíaca que dorme, isolada, no oceano Pacifico. Como já mencionei, estivemos lá duas vezes, e espero que descansemos um pouco, porquanto a viagem é longa.
Mas qual a razão do título? Prossiga na crônica, curioso. Não esqueça que nesta viagem àquela ilha o calendário assinalava a Semana Santa, quando recordamos os sofrimentos de Jesus.
Continuemos com a viagem. Digo, agora, passeio. Passeio de carro, com meu filho Germano na direção pela mão esquerda. E lá fomos estrada afora, entre altíssimas e silenciosas montanhas, muitas delas com suas cascatas, que desciam numa lentidão de lágrimas. Montanhas nunca vistas com tanta abundância. E nos informaram que muitas delas, no passado, se irritavam e viravam vulcões. Mas no nosso passeio, elas dormiam seu sono místico.
Eram montanhas de um lado, florestas do outro, e, por cima, um céu limpo de nuvens. Quanto silêncio, meu Deus! Dava para ouvir as batidas do coração. Quilômetros e mais quilômetros, e, de repente, a Pastoral de Beethoven pelo rádio, em homenagem àquele momento de paz. Ah, se o mestre de Bonn, tivesse conhecido a Nova Zelândia! Quanta inspiração encontraria para as suas sinfonias e sonatas!
Horas e horas caminhando no paraíso. E eis que regressamos com o coração vibrando de contentamento, os olhos ricos de imagens paradisíacas. De repente, alguém lembra: quando é que vamos a Kare Kare, uma praia distante e isolada, que já foi cenário do famoso filme “O Piano”. E lá fomos atrás de mais um paraíso.
Mas, aqui é que começa meu sofrimento. A mata intrincada, quase virgem, muitas pedras no chão e muitas árvores se abraçando, querendo impedir nossa caminhada. Seriam ciúmes? Não sei. Só sei que tive de entrar num riacho cheio de pedrinhas furando os meus pés. Fui amparado pelo braço do meu amigo Davi, que, ao invés, de pena, dava boas risadas.
Por fim, a praia. Uma praia mais para surfistas do que para banhistas. Uma praia mística, boa para a reflexão, para uma conversa com Deus. Ah, as pedrinhas do riacho! Como sofri...! Mas, pior foram aqueles pregos enormes furando os pés de Jesus.
E foi com os meus, ardendo que nem fogo, que sai pisando naquele mundo frio e silencioso. Aí respirei fortemente, e botei aquela paisagem dentro de mim.
A praia de Kare Kare continua na minha cabeça. Que refúgio! Não me esqueço daqueles jovens bonitos e cheios de vida, dentro de uma barraca, preparando o material para o surf. Muitos deles já estavam deslizando nas ondas fazendo inveja ao cronista, que tiritava de frio. Sim, lembrar que eu estava numa ilha solta no Pacífico, um pedacinho de nada de terra. Esta viagem, aqui na Nova Zelândia não foi só uma viagem, nem um passeio. Foi uma grande aventura!