Pela janela entreaberta vê-se o céu mudar. Da clareza do verão, passe-se a anuviada temporada das chuvas, o que chamam invernada. Dos tem...

Janelas de atualizações

Pela janela entreaberta vê-se o céu mudar. Da clareza do verão, passe-se a anuviada temporada das chuvas, o que chamam invernada. Dos tempos das árvores em nudez profunda cujas vestes foram removidas pelos ventos, que parecem fechar-se ao serem expostas, corre-se para mais adiante uma explosão de cores e cantos, uma algazarra de vida. A passagem visual é o reconhecer do relógio do tempo em efeito prático.

Visualmente são pequenas alterações quase imperceptíveis ao longo de tantos anos. Porém, para o olhar atento do observador fiel de cada dia abre-se um mosaico em movimento que após tantos ciclos dá-lhe a certeza que o lugar projetado pelo espaço retangular para suas órbitas oculares tem ganho grandes modificações. É montar um quebra-cabeça cujas peças alteram-se a cada ponteiro que salta à próxima casa.

A própria janela é uma novidade contínua. Ora com a pintura descascada, gasta, ora revigorada e alegre, vai mostrando aquele pedaço de mundo. Um novo dia e a casa distante mudou de cor. Outro momento chega e a pequena plantinha ocupa parte do espaço e encobre quase todo o mundo, para ser podada em seguida, numa tentativa humana de domar a natureza. Mas ela não se deixa controlar por arreios, é rebelde por ser natureza. E novamente impõe sua vontade até ser lacerada pela mão do dito ser humano.

E tudo é visto e é possível pela janela. Como perceber os encontros e desencontros das ruas, ler as mentes dos passantes e reconhecer as atualizações físicas. Engano ao pensar só em avanços, pois tudo é apenas uma corrida para um fim ou a uma desconhecida passagem e por vezes o seguir é decair. Pode-se até discutir, mas, no fim, não importa, o caminho terá, inexoravelmente, um desfecho. E até lá, sempre será possível uma parada para observar. Claro, há o pincel na mão para fazer retoques, construir um cenário mais bonito.

O autor do quadro temporal da janela percebe que é afetado pelo tempo igualmente à paisagem. Fica maior, muda as feições, torna-se o mesmo, porém diferente. Já deixa de ser o antes e transmuta-se para um novo, guardando muito de si mesmo, mas atrelando a si novas configurações. O tempo faz atualizações na alma, algo semelhante ao que o homem dotou a máquina. Pois toda sua criação é uma cópia do que observou pela janela.

Um dia, as modernizações cessam, não são mais possíveis. É o momento de surgir o novo. Para o homem, já velho, é um novo estágio. Sua próxima atualização é uma incógnita.

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  1. Adorei este texto que a "Visão através da janela" lhe inspirou ...meu caro amigo Clóvis Roberto.A Visão através da janela pelo " observador atento/ Criativo Ser~~~É !!! simplesmente uma sequência panorâmica.
    Paulo Roberto Rocha

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