Trabalhei com Dr. Lucas Suassuna, irmão do imenso escritor Ariano Suassuna, na Assessoria Jurídica da Universidade Federal da Paraíba (departamento extinto, há tempo). Ele nos considerava colegas, no mesmo nível dele, nosso chefe. E nós, eu, Luiz Graciano Cabral, de saudosa memória, éramos aprendizes, recém- saídos do forno do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais (era o nome oficial e pomposo do Curso de Direito da velha Faculdade, cujo prédio histórico ficava na Praça João Pessoa).
Dr. Lucas era um homem simples, sem se deixar coroar por petulância de cargo e outras medíocres miudezas. Espigado, alto, nariz comprido, brincalhão, nunca se descuidou da responsabilidade que lhe impunha o ofício. Na companhia do indispensável cigarro que, segundo ele, o ajudava no raciocínio, dava um parecer ou erigia uma outra peça jurídica num correr de tempo e admirável rapidez. Certa feita, após rascunhar uma contestação, ma deu para ler e opinar.
Quando terminei, me perguntou, sorrindo:
⏤ Entendeu alguma coisa?
⏤ Nada, me desculpe.
⏤ Nada, me desculpe.
E ele, retomando os escritos, deu uma tragada e me respondeu:
⏤ Era assim que eu queria. O juiz também não entenderá patavina.
Fiquei surpreso. Fazia palavra cruzada, enquanto contava lorotas para relaxar.
Sempre no indefectível paletó e gravata, elegante, mas sem empáfia. Ajudava o próximo (lembro Vicentinho, asmático, funcionário pobre, e outras pessoas necessitadas). Dizia só acreditar em Deus e na força de trabalho. O resto era balela.
Mas o gesto que mais me impressionou, durante todo o tempo convivido com Dr Lucas foi quando recebeu largo e suntuoso envelope. O conteúdo era convite em letras góticas para um almoço com autoridade de alto escalão, o Ministro da Educação, em visita à cidade de João Pessoa, que, em particular, vinha conhecer o campus universitário. Rasgou o endereçado chamado e depositou na lixeira. Ficamos perplexos.
Dr. Lucas afirmou não trocar o almoço de seu íntimo convívio familiar por banquete algum. Tirou o paletó que descansava no encosto da cadeira giratória, despediu-se de nós dois e saiu radiante, a fim de se aconchegar no fusca azul escuro e abrir caminho a Recife, onde residia com a família.
Como era sua rotina do meio-dia, nas sextas-feiras.
Lucas Vilar Suassuna, um grande homem. Saudade.
Esta crônica é oferecida a Fernanda Suassuna, filha do mestre, figura central deste texto. Extensivo aos familiares.