Sabemos que um jornal é lido por muita gente, porque o que ele noticia interessa a algumas pessoas. Mas o assunto de hoje é corriqueiro. Se não agradar ao leitor, por favor, pode passar a outra coluna. Falarei dos lírios e de outras flores que a esposa cultiva com esmero no jardim de nossa casa, mesmo em pequeno espaço.
Depois de um período expondo beleza e suave perfume, o lírio branco do nosso pequeno jardim perdeu pétalas. Observando as flores, no silêncio que recolhe a pureza da natureza, voltam-me as imagens, doces
José Nunes
No pequeno espaço que acolhia o frescor das noites de Serraria, as flores eram regadas, com carinho, por mamãe e minhas irmãs. As flores do jardim de outrora perfumavam nossa casa no sítio Tapuio, ornavam os altares durante o mês de maio e enfeitavam os caixões dos inocentes que levávamos à morada eterna.
Na visita matinal, em manhã ensolarada do final da Primavera, antes do café, observei que as primeiras pétalas do lírio começavam a despencar do talo. Silencioso, cantei um hino de louvor por ter proporcionado momentos agradáveis, de contemplação e paz durante longo período da Primavera observando os lírios.
O escritor Érico Verissimo nos mandava fazer uma pausa na nossa vida para olhar os lírios do campo e as aves do céu, como ensinam os escritos bíblicos. As flores revelam segredos que somente a alma é capaz de compreender, viver e transmitir francos pensamentos.
A vida começa no amanhecer de cada dia. Olhar os lírios e outras flores nos ajudam a alargar nossa visão, a fim de acalmar o espírito para a labuta diária. É importante cultivar flores em suas casas, mesmo em pequenos jardins ou em vasos. Não é coisa de poeta ou de místico, de gente aluada, mas as plantas conversam conosco.
Desde quando morava no sítio Tapuio, sempre gostei de conversar com elas, mesmo sem pronunciar uma palavra. Nessas ocasiões, escutava em casa a preocupação de mamãe: “Este menino está bisonho!”
A terra é revestida de tantas belezas proporcionadas pela natureza, cada região com sua diversidade de flores e plantas, na sua infinitude de cores. Mas nem sempre percebemos as sutilezas que abrolham desses lugares.
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Depois da convalescência do sono, contemplar o entalhe das pétalas do lírio sempre foi uma renovação espiritual, ajudava a esquecer a noite, enquanto esperava o dia renascer. O dom do silêncio purifica e recria, e olhar as flores elimina o nevoeiro da distração, afasta o cansaço, esmaga o desejo de vingança, dissipa as dores da alma.
Olhando os lírios ou outras flores, temos a possibilidade de reinventar a esperança no espetáculo da vida. Anima e nos convida a sermos mais simples. Não cuidamos da terra que fornece os frutos que nos alimentam e as flores que perfumam os ambientes. Flores que nos curam, nos abraçam e nos fazem pousar em solo firme para flutuar na paz.
Outros lírios renascerão. A vida é um eterno renascer, uma ressurreição.