A palavra do dia é moderação. Na música Positivismo, o grande Noel Rosa constrói uma belíssima e inusitada metáfora, como um conselho à amada que despreza o seu amante e o deixa:
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Vai, orgulhosa, querida
Mas aceita esta lição:
No câmbio incerto da vida
A libra sempre é o coração.
GD'Art
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De Noel, passamos para o latim no seu sintetismo, dizendo muito com poucas palavras – in medio virtus. Embora a expressão latina queira dizer apenas o que ali se encontra, que o meio, o equilíbrio, a moderação é onde se encontra a virtude do ser humano, há os que distorcem o significado entendendo a sentença como uma definição de mediocridade, como se a mediania não fosse um perfil geral, como se a expressão significasse apenas a inferioridade. Todos somos medianos. Acima disso, os gênios.
A mediania nos ensina a viver e dar outros voos de vez em quando, mas sempre voltando para pôr os pés na terra, onde está a nossa segurança. Mediania é um outro nome para a moderação que todos devemos ter, o que poderíamos também chamar de sobriedade.
Vamos para a língua grega, com a sua precisão no emprego dos seus termos. Para o homem grego, desde os tempos arcaicos, o que equivale dizer tempos homéricos, o diafragma era a sede do saber, do raciocínio, da reflexão.
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A palavra diafragma, em grego, é frén (φρῆν), cuja raiz se encontra em um dos mais caros termos para Platão. O termo também é caro no âmbito da tragédia grega, para o entendimento do erro transcendental que o homem comete, cavando sob os próprios pés um grande abismo, do qual, dificilmente,
A moderação é exercício diário, que nos dá mais tempo para a reflexão, para que nos dobremos sobre o nosso pensamento, antes de pronunciá-lo.ele conseguirá escapar, não por culpa dos outros, mas das suas carentes de reflexão: sōfrosyne (σωφροσύνη). Em suma, quando nos falta a reflexão necessária, para agirmos com moderação, pagamos pelos nossos erros, e não adianta culpar os outros.
Ao que parece, de uns anos para cá, esquecemos de cultivar a moderação, sendo o destempero a nota corrente, com as pessoas se exaltando e fazendo de qualquer atitude do outro um motivo para um digladiar-se sem fim.
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A moderação, portanto, é exercício diário, que nos dá, pelo cerceamento da efusividade e da impulsividade, mais tempo para a reflexão, para que nos dobremos sobre o nosso pensamento, antes de pronunciá-lo. Não esqueçamos que uma das imagens caras a Homero é uma referência a “proferir palavras aladas” (ἔπεα πτερόεντα προσηύδα, Ilíada, Canto IV, verso 284). Paralelamente, havia a expressão “palavra que transpõe a barreira dos dentes” (ποῖόν σε ἔπος φύγεν ἔρκος ὀδόντων, Odisseia, Canto I, verso 64). Se as palavras aladas podem ser boas, quando ditadas pela sōfrosyne, elas serão danosas, quando irrefletidas, porque depois que transpõem a barreira dos dentes, tendem a destruir o equilíbrio, a moderação, a reflexão, que habitam a mediania e fazem o mundo avançar.