Para um amigo sertanejo Eu morava com meus pais e mais doze irmãos. Te digo que a vida hoje é mole demais, mas naqueles tempos, o sofr...

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Para um amigo sertanejo

Eu morava com meus pais e mais doze irmãos. Te digo que a vida hoje é mole demais, mas naqueles tempos, o sofrimento era tão grande que as vezes dava dó até de viver. Morava num sítio chamado Massapê, mas não sei o porquê, já que tudo ali era seco e esturricado. Talvez o nome fosse por conta de uma glebazinha de terra em que a curva do rio banhava, lá nos fundos da propriedade. Ali sim, bom torrão que Pai plantava até arroz vermelho.

Veio e se sentou no banco do calçadão. Emplumado em cetins e lantejoulas, os sapatos bicudos, a cara mastigada pela idade avançada. Retir...

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Veio e se sentou no banco do calçadão. Emplumado em cetins e lantejoulas, os sapatos bicudos, a cara mastigada pela idade avançada. Retirou da maleta uma peruca colorida em vermelho e azul. Deu uma gargalhada e cantou um estribilho fácil de cançoneta perdida no picadeiro de finado circo. Geléia se apresentou a um público distanciado.

Fui ao supermercado fazer as compras da semana. Notei tudo mais caro uns 15%. Peguei um Uber na volta.

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Fui ao supermercado fazer as compras da semana. Notei tudo mais caro uns 15%. Peguei um Uber na volta.

Conheceram-se na universidade. Além da mesma idade, gostavam das teorias da Física e compartiam incurável urticária pela Química, exceto p...

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Conheceram-se na universidade. Além da mesma idade, gostavam das teorias da Física e compartiam incurável urticária pela Química, exceto pelas monitoras que auxiliavam nas aulas práticas, com seus impecáveis jalecos brancos, luminescentes, flutuando por entre os tubos de ensaios como os gases da tabela periódica de Mendeleiev.

Ritual de abril Em dia de chuva, somos pingos soltos sem para-quedas, libertos rumo ao abraço, concreto na atração do beijo, do ...

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Ritual de abril
Em dia de chuva, somos pingos soltos sem para-quedas, libertos rumo ao abraço, concreto na atração do beijo, do cheiro da terra molhada, do espelho no uniforme ballet sem ensaio apenas céu em despejo sobre o nada e o tudo somos multidão de água dividida em indivíduos da nuvem à poça, ao copo, ao corpo ritual de abril, de novo

Há mais de um século, o cinema atua como um universo paralelo onde os seres humanos se espelham e que por sua vez — espelha a odisseia da ...

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Há mais de um século, o cinema atua como um universo paralelo onde os seres humanos se espelham e que por sua vez — espelha a odisseia da humanidade. O cinema condensa uma temporalidade particular que nos regata da crueldade do tempo cronológico devorador; portanto, nos salva do medo da finitude e nos atira numa dimensão paralela, catártica, que nos arrebata e nos encoraja para agir afirmativamente na espessura da vida vivida.

O mito é o nada que é tudo O mesmo sol que abre os céus É um mito brilhante e mudo O corpo morto de Deus Vivo e desnudo. Fernando Pessoa ...

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O mito é o nada que é tudo O mesmo sol que abre os céus É um mito brilhante e mudo O corpo morto de Deus Vivo e desnudo.
Fernando Pessoa

O registro sobre os mitos se compõe de um vasto estudo de autores que foram imprescindíveis para a compreensão e o aprendizado da Literatura Clássica. Ao estudar Eurípedes, Hesíodo, Sófocles, Ovídio, Platão, Ésquilo, Virgílio, Homero — entre tantos outros —, vamos concluir que todos os heróis inseridos nos escritos nos ensinam por meio de uma sutil simbologia.

Se o poema é triste, tal circunstância não quer dizer que o autor também o seja. O eu-lírico pode até ter escrito o poema movido pela mais...

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Se o poema é triste, tal circunstância não quer dizer que o autor também o seja. O eu-lírico pode até ter escrito o poema movido pela mais profunda tristeza, mas isso não quer dizer necessariamente que o autor seja um triste em regime de tempo integral e dedicação exclusiva. Por essas e outras é que alguns leitores de Augusto dos Anjos tendem a misturar alhos com bugalhos. Ou seja, julgam o autor, o homem Augusto dos Anjos, tão ou mais triste quanto os seus poemas, sem saber dos versos humorísticos que ele publicava nos jornaizinhos que circulavam durante os festejos de Nossa Senhora das Neves, padroeira da cidade de João Pessoa, anteriormente denominada Parahyba do Norte.

  Sem encontrar palavras para expressar minha saudade e meu agradecimento ao conterrâneo, amigo e mestre Nathanael Alves, nos quarenta ...

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Sem encontrar palavras para expressar minha saudade e meu agradecimento ao conterrâneo, amigo e mestre Nathanael Alves, nos quarenta anos de sua morte, recorro ao poeta Luiz Augusto Crispim, igualmente revelador da alma humana, cujas crônicas de profundo lirismo abordam temas do cotidiano e nos enche de prazer a sua leitura. Nathanael Alves nasceu no povoado de Arara, então município de Serraria. Conterrâneo que se fez merecedor de nossa admiração, porque carregava a paciência franciscana e a compaixão de padre Ibiapina pelo sofrimento alheio.

Newton Leite, que nos deixou na última segunda-feira, aos 84 anos, foi uma das minhas surpresas quando fez de um projeto difícil, com a co...

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Newton Leite, que nos deixou na última segunda-feira, aos 84 anos, foi uma das minhas surpresas quando fez de um projeto difícil, com a complexidade que sugere a implantação de um hospital-escola num meio precário de recursos e de apoio técnico, uma vitoriosa realidade. Refiro-me ao Hospital Universitário, iniciado no reitorado do capitão Guilardo e franqueado ao grande público na gestão de Lynaldo Cavalcanti.

Um ano de COVID, de descaso e crueldade psicopática em nosso país, um gozo extremo em milhares de mortes, e os vivos que se perdem em lágr...

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Um ano de COVID, de descaso e crueldade psicopática em nosso país, um gozo extremo em milhares de mortes, e os vivos que se perdem em lágrimas de dor e espanto. Um ano de medo e insegurança, que nos leva aos primórdios da sobrevivência. Mas tudo não passou impunemente, gerou filhos, como Hades, que se tornaram alimento.

Uma amiga tem chorado e dormido mal nos últimos dias. Não, o motivo não é a covid-19, que provoca temor e ansiedade mas já não arranca lág...

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Uma amiga tem chorado e dormido mal nos últimos dias. Não, o motivo não é a covid-19, que provoca temor e ansiedade mas já não arranca lágrimas a não ser daqueles que perderam seus entes queridos. O motivo é a morte do menino Henry, que foi supostamente torturado e assassinado pelo Dr. Jairinho (a imprensa bem que podia cortar esse diminutivo, que soa irônico).

O texto que apresento a seguir, sobre o soneto “Último Credo”, de Augusto dos Anjos, é fruto do diálogo sistemático que tenho em sala de aul...

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O texto que apresento a seguir, sobre o soneto “Último Credo”, de Augusto dos Anjos, é fruto do diálogo sistemático que tenho em sala de aula, procurando estabelecer um caminho metodológico de leitura analítica e crítica.

Certamente, alguns devem estar incomodados com o título atribuído a este ensaio – “A equação da espiritualidade”. O incômodo é proveniente de se ver, habitualmente, Augusto dos Anjos como o poeta da morte, sentido que ganhou uma dimensão inercial, de tanto repetido. Digamos que, de um modo didático, podemos caracterizar a sua poesia da seguinte maneira: os poemas constituem um sistema de vasos comunicantes, devendo ser lidos em conjunto, cuja linguagem científica

Em 2017 fui a um show do Roberto Carlos. Planejei ir e cheguei a desistir por causa dos preços. No último minuto, incentivada por um fã a...

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Em 2017 fui a um show do Roberto Carlos. Planejei ir e cheguei a desistir por causa dos preços. No último minuto, incentivada por um fã ardoroso, comprei o ingresso. Paguei caro, mas me dei ao desfrute de ver o Rei. Sozinha, pego um Uber e o que está a tocar? Mayara e Maraísa... só para começar a noite.

Tive oportunidade de ver Roberto na minha meninice. Primeiro no Astrea, escalando muros e obrigando a minha mãe (jovem na época) a fazer o mesmo. Até hoje ela relembra: “o que não se faz por uma filha!” Mas sei que adorou a desculpa e ama Roberto Carlos até hoje.
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E quando escuta “Como é grande o meu amor por você”, diz que se lembra dos namorados das quatro filhas...

Todos esses anos, assisto ao programa Especial de Roberto Carlos na TV, em final de ano. Quase um ritual para passar a limpo aquelas músicas que fizeram a trilha da minha adolescência e que até hoje me emocionam. Gosto muito da voz de Roberto e do seu repertório. Claro que sua fase religiosa não é a minha preferida, e muitas outras músicas também não gosto. Admiro muito o tempo que se mantém como Rei, com toda sua legião de fãs que não arredam o pé. Há muitos anos que não compro um CD seu, mas a maioria das suas músicas, vivi, fiquei na fossa, me encantei, namorei e me embalei nos sonhos de uma jovem menina-moça.

Logo no início do show, Roberto nos brinda com Que vá tudo pro inferno. Li nos jornais e no blog do fã e crítico Sílvio Osias, que, devido à sua doença (TOC), ele não cantava essa música; a palavra inferno maltratava-o. Gracias a la vida, fez tratamento e já cantou na TV. Ouvir esse hit que adoro, com arranjos mais que incrementados, me passou o filme. Tinha meus 11 anos, veraneava em Areia Dourada (que chamávamos Praia do Osso), gostava de pensar na vida (sempre fui sonhadora e contemplativa ), quando ouvi essa música pela primeira vez. E desde então que fiquei tocada e tomada. A letra era transgressora. O ritmo também. E eu, uma pré-adolescente que queria mandar tudo pro inferno!
E o meu compact disc realmente furou de tanto que ouvia e dançava pela casa, ou pelo coqueiral lindo daquela casa à beira mar que meu pai comprara, e um dia tive o luxo de veranear.

O show — como já disse Silvio — é impecável. Uma qualidade que supera todo e qualquer desconforto da casa de shows. Um som! Uma qualidade! Uma orquestra de músicos inigualáveis. As cordas, os metais e a voz bela de Roberto. Profissionalismo e respeito para com os fãs. Sem falar das dezenas de rosas jogadas às mulheres enlouquecidas à beira do caminho. Digo do palco! Claro que, se pudesse, meteria a mão naquele seu cabelo e assanhava todo. Mas acho que, com a sua doença da perfeição, aquele cabelo se parece com os cachos lindos ao vento das curvas da estrada de Santos. Tudo se perdoa! Inda mais um cabelo!

Enquanto assistia a "Lady Laura", chorei com saudades de uma mãe perdida no meu inconsciente. Por que que é eu rolo na cama? – sem comentários; Detalhes , "Nós dois", Amada Amante (Ah! Quem um dia já não foi?!), e principalmente Sua estupidez – uma nostalgia for the past! — fiquei com saudades eternas dos meus namorados ou amores pela vida. Alô Alô, pessoal! Lembrei de cada um de vocês, viu!. Dos beijinhos no portão escondido. Dos amassos proibidos. Dos olhares arregalados. Dos arrepios. Dos sonhos eróticos, mas não só. De beijo mais longo. Do mais estrelado. Dos toques. Da iniciação sexual. Dos jambeiros cúmplices/silenciosos da minha casa. Do escondido. Do velado. Do sagrado. E mais ainda do profano! E das pequenas transgressões da menina. E das grandes também.


É por isso que gosto de Roberto, que hoje completa 80 anos de idade! Sua música embalava um tempo da jovem guarda, que era um tempo meu. Assistia a todos os programas de TV. Só depois viria a ser mutante, tropicalista, revolucionária e mulher de Atenas! Comprei minha calça Saint-Tropez, vesti mini-blusa, me rebolei nas matinês do Cabo Branco. E peguei na mão daquele que um dia viria a ser o meu marido. E outras também... às escondidas e às claras. Roberto fala de tudo isso. E com uma melodia que nos transborda de alegrias, saudades, nostalgia e amor.

Naquele show de 2017 fiquei feliz. Muito. Adorei ver os casais jovens dançando. E pensei: “que amor!”, dançar ao som de Roberto, ao vivo. Ao meu lado havia um casal de meia idade (não sei bem o que isso significa...) e quando Roberto cantou seu mais novo sucesso, "Sereia" (trilha da novela A força do querer), a jovem senhora de cabelos brancos agarrou selvagemente seu companheiro e tascou-lhe um beijo na boca. Beijo em pé, como dizemos! Ele carinhosamente abraçou-a e retribuiu, e daí engataram uma dança de rosto bem colado, ardentes e botando o amor em dia. Pensei: “Ai Ai, meu Deus! O amor é mesmo lindo!”. Senti muitas saudades, não somente do meu querido Juca (amor eterno), mas dos outros amores também. De todos. Dos meus antigos namorados. Nem foram tantos! Mas um bocado para o gasto das lembranças queridas e para cantarolar Roberto Carlos e os botões da blusa...

Ainda estou a cantar pelo meio da casa: Chegaste , "Sereias", Esse cara sou eu , Outra vez , Como vai você , Olha , Desabafo , Se você pensa , e Como é grande o meu amor por você . Antes era a minha mãe que chorava, hoje sou eu, com uma saudade grande dos amores da vida, que na verdade é uma saudade de mim mesma, saudade da vida. Saudade do tempo! Roberto nos resgata essa vida, e mais ainda, esse tempo.

Roberto é bárbaro!
Dedicado a Sílvio Osias e Martinho Moreira Franco

Teve sim, esse momento de não lhe ser tão difícil mover-se na escuridão quanto raciocinar dentro dela. Segundo disse, foi num quase su...

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Teve sim, esse momento de não lhe ser tão difícil mover-se na escuridão quanto raciocinar dentro dela. Segundo disse, foi num quase surto, quando se apercebera, por fim e de repente, que uma parte de seu eu viera precocemente se esvaindo naquele turbilhão de horas mortas — no meio de uma palidez de lajedos mergulhando em resfriamento profundo e crescente anulação de presença, mas até um último momento permanecendo capaz (aquela palidez) de fornecer algum contraste a olhos já então mais adaptados, denunciar uma lança espectral de gravatá, ou a sombra sem fundo de uma garganta de pedra —, e após o descortino do vulto lânguido e esguio de um lobo.

A história da família Rolim dá um romance. Mas essa não foi a opção do engenheiro e historiador paraibano Sérgio Rolim Mendonça ao escrev...

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A história da família Rolim dá um romance. Mas essa não foi a opção do engenheiro e historiador paraibano Sérgio Rolim Mendonça ao escrever sobre sua ascendência familiar em seu mais recente livro, A saga do Chanceler Rolin e seus descendentes, publicado, em caprichada e bonita edição, pela Editora Labrador, de São Paulo. Talento literário para isso, se fosse o caso, não lhe faltaria nem falta, à vista do que já mostrou quando da publicação de suas memórias (ou autobiografia),