março 14, 2023
QUANDO ESTENDI SEU CORPO NA AREIA Não sei mais de nada. O infortúnio é próprio da falta de sentido. (Ou será a fortuna...
QUANDO ESTENDI SEU CORPO NA AREIA
Não sei mais de nada.
O infortúnio é próprio da falta de sentido.
(Ou será a fortuna de ter te conhecido sob o efeito do álcool?)
A razão são as estrias
que acumulamos na pele,
e descamam a cada verão escaldante.
Quando estendi seu corpo na areia,
à semelhança dos fósseis,
um outro tempo dizia qual o nome
e o motivo de nosso encontro,
e o quanto de surpresa
preencheria o vazio de nossa existência.
SILÊNCIO ÁCIDO
Falo agora do seu silêncio,
dizendo: se afasta de minha boca
Eu queria me recordar, mas o vazio
tem a força que aspira os sonhos,
e a memória é um tempo perdido
no não encontrar o seu abraço
(O cinza não suporta o negro
das noites e seus redemoinhos)
Não aceito esta morte,
perder o amor arrebatado
do paraíso do seu nome,
e a balança que rege as mãos,
e o sentido dos gestos,
a mentira de rosto limpo
nas manhãs de paz
Não quero ser obrigado a parar a noite,
uma parte constrita de minha existência
pertence ao desespero de sua sombra
Eu me curo no tardar de sua partida.
DE IRMÃO PARA IRMÃO
Meu irmão tinha uma mala de livros
um dia ele a abriu
na minha frente
e partiu para o desmedido
entrei na mala
e me cobri
com as páginas de seus sonhos.
O DECLÍNIO DO ÚLTIMO DIA
Os restos de ontem
combinam com os corpos de outras eras.
São os mesmos mortos, as mesmas taças,
o mesmo desperdício.
A tradição das luvas e das meias,
as fendas na carne,
as porções de nozes sobre a mesa
e as varejeiras, tranquilas,
sobre os castiçais
BRUMADINHO
Eu não saberia dizer,
estou atordoado,
pisar o sem fundo das casas,
entrar pelos telhados na vida das pessoas, saber os muitos tons da verdade,
que a terra engole a fala dos homens
e os aniquila com esse funil de lama tragando o ar e a voz de Minas.
O mito é o pássaro que sobrevoa a tarde?
Não, isso é poesia,
e estou falando da morte.
As horas não são confiáveis,
traiçoeiras, se repetem
com sua vulgaridade sem fim,
ostentando seu desejo de consumir
cada espanto que nasce,
cada corpo que tomba.
Desenterre os ossos
─ e seus medos sem face ─
deixados em outro tempo.
E sobre a areia
despeje o brinquedo de armar, essa cama da carne
da marionete adormecida.
(do livro XXI Sombras, em fase de edição)
março 14, 2023
março 05, 2023
A CASA QUE ME RECEBEU DE PÉ Olhá-la sobre os ombros da primeira mulher Depois do gosto do leite, o pão, o ovo frit...
A CASA QUE ME RECEBEU DE PÉ
Olhá-la sobre os ombros
da primeira mulher
Depois do gosto do leite, o pão,
o ovo frito na manteiga - a saciedade
Cantos escuros, lascas de madeiras
e a correria das formigas nos tacos brilhantes
E o erguer-se, esse simulacro
de liberdade das patas
A primeira janela, o canto das Nereidas,
e o enigma da luz
(Ficou, de fora, a promessa do azul)
março 05, 2023
fevereiro 14, 2023
MANUAL DA ARQUITETURA DO VAZIO “ Os quartos por onde eu deito são pedaços de parede ” (Roberto Almada) Divida a casa por circuns...
MANUAL DA ARQUITETURA DO VAZIO
“Os quartos por onde eu deito
são pedaços de parede”
(Roberto Almada)
Divida a casa por circunstâncias
(o que fica na mobília são lembranças)
o canto é o lugar secreto,
ouvinte paciente, discreto
já as paredes, labirinto,
não duvide, segue ouvindo
cada greta guarda um nome
uma reticência e a fome
os grandes segredos morrem
quando as memórias escorrem
mágoas no porta-retrato,
amargas como o passado
nos canos, todo o defeito,
enganos, crimes desfeitos
o som percorrendo tudo
de uma ponta a outra, absurdo
fevereiro 14, 2023
fevereiro 06, 2023
CAMINHAVA-SE e o não distante, retinia nos bolsos. (não se atropela com passo inútil a promessa do broto de amanhã) ...
CAMINHAVA-SE
e o não distante,
retinia nos bolsos.
(não se atropela com passo inútil
a promessa do broto de amanhã)
Retiniam nos bolsos
os cristais, as balas,
o despreparo de ser
na miséria.
Caminhava-se
perdidamente, às cegas,
tonto de saber-se tonto,
fevereiro 06, 2023
janeiro 21, 2023
Rotina Convivia-se com a conformidade de ter o universo próximo de casa. O espaço delimitado pelo absurdo traço da co...
Rotina
Convivia-se com a conformidade
de ter o universo próximo de casa.
O espaço delimitado
pelo absurdo traço da conveniência
era marcado pelas solas dos sapatos.
(e trazia a fotografia do mijo fora da privada)
Para o gozo o número era par.
Pouco importava a singularidade da morte.
janeiro 21, 2023
janeiro 15, 2023
NATUREZA As artimanhas dos grãos perseguindo a eternidade As vozes perdidas no bambuzal O ponteio disperso no ve...
NATUREZA
As artimanhas dos grãos
perseguindo a eternidade
As vozes perdidas no bambuzal
O ponteio disperso no verde profundo
O despejar no Mundo
de chumaços de Pólen
O prisma orvalhado nascendo
no tear das aranhas
O revoar das lanternas noturnas
A generosidade da Paz
entrecortada de espantos
janeiro 15, 2023
dezembro 29, 2022
SILÊNCIO, POR FAVOR A beleza, essa panaceia para o desatino, deixa de lado os seus afazeres árduos de ser exceção den...
SILÊNCIO, POR FAVOR
A beleza,
essa panaceia para o desatino,
deixa de lado os seus afazeres árduos
de ser exceção dentre a vulgaridade dos dias
e se curva
diante do Rei do Futebol.
CASA DO MEU NOME
Era longe de um recanto a outro,
(custavam anos e atropelos)
construí-los, encontrá-los,
destituí-los do poder sobre nossa vida
A facilidade de idealizar, corromper
a decência da crítica, evitar
o torpor da certeza das paredes
dezembro 29, 2022
dezembro 23, 2022
ÁGUA A água dura o tempo de seu gosto, o reflexo oblíquo do Sol que insiste, o pormenor dos cinquenta tempos do Mundo ...
ÁGUA
A água dura o tempo de seu gosto,
o reflexo oblíquo do Sol que insiste,
o pormenor dos cinquenta
tempos do Mundo
no rasante da libélula
É esta água, repasto de surpresas,
não a mesma, sempre a mesma,
dispersa no azul redondo
Água que transborda e cessa,
recria e arrasta,
carrega o som
e derrama o silêncio
dezembro 23, 2022
dezembro 18, 2022
Domingo. Sol à pino. Dia da final da copa do mundo. Brasil torcendo pela Argentina? Muitos farão isto, justificando que o Messi merece...
Domingo. Sol à pino. Dia da final da copa do mundo. Brasil torcendo pela Argentina? Muitos farão isto, justificando que o Messi merece…
Mas o inusitado perpassa a vida, mesmo para os que insistem em considerar possível manter-se “isentos” dentro de sua bolha do “paraíso terrestre”.
Trânsito lento na mão oposta em frente a UFES. Uma corrida de rua, de um homem só.
dezembro 18, 2022
dezembro 15, 2022
POST SCRIPTUM Podia imaginar um doce espírito ter o brilho secreto de um anjo derramando no absurdo o sem juízo de seu...
POST SCRIPTUM
Podia imaginar um doce espírito
ter o brilho secreto de um anjo
derramando no absurdo o sem juízo
de seu nome, qual fosse um simples manto
pousado sobre a encosta, em um abismo,
(refúgio e temor do ser humano),
e o som, o eco, derradeiro grito,
mantra de entrega de seu corpo manso
(Não se disfarça, se acolhe o aflito
salto na intimidade do infinito,
daquele que sem asas faz seu voo)
“mais tarde”, sem sentido e agudo silvo,
remanso que não cabe ao corpo hirto
e o baque do soneto no abandono.
dezembro 15, 2022
outubro 08, 2022
Sou filho de Lourdes, migrante nordestina, natural do sertão do Rio Grande Norte. Para os oriundos da adversidade, não tem cantilen...
Sou filho de Lourdes, migrante nordestina, natural do sertão do Rio Grande Norte. Para os oriundos da adversidade, não tem cantilena e lamentação. Existem trabalho e o instinto de sobrevivência. Sou neto de Isabel, a quem devo tudo que sou como poeta. Sou irmão de Voltaire, nordestino que despertou meu sonho de poeta, cuja atitude de ao ver a avó ajoelhar-se e beijar-lhe os pés, apenas hoje entendo. Era uma santa. Dediquei a ela meu primeiro poema publicado:
outubro 08, 2022
setembro 20, 2022
O mundo em um “livrinho” Adentro, com pés trocados, este novo livro de José Augusto Carvalho. Faço isto, ao molde dos indíg...
O mundo em um “livrinho”
Adentro, com pés trocados, este novo livro de José Augusto Carvalho. Faço isto, ao molde dos indígenas da suposta “cipango”, que trocaram o sentido dos seus calçados, para confundir os portugueses que percorreram o Brasil em busca da prata andina, pelo o famoso caminho das antas (Peabirú). Mas, entrar em um livro de linguística com os “pés trocados”, é algo que cabe a um subversivo, a um poeta, algo sempre repisado pelo professor José Augusto Carvalho, em suas conversas com os poetas que o circundaram ao longo da vida.
setembro 20, 2022
setembro 07, 2022
ODE À BANDEIRA Para Jorge Tufic Nosso foco míope, nesse setembro escarlate ‒ com suas horas retintas ‒ igno...
ODE À BANDEIRA
Para Jorge Tufic
Nosso foco míope,
nesse setembro escarlate
‒ com suas horas retintas ‒
ignora a aurora
despreza a lona do circo austral
de estrelas
impregnando o azul da Nação
com a face perdida na orgia.
E, essa, desfigurada
revisita seus mortos
homens
pássaros
plumagens
poesia desgastada.
E estendida a flâmula
sobre o bastião da América
ensaia o remendo
do pavilhão desfeito.
setembro 07, 2022
setembro 04, 2022
Manual de consulta breve sobre a diversidade de homens nascidos no ventre da Mãe Terra Olhos que se abrem inocentes não tardam em ...
Manual de consulta breve sobre a diversidade
de homens nascidos no ventre da Mãe Terra
Olhos que se abrem inocentes
não tardam em cintilar soberba.
Retalham o em torno
lançando farpas no vazio da mente.
Há o entristecido que desperta
e sobrevive como um miserável,
ao som da Morte, sussurrando
seus atropelos de silêncio.
Um outro que resvala no acaso,
se faz vida ̶ atordoado ̶
e sonha em derrubar da janela
o Sol para ofuscar o tormento.
E aquele matreiro precoce
a acumular seus proventos
na peia dos filisteus,
no relento dos desterrados.
setembro 04, 2022
julho 30, 2022
Algumas casas Algumas casas despertam, outras avisam, sem saber, algumas nos entopem o ouvido com sons que queríamos es...
Algumas casas
Algumas casas despertam,
outras avisam,
sem saber, algumas nos entopem o ouvido
com sons que queríamos esquecer.
Algumas casas tem algo de servidão,
deixam tapetes a espreita de nossas urgências.
Algumas, mesmo que inocentemente,
nos seduzem.
Já outras se transformam em arrependimento.
Casas, muitas agora, não dizem nada,
são cicatrizes das cidades -
certezas do absurdo.
julho 30, 2022
julho 16, 2022
Névoa, resto que me permito de lucidez Vê-se que o rio é lento e a violência com que lança o corpo do homem carrega uma...
Névoa, resto que me permito de lucidez
Vê-se que o rio é lento
e a violência com que lança o corpo do homem
carrega uma outra força que não a das águas.
(O poder da corrente é casto)
O cultivo das imperfeições no todo seco,
diz da caligrafia dos arados, dos infortúnios da semente nomeada pelos impuros.
(Como é tênue o equilíbrio das raizes da ingazeira sustendo o barranco)
Névoa, resto que me permito de lucidez,
este caminho traçado no sem rumo
é minha arte, o que possuo nos instantes
de espasmo da consciência.
julho 16, 2022
junho 19, 2022
MULHER AMARGA-VIDA Esse olhar suspeito em meus peitos ― maravilhas americanas ― sob listras nacionalistas se confunde ...
MULHER AMARGA-VIDA
Esse olhar suspeito
em meus peitos
― maravilhas americanas ―
sob listras nacionalistas
se confunde
enquanto, alucinada, rodopio
e visto minha tiara
não sou sexo, não sou foda
sou a sádica do chicote
por fora dourada
e dentro
uma TPM do cacete.
junho 19, 2022
junho 08, 2022
Suicida Autêntico, me interrompo, e quando leres estes versos não saberei de meu êxito. Histeria Recordo esse cort...
Suicida
Autêntico,
me interrompo,
e quando leres estes versos
não saberei de meu êxito.
Histeria
Recordo esse corte,
essas cicatrizes
repetidas,
e a milimétrica
cautela de preservar
espaços vazios.
Desabo
contorcido
na gratuidade
dessa inconsciência
fingida.
Divã (a visão do analisado)
Pago
e me deito
para contemplar
meus vazios.
Pago
e me destruo
para ser aceito.
Pago
minutos lacanianos
de suspense e lágrimas.
Pago,
e sou interrompido
na súbita
solidão do divã.
Divã (a visão do analista)
Eis meu presente:
esse falso (re) pouso.
Fobia social
O abrupto medo
– temor –antecipado
dos olhos,
dos homens.
PARANÓIA
O minuto dividido
em sessenta pressentimentos.
TAB*
Tampar o rosto
eufórico para enxugar
uma lágrima de desespero.
* transtorno afetivo bipolar
TOC*
Não interromper
o ato continuo
de repetir.
* transtorno obsessivo compulsivo
Ansiedade generalizada
Passos apressados,
peito apertado,
– arfante–
no instante
imperfeito,
no contínuo suspiro
que se arvora .
Narcisismo
Malhar os músculos,
dar uma mijadinha e
alisar o cabelo com a mão
suja do pinto.
Sonho
Plantar balas
para brotar drops
SILÊNCIO
"... o silêncio é uma espessura." (Francisco Bosco)
Encontre um tecido, qualquer papiro,
revire essas coisas mirabulosas,
- as páginas ávidas de luzeiros -,
derrame o risco, desfaça-se em crostas.
O mais é o menos desejado - míope
de poesia, ruína, passo inútil,
essa miragem na imensidão, acinte,
avidez da boca, verdade fútil.
Mora, remora, demora e vai,
perseguindo o silvo do ignorado,
pio despido, vazio entornado.
Vadio silêncio, tinta incrustada,
no inaudito desmundo de um nada,
que reveste tudo, ladrilho, estrada.
junho 08, 2022
maio 17, 2022
A sombra do zero O que contorna o início o preenche? E se o vazio diz seu nome, ele resvala ou já é abismo? A luz o desfolha...
A sombra do zero
O que contorna o início
o preenche?
E se o vazio diz seu nome, ele
resvala ou já é abismo?
A luz o desfolha ou não existe
um porquê que deslize?
Pode haver morno na essência
do nada?
O dentro e o fora cabem ou se
perdem na desesperança?
maio 17, 2022
maio 03, 2022
Colírio que tece o dia Olhos cítricos, preguiçosos, em pelo de mel, um deixar-se estar na paz dos meninos de Liverpool (o que não s...
Colírio que tece o dia
Olhos cítricos, preguiçosos, em pelo de mel,
um deixar-se estar na paz dos meninos de Liverpool
(o que não se percebe é a arte dos felinos)
((Na redoma do que se denomina casa,
tem um humano que me serve
e eu lhe devolvo a percepção do sublime arbítrio ))
E os Beatles, são um retrato dentro da vida que se persegue no
tardar dos dias,
Um algo que pulsa e cintila os tons do que se propõe eterno.
(poema inédito)
maio 03, 2022