Mais um episódio da ALCR TV entra no ar com atualidades do mundo cultural, participação dos autores, leitores e telespectadores do Ambiente...


Mais um episódio da ALCR TV entra no ar com atualidades do mundo cultural, participação dos autores, leitores e telespectadores do Ambiente de Leitura Carlos Romero.

Nesta pauta, comentários sobre publicações de Sonia Zagheto, Rejane Vieira e Frutuoso Chaves. Não deixem de assistir até o final.

Contam que há uma loja onde compram e vendem tempo. É uma loja agitada, pois, além de vender, ela também faz permutas. Se alguém tiver um t...


Contam que há uma loja onde compram e vendem tempo. É uma loja agitada, pois, além de vender, ela também faz permutas. Se alguém tiver um tempo sobrando, pode oferecê-lo a outro que precise de mais tempo.

Entrega Fiz dos meus olhos Dois pedaços de uma noite comprida Dois atalhos de um caminho vasto Duas portas escancaradas Sem tranca e...

mbiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milfa valerio


Entrega


Fiz dos meus olhos
Dois pedaços de uma noite comprida
Dois atalhos de um caminho vasto
Duas portas escancaradas
Sem tranca e sem nada
Em posição de espera.

Jovem ainda, Astier Basílio deixou de ser apenas uma promessa, uma revelação, para se firmar como um poeta que reservará boas surpresas ao ...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana livro antimercadoria astier basilio sergio de castro pinto
Jovem ainda, Astier Basílio deixou de ser apenas uma promessa, uma revelação, para se firmar como um poeta que reservará boas surpresas ao público leitor. E boas surpresas a partir mesmo deste “Antimercadoria”, cuja epígrafe bem que poderia ser os seguintes versos de Jorge de Lima: “Se vós não tendes sal-gema, / não entreis neste poema”. E isso por uma razão muito simples: Astier não faz qualquer tipo de concessão no sentido de que a sua poesia se transforme num bem de consumo. Pois, na verdade, torná-la palatável, acessível, seria nivelá-la ao gosto daqueles que só compram livros cuja leitura não ofereça nenhum grau de dificuldade. Poesia-prato-feito. Pior ainda: como alimento já mastigado que a mamãe-índia servia ao seu curumim. E Astier sabe que não convém tratar o leitor como um curumim. E, muito menos, se comportar - na condição de poeta – como uma dadivosa mamãe-índia.

Em 1980, um dos mais importantes músicos brasileiros, que presumia ter 55 anos de idade, morando, há anos, em Pasadena, na Califórnia, onde...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana flavio ramalho de brito maestro moacir santos afrodescendencia afro-brasieiro

Em 1980, um dos mais importantes músicos brasileiros, que presumia ter 55 anos de idade, morando, há anos, em Pasadena, na Califórnia, onde se estabelecera como professor, decidiu realizar uma viagem ao sertão de Pernambuco, para tentar esclarecer uma dúvida que o perseguira até então: quando e em que lugar nascera e qual era mesmo o seu nome. Em depoimento de 1992, para o Museu da Imagem e do Som/MIS, no Rio de Janeiro, ele relata:

Queria poder escrever sobre o Amazonas ou a Amazônia. Quem, no ramo, não curte essa vontade? O rio imenso, primeiro orgulho interno e fama...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana gonzaga rodrigues amazonia incendio pantanal desprezo meio ambiente devastacao floresta amazonica

Queria poder escrever sobre o Amazonas ou a Amazônia. Quem, no ramo, não curte essa vontade? O rio imenso, primeiro orgulho interno e fama universal do Brasil, irrigando o maior bioma do mundo, a Amazônia. Mas bem cedo, menino ainda (e ainda mais por ser menino), o mapa que mandaram o menino pintar de verde de mangueira foi perdendo a alegria, ficando sempre mais escuro e impenetrável.

Fiz do mar morada. A cada mergulho menino, a cada olhar sob o Sol veraneio, cada visita em qualquer estação ou mesmo direção. Embarquei par...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana clovis roberto mar oceano praia

Fiz do mar morada. A cada mergulho menino, a cada olhar sob o Sol veraneio, cada visita em qualquer estação ou mesmo direção. Embarquei para amar o mar ao encontrá-lo aqui e alhures, sob o céu azul, ou sob nuvens, pronto para ser banhado pela chuva. Sal adocicado pelo vento, pela água do céu, pelos coqueiros curvos em deferência ao mestre mar.

Fugindo de Javert, Jean Valjean invade o terreno do convento do Petit-Picpus-Saint-Antoine , na pequena rua Picpus, onde viviam enclausura...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milton marques junior os miseraveis victor hugo les miserables jean valejean

Fugindo de Javert, Jean Valjean invade o terreno do convento do Petit-Picpus-Saint-Antoine, na pequena rua Picpus, onde viviam enclausuradas as bernardinas da adoração perpétua. Lá, ele encontra Fauchelevant, por ele ajudado em uma ocasião anterior (Parte I, Livro V), trabalhando como jardineiro (Parte II, Livros V-VI).

Salvo momentaneamente da perseguição, Jean Valjean precisa arranjar um jeito de sair do convento, para entrar novamente, passando-se por irmão de Fauchelavant, deixar Cosette como interna e ali trabalhar como ajudante de jardineiro. A única forma é sair dentro de um caixão de defunto, que deveria levar o corpo da madre Crucifixion, morta ao raiar do dia.
ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milton marques junior os miseraveis victor hugo les miserables jean valejean
A madre Innocente, superiora do convento, quer enterrá-la por baixo do altar, contrariando a lei. Para isso, ela pede a ajuda de Fauchelevant que, além de jardineiro, é também coveiro. Para que a morta pareça estar dentro do caixão, o plano é enchê-lo de terra. Assim, ficcionalmente, cria-se uma situação que permite Jean Valjean se evadir do convento. Se a madre Innocente decide burlar a lei, Fauchelevant decide burlar a madre, preenchendo o caixão, não com terra, mas com o nosso herói.

Há risco de Jean Valjean morrer sufocado, pois ele deve ser enterrado, com a ajuda do coveiro do cemitério Vaugirard, e depois desenterrado. Não há outra solução, no entanto. Fauchelevant, preocupado com a situação, pergunta a Jean Valjean o que aconteceria se ele tossisse ou espirrasse, quando estivesse dentro do caixão. Nosso herói, sempre determinado, responde-lhe com segurança e clareza: “Quem foge não tosse, nem espirra” (“Celui qui s’évade ne tousse pas et n’éternue pas.”, Parte II, Livro VIII, Capítulo IV).

Esta contextualização é necessária para que entendamos a nossa crítica à série, em 4 capítulos, Les Misérables (França, Itália, Estados Unidos, Alemanha e Espanha, 2000), adaptada do romance de Victor Hugo por Didier Decoin e dirigida por Josée Dayan, tendo no elenco Gérard Depardieu (Jean Valjean), John Malkovich (Javert) e Christian Clavier (Thénardier).

Consideramos essa série uma das melhores adaptações da obra, tendo em vista que o tempo de duração, 6 horas, dá uma boa margem para se contar a história de um romance copioso, como é o caso de Os Miseráveis. Reconhecemos a dificuldade das adaptações e, mais ainda, o fato de que as linguagens romanesca e cinematográfica são diferentes.


Por outro lado, seria purismo de nossa parte esperar uma fidelidade total na adaptação. No entanto, consideramos também que há adaptações de situações que só complicam a trama. A caracterização da personagem Toussaint como homem, na série, é um bom exemplo disso. No romance, Toussaint é uma moça velha, salva por Jean Valjean do hospital e da miséria. Na série, Toussaint é um homem mudo, que esteve na prisão com o nosso conhecido personagem.

Pode parecer implicância criticar essa transformação de uma personagem feminina em uma masculina. Não é. Isto fere a estrutura da narrativa de Hugo. Não esqueçamos nunca que todo texto é uma estrutura e se alguma peça da estrutura é trocada, acaba comprometendo a verossimilhança interna.

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milton marques junior os miseraveis victor hugo les miserables jean valejean
O narrador deixa bem claro o porquê da escolha de Toussaint como doméstica: “une fille [...] qui était vieille, provinciale et bègue, trois qualités qui avaient déterminé Jean Valjen à la prendre avec lui” (“uma moça [...] que era idosa, provinciana e tinha dificuldades no falar, três qualidades que determinaram Jean Valjean a tomá-la consigo.”, Parte IV, Livro III, Capítulo I). Estas qualidades são fundamentais para quem está se escondendo e busca discrição.

No caso de Toussaint como homem, o comprometimento da condição de fugitivo de Jean Valjean é claro. Mesmo que o personagem seja mudo, a sua condição de ex-presidiário e ex-colega de Jean Valjean falam por ele. Além disso ele é forte e careca. O que chamaria mais atenção em Paris, ainda que no resguardo da casa da rue Plumet, uma moça bem madura, com deficiência na fala, e provinciana, ou um homem mudo, forte e careca?

Há, portanto, uma questão estrutural dentro do romance, que não deve ser esquecida: a necessidade de discrição e de anonimato. Jean Valjean se esfuma no ar, encurralado por Javert e seus esbirros, numa rua sem saída, em Paris, galgando um muro enorme, levando consigo Cosette, pulando para dentro do convento Picpus, onde permanece anos sem sair.

É essa fidelidade à estrutura que nos leva a outro episódio dentro da série. Durante uma festividade, uma alta autoridade da magistratura visita o convento e Jean Valjean tem uma altercação sobre justiça, com esse senhor. A cena não ocorre no romance, pois o nosso personagem, como ajudante do jardineiro Fauchelevant, de quem se faz um falso irmão, evita que as pessoas o vejam. Tudo o que Jean Valjean deseja é a obscuridade, o anonimato, nos anos em que Cosette está como interna do convento. Não ser visto ou notado é fundamental para ele, que tem em seu encalço o inspetor Javert, a persegui-lo obsessivamente.


O que nos parece é que o adaptador e o diretor da série projetam no personagem o seu próprio ativismo social. Hugo era um homem reconhecidamente engajado na luta pela justiça, ainda que não fosse necessariamente de esquerda, ele sabia que ter consciência da justiça social não é prioridade de partidos políticos.

Ao longo do romance, o escritor vai disseminando suas ideias contra as injustiças sociais, a ponto de Os Miseráveis ser um dos maiores romances de toda a literatura mundial sobre o assunto, mas não as coloca na boca de Jean Valjean. O personagem é de pouco falar e de muito agir; ele procura ser justo não por palavras, mas pela ação, como faz quando se entrega para salvar alguém de uma injustiça. É o caso do pobre miserável, conhecido como “le père Champmathieu”, confundido com Jean Valjean e que está prestes a ser condenado à prisão em Toulon, o lugar horrível onde nosso herói passara 19 anos, pela tentativa frustrada do roubo de um pedaço de pão.

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milton marques junior os miseraveis victor hugo les miserables jean valejean
Valjean, nessa ocasião, encontrava-se na cômoda posição de prefeito de Montreuil-sur-Mer, atendendo pelo nome de Monsieur Madeleine. Ele se desloca até Arras, a tempo de revelar sua identidade perante o júri de Champmathieu, por não ter como ficar em paz consigo próprio, caso um inocente fosse condenado em seu lugar (Parte I, Livro VII). Se ele tivesse se omitido, estaria livre de Javert para sempre, mas não estaria livre de si mesmo, de sua consciência. Atento, talvez, às lições platônicas, Victor Hugo sabia que a Justiça começa quando a buscamos e a encontramos dentro de nós mesmos.

O pensamento em busca de justiça contido em Os Miseráveis tem três fontes: o amor ao próximo, de Jean Valjean; a obsessão doentia de Javert pelo cumprimento estrito da lei; a ação violenta dos revolucionários da Turma do ABC, simbolizada nas barricadas de 1832, contra o rei Louis-Philippe. Os revolucionários são mortos pelas forças da monarquia; Javert se suicida, diante do conflito de não poder mais perseguir quem lhe salvou a vida. A única busca que resulta em algo é a de Jean Valjean, que aprendeu, desde cedo, a partir da transformação operada em si pelo Monseigneur Myriel, o bispo de Digne, que palavras não tornam uma pessoa justa, mas as suas ações:

“Il sentait qu’il touchait à l’autre moment décisif de sa conscience et de sa destinée; que l’évêque avait marqué la première phase de sa vie nouvelle, et que ce Champmathieu en marquait la seconde. Après la grande crise, la grande épreuve.” (Parte I, Livro VII, Capítulo 3)

“Ele sentia que tocava o outro momento decisivo de sua consciência e de seu destino; que o bispo marcara a primeira fase de sua nova vida e que este Champmathieu marcava a segunda. Após a grande crise, a grande provação.”

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana milton marques junior os miseraveis victor hugo les miserables jean valejean
Victor Hugo
Ações coerentes com o que se pensa e se prega, ainda que em prejuízo de si mesmo. Discursos belos, eloquentes, inflamados e idealistas caem bem em estudantes revolucionários, como Enjolras. Jean Valjean fala pouco, como já dissemos, pouco discursa, mas age o suficiente para livrar uma cidade da miséria, um inocente da cadeia, uma órfã da exploração e um jovem da morte.

Nosso herói relutara em ser prefeito de Montreuil-sur-Mer, para não chamar a atenção sobre si. Por insistência da população, que o tinha como um bom administrador aceitou, com reservas, o cargo. De imediato, atraiu a atenção de Javert, prontamente desviada pelo caso do père Champmathieu. Jean Valjean deu a sua lição de coragem e justiça ao se revelar, mas também aprendeu que não deveria mais chamar a atenção sobre si, se quisesse ficar longe das garras inflexíveis de Javert. Jamais, portanto, ele iria altercar com um magistrado.

Quem se evade não tosse e nem espirra...


Milton Marques Júnior é doutor em letras, professor, escritor e membro da APL

Buscar assunto na falta de assunto é uma das maiores artimanhas de quem escreve. Certa madrugada lembrei de um tempo em que assinava coluna...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana linaldo guedes falta de assunto redacao de jornal labuta diaria jornalismo

Buscar assunto na falta de assunto é uma das maiores artimanhas de quem escreve. Certa madrugada lembrei de um tempo em que assinava coluna fixa no caderno de cultura do jornal A União.

Ano de 1962. Do ambiente colegial do Liceu Paraibano, ingressava eu no Curso de Letras da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana professora raquel nicodemos costa ufpb curso de letras virginius da gama e melo churrascaria bambu

Ano de 1962. Do ambiente colegial do Liceu Paraibano, ingressava eu no Curso de Letras da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Paraíba. O Liceu já era um colégio aberto, diferente dos demais, geralmente de orientação religiosa, mas entrar na FAFI, como a chamavam os estudantes, abria uma fonte de expectativas para mim. Estava curiosa de tudo, ainda que a timidez me mantivesse quieta à espreita dos novos momentos.

O pensador francês Guy Debord classificou de “sociedade do espetáculo”, a forma como nos comportamos na atualidade. Vivemos o fenômeno da es...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana rui leitao
O pensador francês Guy Debord classificou de “sociedade do espetáculo”, a forma como nos comportamos na atualidade. Vivemos o fenômeno da espetacularização, o interesse em transformar o rotineiro em show, espetáculo. É a teatralização do cotidiano, somos atores e expectadores dessa encenação permanente apresentada nas nossas vidas.

Há quem não acredite, mas é prazeroso provar dos ventos das amenidades. Não tememos perigos das viagens siderais, não precisamos dos observ...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana saulo mendonca marques cliche frase pronta frase estereotipada esmeros gramaticais

Há quem não acredite, mas é prazeroso provar dos ventos das amenidades. Não tememos perigos das viagens siderais, não precisamos dos observatórios de trânsito espacial, dos radares, por sinal sempre deficientes e inseguros nos nossos céus. Com esses ventos, voa-se com segurança, sem riscos nem turbulências.

Nunca mais os pirilampos ou vagalumes infestaram de meigas luzes, pisca-piscas naturais, as nossas noites. Falta a muitos o interesse por e...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana jose leite guerra vaga-lume pirilampo flores olhar indiferença natureza

Nunca mais os pirilampos ou vagalumes infestaram de meigas luzes, pisca-piscas naturais, as nossas noites. Falta a muitos o interesse por eles que ainda faíscam em lugares ermos, salpicando suas pobres emanações de humildes claridades.

Uma lenda é sussurrada há quase um século pelas ruas e casas de Paris. Até agora, só as mulheres a conheciam. Contavam para as filhas e net...

ambiente de leitura carlos romero literatura brasileira jornalista sonia zagheto clube do livro lenda sparis  clube de leitura e escrita amor prazer ler recitar escrever sophia verlaine

Uma lenda é sussurrada há quase um século pelas ruas e casas de Paris. Até agora, só as mulheres a conheciam. Contavam para as filhas e netas, fazendo-as jurar segredo. Conto-lhe agora, mas não a repasse para os descrentes ou os que duvidam das coisas puras que ainda existem no mundo. A dúvida quebra o encanto e a história se perde. Pois bem, agora que está avisado, sente-se aqui ao meu lado e ouça.

Cecília Por mim passam tantas vozes tantos silêncios tantas canções e essa menina que há em cada coração de leão. Por...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana antonio morais de carvalho


Cecília


Por mim
passam tantas vozes
tantos silêncios
tantas canções
e essa menina que há
em cada coração de leão.


Por mim
passam noite e dia
passam recuo e ousadia
passam por mim passam
de enlaçadas mãos
o breve gozo, a lenta agonia.


Mas nesse tudo passar
também passo eu por mim
e ao fim de cada passagem
passo a ser mais só, mais mim,
retendo apenas ao fim
imagens      imagens     imagens.




Mariana


No abril de meus dez anos,
minha rua foi devastada
por um horizonte marítimo.

Era Mariana.

A errar, o cosmos começava,
e eu, da gravidade, me soltava.
Até então, meu coração
era um beco sem saída;
agora, a vida se rompia:
irrompia o outro
– vertigem e voragem.

No início da Noite de Natal,
sem avisar,
Mariana abandonou-me a cidade,
despediu-me a infância.

Toda vez que ouço o “Noite-feliz”,
acena-me oblíquo Noel,
e desembrulho por dentro
o pretérito presente...


Performance


Escolheu seu melhor ângulo.
Com pudicícia,
Evitou os parcos versos seus.
Disse Bandeira, Cecília, Drummond
– estrelas da vida inteira e sua Pasárgada.
Pronunciou os melhores silêncios.
Conseguiu. Seduziu.

Uma mulher, uma noite.

Acordou.
Sóbrio, inútil, verdadeiro.
Ressaca de tanta traição a si mesmo.
Certeza de que nenhuma Estela
Seria a Estrela da vida inteira.


Antonio Morais Carvalho é professor e poeta

Agora, quando a Professora Ângela Bezerra de Castro assume a presidência da Academia Paraibana de Letras, recordo o poema de Carlos Drummo...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana jose nunes academia paraibana de letras eleicao presidencia apl angela bezerra de castro

Agora, quando a Professora Ângela Bezerra de Castro assume a presidência da Academia Paraibana de Letras, recordo o poema de Carlos Drummond de Andrade que fala de “um certo modo de ver”, para definir o perfil dela como leitora, escritora, poetisa e estudiosa da literatura brasileira.

Uma paisagem nunca foi tão decantada pela arte como “A Ilha dos Mortos". Inspirado na visão de Pontikonisi, o belo conjunto de rochedos...

ambiente de leitura carlos romero germano romero a ilha dos mortos morte na arte pintura requiem rachmaninoff arnold bocklin salvador dali  beleza na morte chopin marcha funebre berlioz faure mozart britten durufle

Uma paisagem nunca foi tão decantada pela arte como “A Ilha dos Mortos". Inspirado na visão de Pontikonisi, o belo conjunto de rochedos que emerge do Mar Mediterrâneo, perto de Corfu, na Grécia, o pintor suíço Arnold Böcklin criou-lhe 5 versões, ao longo de 6 anos, no final do século 19. As pinturas impressionaram o mundo artístico, entre especialistas, empresários e colecionadores. A última criação foi encomendada em 1886 pelo Museu de Belas Artes de Leipzig, onde ainda se encontra.

ambiente de leitura carlos romero germano romero a ilha dos mortos morte na arte pintura requiem rachmaninoff arnold bocklin salvador dali  beleza na morte chopin marcha funebre berlioz faure mozart

A Ilha dos Mortos também influenciou outros pintores, como Salvador Dalí, notadamente em seu trabalho “Lado Oeste da Ilha dos Mortos”. E o alemão Michael Sowa pintou o que seria a “sexta versão", de Böcklin, uma espécie de paródia. Outros se sucederam e até o final do século XX surgem mais duas versões: A do arquiteto, pintor e cenógrafo Fabrizio Clerici, uma tela de mesmo nome (1974) e outra chamada "Homenagem a Böcklin", em 1977, concebida por seu conterrâneo, Hans Giger.

A Ilha continuou a produzir inspirações. No teatro, a peça "The Ghost Sonata" (August Strindberg ,1907), foi concluída com a singular paisagem. No cinema, o produtor Val Lewton usou-a em cenários dos filmes “I Walked with a Zombie”
ambiente de leitura carlos romero germano romero a ilha dos mortos morte na arte pintura requiem rachmaninoff arnold bocklin salvador dali  beleza na morte chopin marcha funebre berlioz faure mozart
e “Isle of the Dead" (1945). Além de outras produções cinematográficas, a tela esteve presente até na TV, em um dos episódios da série “Pretty Little Liars”, escrita por Sara Shepard.

Na literatura, versões da pintura emergiram em romances como “O Mundo de Cristal” de J. G. Ballard, “Port Matarre”, de Roger Zelazny, e “The Warlord Chronicles”, de Bernard Cornwell.

Foi na Música que A Ilha dos Mortos se glorificou em belos poemas sinfônicos. Primeiramente com o romântico Heinrich Schülz-Beuthen celebrando-a em composição homônima. Em seguida, vieram o romeno-sueco Andreas Hallén, com "Die Toteninsel", em 1898, e Dezso d'Antalffy, músico húngaro, com mais um poema, de mesmo título, em 1907.

Em Rachmaninoff, a criação de Böcklin definitivamente se consagra no mais grandioso poema: A Ilha dos Mortos, Opus 29, de 1909, no qual está transcrita visionária travessia em direção ao monumento no meio do mar.


A morte encontrou nas artes plásticas um paraíso de estética e harmonia. As cinco versões de Böcklin, influenciadas pelas paisagens bordadas de rochas entre túmulos e ciprestes que resplandecem no Mediterrâneo, estão longe de remontar a qualquer ideia de sofrimento. A ilha é de tal formosura que os mistérios de sua primeira versão, em preto-e-branco, encantaram profundamente o músico Rachmaninoff.

Compositores célebres moldaram contornos de extrema beleza no que interpretaram como o fim da vida.
Pensar ser possível haver beleza na morte não parece algo simpático. Mas há no fenômeno inexorável, destino de todos, inevitavelmente imbuído de conotações dramáticas, um lado a ser visto e refletido a exemplo do fabuloso rastro de luz que uma estrela deixa fulgurar até nossos olhos, mesmo depois de morta, há milhões de anos...

Ainda que seja biologicamente natural, a extinção da vida corpórea não é encarada com a alegria e a ternura que emocionam o “vir a mundo” de um novo ser. Muito menos quando se parte de forma “precoce”, uma vez que nem todas filosofias explicam o motivo da vida material ser tão curta até mesmo em recém-nascidos…

No entanto, a inspiração humana não encontrou limites para extravasar seu sonho em torno da morte por meio da arte ao longo da história. Decerto poeta algum conteve-se diante da crisálida ou do casulo que abriga a transformação da lagarta para voar em nova vida.
ambiente de leitura carlos romero germano romero a ilha dos mortos morte na arte pintura requiem rachmaninoff arnold bocklin salvador dali  beleza na morte chopin marcha funebre berlioz faure mozart
Nenhum fenômeno representa tão bem os ciclos de renovação vital da existência como a metamorfose protagonizada por mariposas e borboletas.

Na poesia, na literatura, na música, na pintura, a morte foi recriada e decantada sob múltipla expressividade. Com tristeza, emoção, dramaticidade, júbilo ou desolação houve notável eloquência em torno do ocaso nas obras de muitos artistas e escritores. Embora tenha pintado a morte com devassa e feérica alegoria, a beleza da construção literária no “Eu” de Augusto dos Anjos, por exemplo, emerge do velado sentido de transcendência à matéria inevitavelmente fadada a se decompor. O que nos faz entender que havia mais fé do que desesperança à sombra do tamarindo...

Talvez na música a morte haja obtido o seu mais abrangente espaço. Compositores célebres não pouparam a imaginação e a criatividade para moldar contornos de extrema beleza no que interpretaram como o fim da vida. Ravel colocou tanta poesia na “Pavana para uma infanta defunta” que a obra soa mais como ode do que elegia. Nos réquiens, composições baseadas na liturgia do funeral, Mozart e Fauré imprimiram momentos de rara delicadeza romântica. Verdi, Berlioz e Brahms impuseram perfil mais solene, envolvendo suas missas com grandiloquente beleza. Já Duruflé foi capaz de mesclar os traços antigos do canto gregoriano com romantismo e majestade em seu formoso réquiem.


Esta forma musical destinada a enriquecer o ritual fúnebre evoluiu durante séculos, celebrando a morte com música, prece, escrituras sagradas, na intenção de que através do enlevo melódico as almas fossem merecidamente recebidas no paraíso. Também serviram para homenagear os mortos e datas relativas à sua memória. Até se libertarem da liturgia estruturando-se entre os textos em latim e poemas contra a guerra, como no Réquiem de Britten, que se configura, para alguns, como funeral à insensatez humana.

Em muitas outras composições eruditas a morte teve seu canto de beleza. Foram missas, marchas fúnebres, sinfonias, cantatas, poemas sinfônicos e outras maneiras de representar o sentimento que ecoa com mais profundidade nos âmagos da razão. Na sinfonia “Eroica”, Beethoven deu ao segundo movimento um caráter de exéquias, decerto dirigidas ao fim de sua admiração por Napoleão, com quem tristemente se decepcionou. Chopin inseriu na segunda sonata para piano a marcha fúnebre que se tornou a mais conhecida entre tantas outras peças que nos motivam a ver beleza na morte.

Felizmente, temos com que aliviar os receios diante de uma “viagem” que foi retratada com excelência capaz de nos fazer acreditar que há algo de belo em sua essência.


Germano Romero é arquiteto e bacharel em música

O Brasil, já não sei, mas a cada dia tenho dado micropassos em busca de uma autolibertação. E um dos primeiros movimentos é refletir sobre ...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana mariana sanfer independencia do brasil autenticidade sinceridade legitimidade franqueza conveniencia

O Brasil, já não sei, mas a cada dia tenho dado micropassos em busca de uma autolibertação. E um dos primeiros movimentos é refletir sobre meu alinhamento: o que penso, o que sinto e o que faço. Tem sido profundamente libertador permitir-me ser honesta quanto a isso. Quantas vezes passamos por uma coisa, sentimos outra e ainda fazemos outra?

Certo dia, um amigo me ofereceu um pedaço de doce de goiaba, pois queria esvaziar logo o recipiente para reutilizá-lo. Não gosto muito de goiabada, e o pedaço que ele me oferecia era bem grande.

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana mariana sanfer independencia do brasil autenticidade sinceridade legitimidade franqueza conveniencia
Eu poderia simplesmente ter sido honesta, agradecido e ter dito não. Mas, em vez disso, aceitei aquela fatia imensa que eu não iria comer com satisfação, e sim por obrigação de haver aceito.

PENSEI em aceitar porque não queria desapontar a pessoa que me fez a oferta. Mas eu não SENTIA vontade de comer a guloseima. Mesmo assim, minha AÇÃO foi a de pegar para mim o que eu não desejava.

Foi então que me veio a lição! Resolvi oferecer o doce a uma criança, Ariel (8 anos). Comilona que é, perguntei se ela queria aquela goiabada. Ela, que ia passando, parou, virou-se para mim e me perguntou por que eu estava lhe oferecendo o doce? Eu expliquei que havia aceitado de um amigo "por educação", mas que, na verdade, não gostava. E sabe o que ela me disse imediatamente?

— Por que você aceitou uma coisa que não gosta e que não quer? Quando a gente não quer algo, a gente fala assim: "não quero, obrigada"!

Um exemplo simples de como nos desorganizamos internamente, e de como colecionamos pequenas prisões dentro de nós mesmos.

Eu não sei o Brasil, mas a minha libertação é diária, contínua e minuciosa. Todos os dias eu procuro declarar a mim mesma minha independência e libertação.

“Libertação
Libert(ação)
Libertador
Liberta(dor)
Dor liberta
Jaya"



Mariana Sanfer é educadora perinatal, doula e terapeuta holística

Precisas ter coragem de confiar na tua sabedoria interna, e prestar mais atenção no que ela te diz. Tens um “deus interior” que tenta, sem ...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana ana paula cavalcanti ramalho otimismto esperanca superacao caminhos da vida

Precisas ter coragem de confiar na tua sabedoria interna, e prestar mais atenção no que ela te diz. Tens um “deus interior” que tenta, sem descanso, se comunicar contigo.

Teu dia a dia é turbulento?

Outro dia, vi o anúncio de um lindo prédio. Sim, digo lindo porque estava todo iluminado com fachadas imponentes que impressionavam. As jan...

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana alaurinda de oliveira padilha romero saudades intuicao mediunica culto jardim

Outro dia, vi o anúncio de um lindo prédio. Sim, digo lindo porque estava todo iluminado com fachadas imponentes que impressionavam. As janelas de esquadrias de alumínio galvanizado, com vidros por toda parte, pareciam blocos de gelo.

O jardim era ornamentado com cactos e seixos brancos. Tudo muito clean, minimalista, para dar a sensação de amplitude ao espaço. Os apartamentos mais altos eram os mais caros, porque estavam mais próximos do céu. Lembravam gaiolas aéreas.

No hall de entrada, os elevadores pareciam naves espaciais. Não vou mais contar porque já estou me sentindo mal, só de pensar nas alturas.

ambiente de leitura carlos romero cronica poesia literatura paraibana alaurinda de oliveira padilha romero saudades intuicao mediunica culto jardim
Fui para o nosso pequeno jardim respirar um pouco de ar puro, com cheiro de terra molhada. Conversei com as flores, às quais agradeço todas as manhãs. Tirei as sandálias e, com os pés na grama, abracei o Flamboyant que plantamos juntos, Carlos e eu. A grande árvore estava toda vestida de vermelho, contrastando com as boas-noites brancas que floresciam por entre a grama. Tudo de graça para nos presentear.

Que maravilha da natureza! Não precisei de elevadores para subir tão alto e desfrutar este céu tão lindo e imenso que estava dentro de mim. Olhei para cima e agradeci a Deus.

Nesse exato momento, ouvi a voz de Carlos: "Lauinha, meu anjo, vamos entrar. Lá dentro também temos o nosso paraíso".

Entramos. Carlos, em seu gabinete, começou a digitar aquela crônica. E eu, em nosso quarto, apanhei meu violino e toquei aquela música!


Alaurinda Padilha Romero é violinista