Morei em Recife durante algum tempo e o que mais ouvi foi a frase: não pode... é perigoso. Chegou o carnaval, que eu adoro, e tudo não podia. Ver a saída do Galo da Madrugada... não pode, muito perigoso. Acompanhar os blocos... perigoso. Olinda? Que doida você é?
O carnaval acontecendo e eu cercada de “não podia”. Lembrei que eu fora, durante anos, rodeada de nãos e minha alma rebelde falou baixinho em meu ouvido – o que você pode perder? Eu que vivi chorando perdas, perder o que mais?
Min. Cidadania
Relutante, meu amigo embarcou comigo naquela pequena aventura até o centro de Recife. Um táxi nos levou até certo ponto e depois a pé, atravessamos uma das inúmeras e magníficas pontes sobre o rio Capibaribe. Por todo lado, pessoas fantasiadas, sons de carnaval, brilho, cheiro de milho cozido, perfume barato, xixi.
Thaysa Meirelles
Alceu Valença invade o palco, cheio de luzes, cantando:
“Voltei Recife foi a saudade que me trouxe pelo braço.
Eu quero ver novamente vassoura na rua abafando
Tomar umas e outras e cair no passo”.
Nesse momento vejo que nada é melhor do que estar no meio daquele povo, simulando uma dança, sendo levada de um lado ao outro num completo abandono. Suor derretendo meu corpo, coração acelerado e uma alegria enorme que só consegue sentir quem se deixa levar pelo momento, pela felicidade em fazer parte do frenesi popular.
Alceu cantando uma “ciranda” e a roda se formando... ”onda que vai, onda que vem eu viajei no olhar dessa morena”... há uma calma, o povo se liga pelas mãos e numa roda gigante vamos rodando naquela praça. Felicidade, agora meu nome é esse.
Fora do Eixo
Perigo? Que nada. Tenho observado que o perigo ronda mais a quem tem medo dele. Não sei se era minha insensatez ou minha maluquice, mas não vi perigo em nada, nenhuma ameaça.
Fora do Eixo
Vamos no Bacurau, diz meu amigo. Não sabia o que era isso. São os ônibus do final de noite que circulam pela cidade. Paramos em um ponto lotado. Pessoas dormindo na calçada, bêbados oscilando entre as pessoas, prostitutas se ofertando, e eu, na minha inconsequência, adorando a aventura.
Fora do Eixo
Overmundo
Pesarosa, chego em casa e vou deixando uma trilha de confetes pelo chão. Meu corpo se arrasta de cansaço e minhas roupas exalam um misto de cheiros, cerveja, perfume barato...
Talvez, poucas pessoas entendam, mas me sentia completa.
Felicidade, realmente esse era meu nome.