Para onde foram os pistões, trombones e tambores da minha e de tantas outras mocidades? Cadê as batucadas que puxavam os blocos de sujos i...

Velhos carnavais

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Para onde foram os pistões, trombones e tambores da minha e de tantas outras mocidades? Cadê as batucadas que puxavam os blocos de sujos improvisados e reforçados pelos amigos retirados da cama, fosse qual fosse a ressaca? O que fizeram do papangu, da ala ursa? Nos domingos de Carnaval, o pilarense Joãozinho, dono do Corredor, costumava chamar os músicos contratados para o Clube, a fim de animarem a manhã e a tarde dos convidados. Na verdade, de todos aqueles que se pusessem a caminho do engenho, onde nasceu o romancista José Lins do Rego, para a festança gratuita, no alpendre dos fundos.

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Acervo ▪ LF Reis
Os músicos sentavam-se no tampo elevado de uma cisterna e todo mundo dançava em torno de uma mesa redonda e repleta de cachaça e batidas preparadas a capricho, estas últimas, por dona Montinha. A uma delas dávamos o apelido de “engana moça”. Parte das meninas deixava-se envolver pelo sabor adocicado, até ser tarde demais para a recuperação do equilíbrio e do juízo. Sei de alguns casamentos forçados ao cabo de percursos entre as batidas da dona do Engenho Corredor e certos poços do Rio Paraíba, testemunha, ali perto, do quanto as misturas da cana de cabeça (a da primeira extração do alambique) com limão, maracujá, abacaxi ou jenipapo eram capazes de abrir mentes e pernas.

Chegasse em bons trajes ao Carnaval de Seu Joãozinho, o sujeito era erguido no ar e atirado num grande tacho de ferro (antigo utensílio para o fabrico de mel) com água pela boca, suja como a consciência de Judas. Depois disso, a música, a cachaça e os amigos aplacavam as revoltas e compensavam a humilhação.

À noite, a festa era no clube, com ingresso pago. Serpentina, confete, fantasias e lança-perfume animavam os bailes que varavam as madrugadas. E as marchinhas? Ah, as marchinhas... Em janeiro, elas já estavam no rádio para o aprendizado dos foliões.

Havia as eternas, aquelas repetidas de Carnaval a Carnaval, com o encantamento da primeira vez em que foram ouvidas. Em verdade, eram as mais requeridas.
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Acervo ▪ LF Reis
Quando o cansaço começava a bater no lombo dos casais, a orquestra atacava de “Vassorinha” e o salão pegava fogo.

Dona Sílvia, invicta do alto de seus 40 anos, abandonava o recato e caía no frevo. Solteirona, impunha respeito. Ninguém nunca deu conta de que houvesse tido um namoro sequer em qualquer fase de sua longa existência. Apenas no salão, dava asas à desinibição que lhe era tão imprópria. E não precisava ser Carnaval. Fazia-se presença requisitada em qualquer dança. Era um pé de valsa, como se dizia naqueles tempos. Depois de adulto, eu não conseguia vê-la sem lembrar dessa história que a seu respeito escreveu José Augusto de Brito. Numa inauguração, em praça pública, quando a Banda da Polícia iniciou o Hino Nacional, um matuto dono de terras, de quem não guardei o nome, seu par constante nos bailes de fim de semana, tirou-a para dançar. Pagava ela, então, o preço da boa fama.

Mas falávamos de Carnaval. Ganhei meu primeiro lança-perfume por volta dos doze ou treze anos. Meti-me em duelos com os meninos da minha idade e gastei tudo em menos de meia hora. Quanto arrependimento. No Carnaval seguinte, mais sabido, já não mais procurava atingir os olhos dos amigos. Em troca disso, buscava o pescoço das meninas. Era gastança de melhor proveito. Não era não?

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  1. Passaram todos os filmes sobre os carnavais que conheci e brinquei, sempre liderando as "batucadas" com um selecionado repertório de centenas de músicas, algumas hilárias, outras "pornográficas", mas o povo gostava.

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  2. E, por cá, em João Pessoa.
    Tínhamos os desfiles dos clubes de frevo - Boêmios Brasileiros, A União em Folia, os 24 Bichos, Esquadrilha V e o Lira Brasileira (este vindo de Santa Rita) que desfilavam em alguns bairros, que tinham seu carnaval próprio, como Jaguaribe, Cruz das Armas e Roggers e, finalmente, entravam na grande disputa, em desfile na Av. Duque de Caxias.
    Como não haviam os pruridos de hoje, tínhamos a grande troça satírica - E. T. L. F., coordenada pelo Major Ciraulo, que vinha de Bayeux, com a força de suas diatribes.
    E, para completar, as grandes noitadas dos muitos clubes, que faziam a alegria de seus sócios, nos mais diversos recantos da cidade.
    E tome lança-perfume!

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