Termino a leitura da crônica de Gonzaga Rodrigues com as lembranças dos canários e galos-de-campina do meu Tapuio, que pousavam no mulungu, voavam para as folhas do pé de coco-catolé e terminavam na pitombeira. Sempre em algazarra e saltitantes, gestos estes que não me saem da lembrança.
Algum tempo depois, jovem com trajetos de caboclo brejeiro, andava pelas ruas desta cidade olhando o chão. Detinha-me no aconchego das praças. Repousava o pensamento escutando pássaros. Admirava as árvores e as flores que soltavam perfume. As estátuas de estranhas personagens levavam-me a lugares distantes.
Estátua do Barão do Rio Branco na praça homônima, em João Pessoa (PB) PMJP
Trabalhando ali perto da praça, embriagado pelas paisagens e descobertas do mundo literário que a cidade proporcionava, jovem recém-chegado do interior, eu admirava a grandiosidade daquela figura de olhar estático, logo me dando conta de quem se tratava. Em outra praça, ali perto, em frente ao Palácio do Bispo, levantava os olhos para admirar a imponência da escultura do presidente da Paraíba Álvaro Machado.
Tempo depois, identifiquei as duas personalidades das velhas estátuas.
Confesso que demorava observando a pequena herma de Augusto dos Anjos no Parque Solon de Lucena, à época escondida entre os carros e barracas. A lenta
Busto de Augusto dos Anjos no Parque Solon de Lucena (João Pessoa-PB) Ajmcbarreto
Durante as caminhadas, no retorno do trabalho ou alimentado pelas lembranças do meu tempo de adolescente, sorumbático, no desespero, arrolava pensamentos que desapareciam quando, escutando os arroubos de pardais, sossegava o ímpeto de lançar a rede para capturar um afago.
Despercebido, mantinha-me ao pé de Augusto. Vassalo a se curvar diante de sua poesia, apesar de lembrar uns poucos versos que caíram no gosto do leitor comum, como este: “A minha sombra há de ficar aqui!”
Quantas vezes, que não foram poucas, à boca da noite, caminhando sorrateiro pelos caminhos de Tambiá, topava com bêbados — porque não existia tanta gente mendigando pelas ruas — usando a estátua como se fosse uma moita de mato.
Augusto dos Anjos CC0
Quando a Paraíba revelou Augusto para o mundo, era o tempo em que os heróis de outras paisagens ganhavam espaço nas mentes dos paraibanos. Chegou a hora do poeta que cantou a dor da alma, dando uma dimensão de grandeza à poesia, receber por parte do poder público aquilo que seus leitores já fizeram: o justo reconhecimento da sua grandiosidade.
Esse tardio reconhecimento em forma de estátua, do tamanho do seu merecimento, que possa ser observada à distância, marcando os caminhos e encruzilhadas da vida deste luminar da poesia universal.
PMJP
Em tempos passados foram erguidas estátuas de personagens da História, de caras enfarruscadas, de cujas trajetórias pouco sabemos.
Quanto ao poeta Augusto, que fez da sua a nossa dor, ainda aguarda a imortalidade visível no mármore: uma estátua do tamanho de sua importância para a Poesia Universal.
Nunca mais assistimos ao espetáculo dos anônimos pássaros a pousar em sua cabeça. Aves dolorosas, “como vulto lúgubre”, mutilavam o poeta que agonizava com os pássaros agourentos a rodar. Xô, passarinhos!
👆🏽 Leia a crônica de Gonzaga Rodrigues mencionada pelo autor



























