A vida é um constante fluxo de experiências, um rio que corre, levando consigo memórias e aprendizados. Ao olharmos para o passado, muitas vezes encontramos um labirinto de decisões que nos moldaram, algumas das quais podem nos parecer estranhas ou até mesmo inadequadas à luz do que somos hoje. É fascinante como as nossas escolhas, feitas em momentos específicos
Maria do Carmo P.C. gostava muito de assistir ao seriado de TV, “Os Waltons” exibido em terras tupiniquins, que se não me falha esta combalida
memória, na década de 1970. Pois bem, ao final de cada episódio viam-se
as luzes do casarão da família irem se apagando, uma a uma enquanto
alguém, provavelmente a caçula da família, Elizabeth Walton (Kami Cotler) ia
dando seu boa noite: “ Boa noite John Boy, Boa noite Mary Ann, etc, etc...”.
Maria do Carmo achava aquilo uma fofura. Reclamava por se chamar Maria
do Carmo e não Mary Ann. Que nome mais sem futuro esse meu, dizia ela.
Mary Ann, sim que é nome de gente, completava. A partir de então quis só
ser chamada pelo nome da irmã de John Boy, e assim ficou conhecida entre
familiares e também entre os mais chegados. Esse é só o começo da
história.
mundo tá perdido. Minha avó também já dizia isso, enquanto coava café e benzia a testa com o dedo molhado. Eu nem sabia o que era inflação, mas sentia na barriga, quando a carne sumia do prato. Só vinha feijão e arroz sem mistura. Agora eu sei. É o mercado. É o governo. A miséria ensina coisas que a escola não explica. “Não existe almoço grátis”.
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O homem não busca mais ajuda de Deus, busca da IA, da Alexa. Hoje todo mundo quer milagre, mas não se ajoelha. Só posta. Dança. Faz story. No domingo igreja lotada. Dízimo no cartão. Aleluia no Pix.
Tudo o que é tocado pelo humano, um dia se corrompe. Na segunda passa a perna no próximo. Eu também já passei a perna. Também sou filha de Deus. Também sei ser ruim e sou ótima nisso. Engulo o choro, engulo sapo, mas às vezes explodo por nada. Me pego falando sozinha. Que saudade de uma tarde sem notificação. Será que a vida tá amarga? Ou o mundo ficou sem açúcar? Amor virou artigo de luxo. “... por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos se esfriará.
Minha avó fazia sopa com o que tinha. mas sobrava abraço. Hoje sobra ego. Falta emprego. Eu só queria um pedaço de bolo e um café quente. 30 reais. Trinta? Garçom, traz um refrigerante! Dizem que o ser humano evoluiu. Mas ainda mata. Por território, por ego, por ciúme. Não me assustam as porradas da vida, eu tenho medo das tapinhas nas costas. Tempos difíceis. Nem o algoritmo ajuda. Eu só queria nascer herdeira. Comer sem engordar, ter quem cozinhar, ter alguém pra conversar, presencialmente.
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Não corro mais atrás de ônibus. Nem compro sapato que machuca. Só vou onde tem cadeira pra sentar, nem faço questão de fazer parte de grupo. Será que virei uma velha ranzinza... ou só evoluí? Segunda volto à dieta, à academia. Comi pão com mortadela escondida. Comi também a maçã, tomei um chop. Já tô no pós-pecado. Desculpa, Adão. Derrubam pessoas e ainda sorriem da queda. Todo mundo em crise. Tarja preta. Acordo otimista. Durmo ansiosa. Não assisto mais essa droga de jornal. Caos. O mundo sempre foi confuso. Só ficou mais rápido. Agora tem App para tudo. O trabalho não acaba quando bate o ponto — continua no grupo do WhatsApp. Eu silencio, confesso. Agora tem de tudo: coach, mentor, pseudosmilitantes... Mas o circo só terá espetáculo se você der palco ao palhaço. Tem gente pedindo esmola na calçada. Gente fazendo vaquinha na internet. Gente surtando no mercado. Por causa da margarina. Ontem quase chorei no caixa. Não pela margarina, quebrei minha unha de gel quando fui ajudar alguém, que nem disse obrigado.
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Seja gentil, não imbecil. Se não se posicionar, alguém falará no seu lugar. Algumas pessoas que estão ao nosso lado são as que mais nos limitam, não nos incentivam. Como diz meu pai: A vida é uma escola, casa dia uma lição diferente. Em busca de alguém que me ame, mas deixe meu psicológico em paz. Meu ex mandou mensagem. Outra vez. Sempre quando tô quase esquecendo. Reaparece. Tipo boleto. Gosto de homem safado, não de macho escroto. Fui ignorar. Cliquei sem querer. Deu visualizado. Agora já era. Tô presa! “Pane no sistema alguém me desconfigurou”: Pix. Chip. QR code, senha Digital. Liberdade? Durmo bem. Acordo travada. Guerra no Oriente. E eu aqui pensando em uma vaga na manicure. “Penso, logo existo”. Às vezes não quero nem pensar, já basta o que já penso sobre mim. Na internet todo mundo tem alguma opinião formada sobre tudo. Desculpa, Raul. O Brasil não tem povo, tem seguidores. Tive um sonho estranho: Tiradentes arrependido. Cleópatra influencer e Jesus cancelado na primeira postagem. Acordava sorrindo. Vergonha alheia: assalariado se passando por aristocrata. Odeio passar pano.
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Jogo tudo no ventilador. Detesto o capitalismo. Meu sonho? Viajar aos Estados Unidos... de primeira classe. Demaquilando a sociedade: Como economizar, se meu salário continua o mesmo? Velhice não é “a melhor idade”. Nem toda criança é anjo, nem todo idoso é um fofo. E maternidade? Está longe de ser um conto de fadas. Cheia de fotos, mas a vida vazia. Tenho 100 mil seguidores. E uma vontade danada de excluir meu perfil. Sumir. Ficar boa, vendo TV, mas até para assistir filme tenho que abrir uma conta, aceitar os termos, assinar streaming. Liberdade? “Sorria, você está sendo filmada”. E olhe que nunca gostei de reality show. Será que eu sou a Sofia? Como ela, tenho a sensação de estar sendo observada. Não por olhos humanos — mas por algo maior, invisível. Meus passos parecem vigiados, minhas escolhas antecipadas. O celular sabe o que vou fazer antes mesmo de eu decidir. Assim como Sofia, começo a desconfiar da realidade. Será que estou mesmo no controle da minha vida? Ou será que sou só mais um personagem de um roteiro que não escrevi? O mundo sempre foi um caos. Só que antes era idade da pedra. Agora é era digital.
A angústia da folha em branco atinge até os mais experientes escritores. Quem está de fora do processo acredita que escrever é muito fácil para quem está em constante exercício. No entanto, mesmo nesse espaço que ora escrevo, por vezes fico tateando as palavras, às cegas, como se desejasse senti-las em suas diversas possibilidades do dizer. Há anos lecionando Língua Portuguesa, nas aulas de produção textual vejo com frequência o sofrimento daqueles que demoram a colocar a primeira
O poeta é como o navegador que, no mar, observa as estrelas e as nuvens sem desprezar as ondas. Pelas estrelas se guia para avançar pelas águas mais profundas e realizar sua pescaria e, nas ondas do mar, observar a poesia que exala, carregada pelo vento. Através das nuvens e das estrelas, descobre as tempestades, e as ondas e o vento formam um consórcio que o conduz à terra firme.
É um engano confundir a felicidade com a mera obtenção de resultados. A felicidade não está numa meta, mas no estado em que nos sentimos quando a alcançamos. Tem mais a ver com o sentir do que com o obter. A ansiedade pela conquista de um resultado pode ser tão perturbadora quanto o tédio
No meio do cotidiano apressado, onde celulares pipocam notificações e a correria se torna um segundo idioma, surge a eterna pergunta: o que é de fato, o bem viver? A canção que toca ao fundo, quase inaudível, parece sussurrar que a resposta está nas pequenas coisas, mas como as palavras antigas dos filósofos poderiam iluminar essa busca?
A tragédia — enquanto forma estética e expressão filosófica da condição humana — é o resultado da tensão entre os impulsos vitais e os sistemas morais que buscam dar sentido e ordem à existência. Quando uma moral absolutista se impõe como estrutura fixa de valores, desconsiderando a diversidade e complexidade da experiência humana, inaugura-se o terreno do trágico. A infelicidade, nesse contexto, não se reduz a um evento catastrófico, mas revela um conflito insolúvel entre princípios éticos, pulsões humanas e as limitações da razão normativa.
Fosse na Inglaterra ou na França, por exemplo, um jornal completar cem anos de existência até que seria normal. Na civilização, sabemos, as coisas costumam durar e as tradições são cultuadas com orgulho nacionalista, no bom sentido da palavra. Lá ninguém pensaria em derrubar o prédio do Parlamento inglês ou o Palácio de Versalhes para colocar no lugar um empreendimento imobiliário qualquer. Mas aqui, nestes trópicos ainda bárbaros, talvez eternamente bárbaros, é diferente. A impermanência é a lei da tribo e a precariedade de tudo, uma fatalidade que se aceita naturalmente, como se fosse coisa de Deus (ou do diabo). De modo que um jornal
Largo da Carioca (RJ) Biblioteca Nacional
brasileiro completar um século de vida, estando ainda em pleno vigor e prometendo mais cem anos pela frente, é de fato um acontecimento. Um grande acontecimento, para dizer melhor.
Um amigo me indaga sobre a crônica publicada há três semanas em que trato do meu apego a João Pessoa, em detrimento de outras cidades, a exemplo de São Paulo.
O problema não é das metrópoles, é meu, inteiramente meu. Em verdade não andei muito, mas das poucas vezes em que me achei fora de casa, achei-me, também, fora de mim. Não me encontro em qualquer das situações, mais cômoda e animada que pareça. A vontade é voltar, entrar na ruazinha estreita e sinuosa de Cruz das Armas, medir-me com o muro baixo, a casinha em que, andando a pé, avista-se o telhado de lodo e heras.
Vivi um momento extraordinário, na manhã desta quinta-feira (24jul2025). Em tamanha conexão, no cenário visível, eu e o cronista-jornalista Gonzaga Rodrigues; no invisível, as memórias do nosso ilustre escritor e político paraibano José Américo de Almeida. Memórias perpetuadas no seu coração e expressadas nas suas emoções. O local: óbvio, o Museu Casa de José Américo, situado na hoje Fundação que leva o nome de seu patrono e sua residência, onde morou por cerca dos seus últimos trinta anos finais. Precisamente situada "entre o mar e a colina" (JAA), na orla do paradisíaco Cabo Branco.
Ontem, ela resolveu arrumar um dos seus armários. Bem aquele que fica no outro quarto, o da procrastinação, o que ela olhava e falava: depois arrumo.
Mas dessa vez foi diferente. Pegou firme e mergulhou nas pilhas de lençóis, fronhas, toalhas. Mesmo sendo prática, reconheceu que ali havia excesso e que, por mais afeto cada uma das peças trouxesse, não havia necessidade daquilo tudo.
No último dia 27 de julho, foi celebrada a memória litúrgica de São Tito Brandsma (1881-1942), um frade camelita holandês, que enfrentou o regime nazista e morreu no campo de concentração de Dachau. Canonizado pelo papa Francisco em 2022, ele é o primeiro jornalista profissional elevado à honra dos altares pela Igreja Católica.
Li Mensagem de Fernando Pessoa. Senti falta de uma personagem histórica: Dom Egas Moniz IV, o Aio. Sem ele não teríamos a Dinastia de Borgonha, quiçá Portugal. Mas o certo também é que todos que descendem dos primeiros colonizadores portugueses descendem de Dom Egas Moniz, o Aio. Inclusive eu, por diversas vezes, por suas duas esposas.
Escrito em 1914, é um dos mais destacados sonetos de Augusto dos Anjos. Pela temática atemporal, pelo enfoque único, pela estrutura perfeita, é um poema eterno que os séculos hão de repetir, como repetem os sempre atuais camonianos sobre as mudanças da Fortuna e os enganos do Amor.