Um dia perguntaram a Rabi’a al-Adawiyya, uma das maiores místicas do sufismo no século VIII: — Se você tivesse asas, voaria ao P...

Se você tivesse asas, para onde voaria?

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
Um dia perguntaram a Rabi’a al-Adawiyya, uma das maiores místicas do sufismo no século VIII:

— Se você tivesse asas, voaria ao Paraíso?

E ela respondeu:

— Não. Eu iria além do Paraíso, até Deus. Porque não busco a recompensa, mas sim o Amado.

Esse tipo de amor é chamado em árabe de "ḥubb li-llāh", ou "amor pelo Próprio Deus", e é o centro da mística sufi, particularmente nas obras de Rabi’a.

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
Alessandro Cancian
Na vida, dependendo da época e do sentimento, desejamos voar para diferentes lugares.

Quando somos jovens, queremos conquistar o mundo, experimentar o novo, buscar aventuras. Mais tarde, porém, o coração deseja apenas se refugiar, descansar e se reconectar com a sua essência.

Como o vento muda de direção, assim também mudam os nossos impulsos de “voar”, de migrar internamente para outros estados de alma: mudar de profissão, de estilo de vida, de crenças, de afetos. Cada sentimento, seja saudade, inquietação ou dor, nos impulsiona a novos caminhos, reais ou imaginários.

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
Md Akbar Ali
Desejar “voar para diferentes lugares” é uma metáfora de nossa busca por plenitude, significado e pertencimento.

Os desejos humanos não são estáticos, sempre mudam. Contudo, qual o destino seguro? Afinal, mesmo com asas, podemos nos perder...

Intuitivamente, desejamos voar para onde há paz, silêncio e beleza, talvez para um campo florido ao amanhecer, para uma montanha envolta em neblina ou mesmo para o mar aberto sob o pôr do sol. Lugares onde a alma possa respirar fundo.

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
@prismatically
Cada ser humano é um eterno viajante em busca de sentido, de paz e de contentamento, que procura alçar voos através de sonhos, projetos, relacionamentos, conquistas. Mas quantas vezes, ao chegarmos nesses lugares da vida, ainda experimentamos um vazio interior?

Nenhum abrigo terreno é tão estável quanto o amparo divino. Nenhuma realização exterior substitui o acolhimento da Presença de Deus em nosso íntimo, pois a paz verdadeira não está fora, mas dentro de nós, quando descobrimos e cultivamos a nossa ligação com o Criador. Essa ligação é o voo mais sublime, é o voo da alma que confia em Deus, que o ama, que se entrega a Ele.

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
@SageSistas
Voar até Deus é buscá-Lo em oração, no serviço ao próximo, no perdão, na resignação, na esperança. É voltar à Fonte, procurando conscientemente esse retorno, mesmo em meio às duras provas do mundo.

Nos momentos de dor, de dúvida ou desespero, "voar até Deus", buscar a Sua Presença em oração, no serviço ao próximo e na prática do bem, é o melhor e mais seguro plano de voo.

Voltar para Deus não é uma fuga da vida, mas um impulso de fé que nos move a trabalhar, perdoar, recomeçar e amar. E o melhor disso é saber que, quando sentimos necessidade de Deus, é porque Ele já está conosco.

sufism crenca deus rabi a al-adawiyya
@mindveg
O voo até Deus acontece pelo silêncio interior, pela renovação de atitudes e pelo amor ao próximo. Voar em busca Dele, do “Amado”, no dizer de Rabi’a al-Adawiyya, é o movimento mais certo e necessário da alma humana; é o destino buscado por quem confia, mesmo sem ver, por quem ama, mesmo sem ser amado, e por quem serve, mesmo sem perspectiva de recompensa.

Foi a mesma poetisa e mística sufi que abriu esta crônica que também escreveu uma das mais belas orações já feitas pela mão humana:

"Ó meu Deus, se Te adoro por medo do Inferno, queima-me nele. Se Te adoro pelo Paraíso, exclui-me dele. Mas se Te adoro por Ti Mesmo, não me negues a Tua Beleza Eterna."


COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também