"Mestre, meu mestre querido! Coração do meu corpo intelectual e inteiro!”, estes versos são de um poema antológico do português F...

Um abraço de corpo inteiro

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"Mestre, meu mestre querido! Coração do meu corpo intelectual e inteiro!”, estes versos são de um poema antológico do português Fernando Pessoa, passando-se por Álvaro de Campos. Não sabemos quem é o mestre, mas o poeta revela dedicação que ultrapassa os limites do amor de pai, de tão grande que é essa veneração.

Na leitura deste poema, lembro do aniversário de Gonzaga Rodrigues, “meu mestre querido!”. Um mestre recolhido na minha orfandade literária, depois que perdi Nathanael Alves, em período quando este me identificava os caminhos que apontavam para a Poesia. Ambos sempre foram pacientes com minha lerdeza no aprendizado.
Nunca recearam estender a mão ao aprendiz que manejava a enxada na limpa do roçado e que tinha as mãos ágeis na debulha dos grãos, mais do que juntar as palavras para construir a frase. São mais de quatro décadas retirando dele o melhor para construir os alicerces de minha literatura, sem sair de Serraria nem tão pouco de Arara.

Aproximando-se dos noventa anos, o bom mestre continua sentindo o fervor das auroras das manhãs brejeiras de Alagoa Nova, da brisa campinense nos poemas que há mais de sete décadas trouxe para o Litoral, sem se magoar com a escassez do pão e do vinho.

Ao escutar a voz de Álvaro de Campos, ambos, Gonzaga e eu somos escravos “de tudo como um pó de todos os ventos”. Ergo as mãos pedindo suprimento para minhas criações literárias porque ele está perto de mim, que continua a me trazer as palavras que Nathanael não mais pronuncia, e também os conselhos do pai que ficou distante nas sombras dos cajueiros em Serraria.

“Meu mestre e meu guia!” – disse o poeta português -, és “seguro como um sol fazendo o seu dia”, que é claro como o dia que tudo mostra. “Meu mestre, meu coração não aprendeu a tua serenidade.
A. David Diniz
Meu coração não aprendeu nada”. Meu coração não aprendeu a conter a fúria das ondas da alma, nem suportar a raiva dos ventos.

Como acontecia em relação a Nathanael, a tua casa sempre esteve com as portas e janelas abertas para mim. Tuas mãos sempre me abençoaram. Tuas palavras me ensinaram a caminhar por entre flores e pedregulhos, com a certeza de que o amanhecer carrega em si um alvorecer, mesmo “na ilusão do espaço e do tempo”.

Meu mestre aniversaria, com ele aniversaria a crônica, o manuseador das artes gráficas, um defensor da paisagem antiga da cidade, um colecionador de atos magnânimos de solidariedade. O senhor da crônica. Um escritor que o laurel da profissão não o afastou do convívio dos amigos, nem a idade o transformou em velho caturra, pois não carrega a tristeza de quem vive sozinho, como lastimava São Paulo.

A celebração do aniversário de Gonzaga é para todos seus amigos e admiradores, um estímulo soberano de energia e de revivescência literária. Em mais de sete décadas de convívio com a arte da palavra e com os livros, nunca abandou a terra e a brisa de sua Alagoa Nova, de onde vêm inspiração e consolação. Sem nunca ser miúdo no pensar e no agir em favor do bem comum, pacificamente, ele carrega legião de admiradores a desejar saúde e paz.

A. David Diniz
Defensor terno da terra e dos ventos, ele ensina-nos que cada gesto seja para a salvação da vida, para elevar as atividades humanas. Dele recolhemos que toda a espécie do saber, a comunhão com a Natureza e com a Arte, fortificam o espírito, fortalecem o vigor criativo, mesmo que seja no entardecer da vida. Para ele, um abraço de corpo inteiro.

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