VARIAÇÕES SOBRE UMA PEDRA
E o peso, essa discórdia, essa falta de disciplina, o terço desfiado a esmo na comichão dos dedos sem paz, convulsos, na luta inglória E o limo que floresce, delicado e célere, na expectativa de nosso primeiro passo.
E o peso, essa discórdia, essa falta de disciplina, o terço desfiado a esmo na comichão dos dedos sem paz, convulsos, na luta inglória E o limo que floresce, delicado e célere, na expectativa de nosso primeiro passo.
Vítor Nogueira
A sombra tem seu peso
sob o sol.
RETORNO AO RASCUNHO DO MUNDO
Desperta, homem, vê a grandeza do seu nome e o Não, imposto ao seu destino. A página leve não tem a tessitura do seu caminho e o que lhe resta é o estampido ou um pilar qualquer que te convide ao abismo.
Desperta, homem, vê a grandeza do seu nome e o Não, imposto ao seu destino. A página leve não tem a tessitura do seu caminho e o que lhe resta é o estampido ou um pilar qualquer que te convide ao abismo.
Vítor Nogueira
BERÇO DOS OSSOS
Aqui começa o fim de tudo O desafio da carne, esse farrapo rubro sobre cada espantalho, é sustentar o peso de fazer-se sombra. O carrilhão do tempo, o continuo tributo, o toque entre os ombros sem rosto, as sirenes no silêncio proibido, imagens invadindo tudo, corrompendo o absurdo, e a impossibilidade de deixar-se fora da febre compartilhada dos justos. (Há uma vulgaridade nas sementes; somente em seu desencontro recordamos o comum de brotar na solidão.) Não sei que olhos me olham, ou perseguem, e recostam em minha sombra na paz da tarde.
Aqui começa o fim de tudo O desafio da carne, esse farrapo rubro sobre cada espantalho, é sustentar o peso de fazer-se sombra. O carrilhão do tempo, o continuo tributo, o toque entre os ombros sem rosto, as sirenes no silêncio proibido, imagens invadindo tudo, corrompendo o absurdo, e a impossibilidade de deixar-se fora da febre compartilhada dos justos. (Há uma vulgaridade nas sementes; somente em seu desencontro recordamos o comum de brotar na solidão.) Não sei que olhos me olham, ou perseguem, e recostam em minha sombra na paz da tarde.
Vítor Nogueira
SONETO PARA A INCERTEZA
E se os pés trocados na subida no horizonte vivo da vertigem fosse o rumo certo dessa vida de busca e perda, sem céu, sem origem Na imagem perdida em cada foto no suporte do poste, arrebol das nuvens, em plumas, como um horto de desejos, de enfim um portal no espelho do mar, uma miragem de rumo pra cada hora incerta que disperse do olho as fuligens do sem sentido, sem azul, das perdas, da consciência, a casa da linguagem, que nos faz testemunhas e presas.
E se os pés trocados na subida no horizonte vivo da vertigem fosse o rumo certo dessa vida de busca e perda, sem céu, sem origem Na imagem perdida em cada foto no suporte do poste, arrebol das nuvens, em plumas, como um horto de desejos, de enfim um portal no espelho do mar, uma miragem de rumo pra cada hora incerta que disperse do olho as fuligens do sem sentido, sem azul, das perdas, da consciência, a casa da linguagem, que nos faz testemunhas e presas.
Vítor Nogueira
TODA POESIA SERÁ CASTIGADA
Os filhos foram criados sob os pés de Cristo, e eram muitos os desconhecidos e os néscios, e eram muitos os sem abrigo, os de nome talhado na lápide na véspera do destino. E seriam assim mesmo nominados filhos, do cordel do desassossego, mártires pulverizados em algo denominado história. (Regaço e cueiro e o pouco que aquece o destemperado clima da existência.)
Os filhos foram criados sob os pés de Cristo, e eram muitos os desconhecidos e os néscios, e eram muitos os sem abrigo, os de nome talhado na lápide na véspera do destino. E seriam assim mesmo nominados filhos, do cordel do desassossego, mártires pulverizados em algo denominado história. (Regaço e cueiro e o pouco que aquece o destemperado clima da existência.)
Vítor Nogueira
A PARTE METADE
A parte metade, de todo inteira, (esse canto chão de meu ócio) é a música que visto, meu quarto de despir mentiras. Parte partida, fosca pela sujeira do repisar o pó; fosso cavado para assentar a paz. (metade é medida sem desespero, recanto de passagem, cobertor dos atropelos.) A força entre os dedos estreitados se desfaz em metades asas que seguem o acaso dos rumos de esquecer do tempo. (Metade não enrosca, desata, não recorta, se dissolve na leveza incerta.) A parte metade é derradeira dúvida e certeza primeira do redemoinho. É o nome sem a máscara – este invólucro de estar – que aflora consumindo as manhãs.
A parte metade, de todo inteira, (esse canto chão de meu ócio) é a música que visto, meu quarto de despir mentiras. Parte partida, fosca pela sujeira do repisar o pó; fosso cavado para assentar a paz. (metade é medida sem desespero, recanto de passagem, cobertor dos atropelos.) A força entre os dedos estreitados se desfaz em metades asas que seguem o acaso dos rumos de esquecer do tempo. (Metade não enrosca, desata, não recorta, se dissolve na leveza incerta.) A parte metade é derradeira dúvida e certeza primeira do redemoinho. É o nome sem a máscara – este invólucro de estar – que aflora consumindo as manhãs.
Poemas do livro O mais Eu de todos em mim
vive me desconhecendo ■ de Vitor Nogueira e Jorge Elias Neto, disponível no site da Editora Cousa.
Nestes tempos de dicotomia nas paixões
Fernando Pessoa, o assumido poeta do EU, sabia que o olhar necessita de um objeto, daquilo em que se depositam o desejo, a angustia, a dor, a febre – e, é claro, a esperança e tudo que a circunda. Inclua nesse rol, a compaixão. Eis a questão tão inequívoca quanto necessária: como, situado neste mundo, pode o poeta abster-se do real e ignorar o que lhe cerca? A dupla Vitor Nogueira – Jorge Elias Neto encara esse real e, cada um com seu olhar – complementares, diga-se -, observa que o mundo não é exatamente o que se mostra: ele é mais intenso, mais vil e mais desigual do que imagens e palavras possam expressar. Daí a necessidade de compadecer-se e agir. A ação em “O mais EU de todos em mim vive me desconhecendo”, num certo sentido, confirma o português Pessoa: a realidade faz com que nos reconheçamos de todos os modos possíveis, e a poesia e a fotografia (ambas de uma beleza crua e essencial, definitiva) podem nos levar muito além, plenas de luz e vida, impelindo-nos a reconhecer que fazemos parte de um mundo que, ao menor descuido, tende a nos abominar e a nos rejeitar.
Estamos, todavia, todos juntos. E, felizmente, para o nosso consolo, com Vitor e Jorge nos guiando.
(Francisco Grijó - escritor)
Nestes tempos de dicotomia nas paixões
Fernando Pessoa, o assumido poeta do EU, sabia que o olhar necessita de um objeto, daquilo em que se depositam o desejo, a angustia, a dor, a febre – e, é claro, a esperança e tudo que a circunda. Inclua nesse rol, a compaixão. Eis a questão tão inequívoca quanto necessária: como, situado neste mundo, pode o poeta abster-se do real e ignorar o que lhe cerca? A dupla Vitor Nogueira – Jorge Elias Neto encara esse real e, cada um com seu olhar – complementares, diga-se -, observa que o mundo não é exatamente o que se mostra: ele é mais intenso, mais vil e mais desigual do que imagens e palavras possam expressar. Daí a necessidade de compadecer-se e agir. A ação em “O mais EU de todos em mim vive me desconhecendo”, num certo sentido, confirma o português Pessoa: a realidade faz com que nos reconheçamos de todos os modos possíveis, e a poesia e a fotografia (ambas de uma beleza crua e essencial, definitiva) podem nos levar muito além, plenas de luz e vida, impelindo-nos a reconhecer que fazemos parte de um mundo que, ao menor descuido, tende a nos abominar e a nos rejeitar.
Estamos, todavia, todos juntos. E, felizmente, para o nosso consolo, com Vitor e Jorge nos guiando.
(Francisco Grijó - escritor)