Duinho tem cinco anos, vem da cidade com os pais e a irmã maiorzinha para aventuras como essa no povoado onde reinam os avós, e, sem noção alguma do perigo, avança no imenso e fundo espelho d’água tendo uma cabaça como boia e na sua cabecinha “o meu barquinho”.
O romance tem linguagem própria? Tem, pois não. É romance, na leitura de caixeiro como eu, que pega e solta, pega e solta, toda a narração mais extensa desde que a linguagem não atrapalhe. Que você nem se lembre que está lendo, só vivendo. Seja “A Carne” de Julio Ribeiro, citado por Chico Viana a pretexto de uma rápida cena de cama, que nem cama era, e já numa hora (hora final do romance) em que todas as ambições civilizadas de poder ou de mando, pisando num charco de misérias, seria engolida quase inteira pela tromba d`água que desabaria sobre a Baixa do Mel, a pequena cidade que se liberta da geografia concreta, real e vizinha de Bananeiras para girar em qualquer terra ou tempo onde sobrevivam esse gênero de artimanhas.
O leitor precisa saber mais claramente de que se trata e nada melhor, nesse gênero de cozimento, que o mestre que sabe o ponto do mel na caldeira final de apuração, Chico Viana:
“O livro, que é um misto de ficção, jornalismo e registro sociológico, inicia-se com o afogamento do menino Duílio num açude do povoado. Esse evento deflagra uma onda de violência contra indivíduos cujo `pecado` é serem diferentes do que se convencionou chamar de normal. Eles pagam por não se enquadrarem nos ditames de uma sociedade tradicionalista e avessa a tudo que destoa dos valores que, bem ou mal, ela consagra.”
Morre a criança que mãos salvadoras, sendo negras, são renegadas e impedidas de tocar nela. Era um dia de farra, de bebedeira no chuveirão, o rabo de pavão d`água largado pela sangria a fazer a costumeira libação da turma da pesada. Botam a culpa no negro Beto e desembesta o massacre culminado com o estouro da barragem como uma punição sobre pecadores e inocentes da Baixa do Mel.
Livraria do Luiz