Não sabiam que Alberico ganhou na loteria? Pois, dormiu entre bugalhos e amanheceu na agência para conferir o sorteio. Fora-lhe favorável. O senhor está passando mal? Caiu pálido e trêmulo. Trouxeram-lhe um café esperto. Quando foi recobrando o sentido e reorganizando as forças, abriu um sorriso, saiu dançando rua afora, amassando a paisagem, deglutindo os favos oferecidos pela novidade. Está totalmente biruta. Quem diria? Alberico que fazia bicos e comia em cabresto curto com a família grande, agora ficara fora do mundo, atacado, quem sabe, por essas esquisitices e transtornos.
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Desapareceu no oco do pau. A mulher e os cinco meninos, os vizinhos, os amigos de jogo, até o cachorro magérrimo chorava um ganido agoureiro com saudade do dono. Uma calamidade. A Polícia foi chamada a cair na procura do homem desaparecido. Mas, à exceção de quem escreve agora para contar o sucedido e o leitor, ninguém, àquela altura, sabia da versão verdadeira. Muitos levantavam suposições comprometedoras. Ele fugiu com alguém. Ou está quebrado, não pode pagar o que comprou e se furou pelo mundo para escapar de um processo judicial. Poderia ter ficado suspenso, temporariamente, das suas chamadas faculdades mentais, suponhamos. O trajeto foi a beira da linha do trem? Ninguém vira. Ou algum ônibus em direção ao Recife? Aqui tinha parente: um velho tio que morava sozinho em Encruzilhada.
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Quando todos não mais tinham esperança alguma, surgiu Alberico. Em frangalhos. Entrou calado, se deitou no meio da sala da choupana, e ergueu a cartela da sorte comprada na loteria. Foi isso, disse. Errei na conferência. Com a vista curta confundi um dos algarismos. Tive medo de ser furtado. Estive não sei onde. Rasgou com fúria o papel, único comprovante de sua riqueza que jamais viria. Voltou a despachar na bodega: ao assinar um documento, veio a notar que ele era “rico” só no nome: Alberico.