Viajar dá trabalho, e o turista é sobretudo um obreiro do seu lazer. Tem que providenciar os documentos; juntar os remédios que não pode deixar de tomar, se for o caso (depois de certa idade, sempre é o caso); fazer e conduzir as malas não só aos aeroportos como também aos locais onde vai se hospedar. Tudo isso exige um preparo físico que só é compensado pelo alívio espiritual que a quebra da rotina e a ida a outros lugares devem lhe trazer.
O problema é quando a esses encargos acrescentam-se imprevistos que tornam aborrecido o que devia ser apenas trabalhoso. Passamos por pelo menos dois deles. O primeiro foi um enorme atraso no aeroporto do Recife – não inferior a duas horas, o que chegou a assustar parte dos passageiros.
Chun-Hung Eric Cheng
Alguns acreditaram, outros não. Pelo tempo que a desinfecção durava, devia haver na tal cabine uma diversidade de cepas microbianas capaz de contaminar toda a nave. Especulava-se que o problema era outro (ligado, talvez, a falha mecânica), e a empresa não queria nos informar.
Hanson Lu
O segundo imprevisto foi mais grave, pois gerou no pequeno grupo de que participávamos apreensão e prejuízo financeiro. Também esteve ligado à aviação, mas de um modo diferente. Vamos lá: fazia parte do nosso roteiro uma conexão em Madrid antes de chegarmos a Porto. Vimos, enquanto esperávamos o embarque para a capital da Espanha, nossas malas serem postas no bagageiro existente na parte inferior da aeronave – malas sem lacre, que na última hora uma funcionária nos impediu de acomodar dentro do avião.
Hans
O fato é que precisávamos ir ao hotel para fazer o check-in e mudar de roupa. Mas que roupas? O sumiço das malas acabou representando um pequeno acréscimo ao que gastamos com a viagem, mas pelo menos ganhei pijamas e cuecas novos. Até pensei depois em guardá-los para filosoficamente relembrar que, na vida, aos momentos bons podem se intercalar os ruins.
As bagagens apareceram, enfim. Amarotadas, manuseadas além do que deviam, mas chegaram. Tratamos logo de abri-las para ver se continham tudo
Celyn Kang
Mas estava tudo lá. Ou quase tudo. Faltavam... os pirulitos. Denise tinha envolvido em plástico-bolha alguns pirulitos para os nossos netos. Deles restavam apenas dois. Minto; havia um terceiro com a hastezinha cortada (haveria nisso algum simbolismo?).
Não consegui entender por que, entre tantos objetos de maior valor, resolveram levar justamente os pirulitos. Pelo menos, caso tenham se decepcionado com o que havia no pacote, não ficaram a chupar o dedo... Consolo-me pensando que, dos males, o menor. Terrível seria se tivessem trocado as guloseimas por drogas. Ou por joias não declaradas. Eu seguramente não estaria aqui para contar a história.