Maria das Graças Santiago "um olhar poético sobre a melhor idade..." Não tive a crise dos trinta anos. Nem a dos quarenta, dos cin...

Nova fase



Maria das Graças Santiago

"um olhar poético sobre a melhor idade..."

Não tive a crise dos trinta anos. Nem a dos quarenta, dos cinquenta ou dos sessenta. Ao contrário, lépida e fagueira não me preocupava com a idade. Mas agora ela me chega com pompas e circunstâncias e com todos os seus achaques.

Já fui borboleta, deixando a crisálida para trás e volteando graciosa entre as flores. Depois virei beija-flor, adejando rosas e cravos dos jardins, aspirando seus perfumes e, por osmose pegando a beleza de cada inflorescência. Em seguida fui canário, canário belga, com canto mavioso e trinados mágicos cativando a tantos quantos me ouviam. Consciente da minha afinação eu gorjeava feliz acompanhando os passos ternos dos namorados ou o riso que vinha das praças. Agora? Agora tudo isto passou e entrei na fase do “con-dor”. Dói-me tudo com variações de tempo e de espaço. Um dia são as costas, outro as pernas, mais adiante o joelho e por aí vai num interminável e ostensivo desfile de pontos doridos.

- Você precisa fazer exercícios, é voz geral.

Faço Pilates quase todos os dias, mas não é suficiente. Aconselham-me caminhadas, hábito que tive durante a vida toda. Agora entenderam que devo também praticar musculação. É bem verdade que não tenho feito nada que demande muito esforço físico. Estou com fastio de me movimentar, o que não acontece em relação à comida para a qual o apetite está cada vez melhor. Colesterol, triglicerídeos, glicose todas as taxas enlouqueceram de uma só vez e resolveram num movimento orquestrado praticar uma total inversão alterando-se todas. Não sei o motivo.

Anos atrás, pessoas da minha idade ficavam em casa lendo, tricotando ou conversando com os vizinhos. Ninguém lhes exigia uma atuação de atleta nem exames de laboratório perfeitos como se tivessem vinte anos. Agora não se tem mais vizinhos para conversar porque mal conhecemos quem mora ao nosso lado. Em compensação tem televisão e celulares que alienam por igual os moços e os velhos. Ops, velhos não, é proibido falar assim. Em seu lugar apareceram os da “melhor idade” que são em tudo igual aos velhos de antigamente só que teimam em não reconhecer o fato. Ao que penso está explicado o porquê da minha crise nesta nova fase.


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