Outro dia assistia ao premiadíssimo filme Argo, de Ben Affleck. O diretor me parece supervalorizado entre seus pares, ao passo que a pe...

'Dance the night away', o ocaso de um gigante

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Outro dia assistia ao premiadíssimo filme Argo, de Ben Affleck. O diretor me parece supervalorizado entre seus pares, ao passo que a película é um tanto inferior aos comentários grandiloquentes que recebeu. Mas o fato é que uma das cenas do longa retrata uma festinha de bastidores do cinema, na típica Califórnia dos anos setenta. Ao fundo, como trilha musical, Dance the Night Away, que fez que com eu retirasse do limbo uma banda que há muito não ouvia: o quarteto californiano de hard rock Van Halen.


Esse grupo setentista sempre praticou o que muitos entendidos do meio musical passaram a chamar de big rock, que depois influenciou uma série de bandas dos anos oitenta (Winger, Warrant, Poison, Ratt etc), também herdeiras do glam rock dos mesmos anos setenta (Queen, T-Rex, Slade), com suas longas madeixas penteadas, muita maquiagem na cara e produtos musicais comerciais e de ocasião.

Acontece que o Van Halen tradicional nunca foi de ocasião. Comercial, claro que sim! No entanto, foi uma banda que, assim como o universal Hitchcock fez em seu meio – o cinema -, soube, ainda que sendo palatável, impor-se ao cenário musical pop da época e operar revoluções que poucos percebiam.

A banda Van Halen em sua formação nos anos 70: Alexander Van Halen (baterista), David Lee Roth (vocalista), Michael Anthony (baixista/vocalista) e Eddie Van Halen (guitarrista).
E isso vai muito além da técnica do tapping na guitarra, que já era utilizada há turbilhões de anos por músicos de jazz em guitarras acústicas ou violões. Eddie Van Halen, porém, utilizou o estratagema com tanta propriedade que até parecia ser mesmo o “pai da criança”, quando ouvintes embasbacados se arrepiaram ao ouvir Eruption. Seu extremo virtuosismo musical chegou até a chamar a atenção de ninguém mais ninguém menos que Michael Jackson. Eddie é autor do solo mais famoso de todos os tempos em música pop: como convidado de Quincy Jones, produtor do álbum mais vendido da história da música, o Thriller, ele surge em Beat it, um dos maiores sucessos de Michael, em um solo classudo de sua infalível guitarra “Frankenstrat”.


A formação clássica da banda tinha os irmãos Van Halen (como o sobrenome não nega, nascidos na Holanda) ocupando guitarra e bateria, um exímio baixista chamado Michael Anthony e nos vocais a presença magnética de David Lee Roth, um maluco egocêntrico que nunca negou ao rock'n'roll tudo o que ele sempre foi: arriscado, divertido, zombeteiro e descompromissado. Suas letras às vezes mostravam o lado barra pesada da Califórnia, com gírias, palavrões e insinuações. Sua improvável dança com saltos oriundos, segundo ele, do kung fu, ainda fazem muita gente saudosista rir.


Com apresentações antológicas, a voz rouca bluesy de David, riffs espetaculares e solos surreais de guitarra (em algumas performances de menos de trinta segundos, Eddie usava quatro, cinco ou mais técnicas), o Van Halen operou uma pequena revolução no universo do hard rock e da música pop, unindo o formato da tradicional canção comercial a experimentações musicais e fusão de estilos em suas canções – Somebody get me a doctor, Spanish Fly, Push comes to shove, Top Jimmy, Jump e Drop dead legs são exemplos perfeitos disso. O clipe politicamente incorreto (logo abaixo) da canção Hot for teacher foi um dos marcos do início da linguagem da MTV, nos anos oitenta.


Depois, a velha história das bandas de rock se repete: muito álcool, drogas e discussões; Roth sai da banda; entra o veterano Sammy Hagar (ex Montrose e carreira solo); e o som do grupo fica cada vez mais comercial e menos alinhado aos ouvidos mais exigentes. Essa foi a fase em que o grupo ganhou dinheiro aos borbotões: a voz arranhada e aguda de Hagar era mais potente que a de Dave e conseguia acompanhar quase todas as notas que Eddie criava, o que fez com que o grupo lançasse mão também de algumas baladas xaroposas.


Depois de mais desentendimentos, Gary Cherone (ex Extreme) assume o posto dos vocais por apenas um disco. O grupo para por muitos anos, dão as contas do experiente Michael Anthony, e Eddie nem parece ser a sombra do que era, afundado em álcool, cigarro e com sérios problemas de saúde. Ensaiam voltas com Hagar que nunca se concretizam e, depois de milhões de anos hibernando, fazem um revival da formação histórica, com o retorno de David aos vocais (com uma voz irreconhecível ao vivo – o peso da idade não nega isso) e o filho de Eddie tocando baixo. O que mais importa agora, mais do que nunca, são os dólares. Os mais nostálgicos, no entanto, ainda continuam dançando noite adentro...

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