Interessante é que Ridley Scott sempre foi um diretor do tipo “ame ou deixe-o”. É possível gostar, de um modo avassalador, de alguns de seus filmes. De outros, no entanto, detesta-se de uma maneira quase doentia. Por sorte, um dos maiores filmes da história do cinema (ouso dizer), Blade Runner, o caçador de androides, entra para a lista dos filmes geniais do diretor inglês.
Tudo ocorreu, porém, de forma bastante tardia: orçada em 28 milhões de dólares, a película não foi bem acolhida em seu lançamento original, tornando-se um retumbante fracasso financeiro. Este thriller, futurista e retrô ao mesmo tempo, se desenrola em
Adaptado do romance de Philip K. Dick Do androids dream of electric sheep?, de 1968, por Hampton Fancher e David Peoples, a trama levou catorze anos para chegar ao cinema, em 1982. Somente após o lançamento da versão do diretor, uma década depois (1992), a concepção visual espantosa e estilizada do futuro finalmente foi reconhecida como uma obra-prima do gênero ficção-científica, aclamada pelo público e pela crítica. Nem mesmo assim, Ridley se deu por satisfeito: ainda lançaria a versão Director’s cut em 2007.
Era o filme que tinha tudo para dar errado e, de fato, no ano de seu lançamento, deu: Harrison Ford não se entendia com sua parceira de cena Sean Young (estonteante em todas as cenas) e nem com Ridley. A equipe de filmagem também se irritou por demais com o penoso cronograma de produção e a rigidez do diretor. Por uma ironia do destino, este foi o filme em que todas as tensões criadas no set de filmagem acabaram por gerar o parto de uma obra-prima.
Os temas abordados por este triunfo visual do cinema é extenso e aberto a muitas discussões e polêmicas: a distopia tecnológica ácida (um futuro não muito distante e opressor) em que Deckard (também se discute se ele mesmo seria um replicante) é enviado para “aposentar”, ou seja, executar os androides que retornaram à Terra em busca do seu criador — Tyrrel (personagem de Joe Turkel) —, envolve discussões filosóficas, existenciais, religiosas e culturais, permeadas por um notável senso de ação e suspense, no qual o porvir da humanidade é mostrado como um processo em que a “globalização” de nosso planeta é algo negativo, amoral e sombrio. Cult absoluto.