Imagine-se em Genebra, depois de uma esticada de 12 horas desde a italiana Florença em busca da bem-amada. Ponha-se de mãos dadas com ...

Paraíba, mon amour

paraiba galliano suica landolt
Imagine-se em Genebra, depois de uma esticada de 12 horas desde a italiana Florença em busca da bem-amada. Ponha-se de mãos dadas com ela em passeio por um bairro tranquilo da cidade. Saudosos de casa, os dois param, perplexos, diante de um cineminha, em razão do letreiro: “Aujourd’hui, Paraíba mon amour”. Isso mesmo, expressões do mais legítimo forró paraibano nas telas da Suíça.

Pois isto aconteceu, de fato, com Marcílio Franca e sua Alessandra, ele numa rara folga do pós-doutorado em Direito pelo Instituto Universitário Europeu e, ela,
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Alessandra e Marcílio Franca
do doutorado em Direito Internacional, na Université de Gèneve. Nome do recinto: Cinéma Bio. Ingressos comprados, ambos verificaram na plateia uns dez, ou quinze suíços. Quase todos lacrimejavam ao reacender das luzes.

Diga-se de Marcílio – membro do Ministério Público de Contas com atuação no Tribunal de Contas da Paraíba – que é um cidadão do mundo. E que é uma referência internacional nos campos do Direito, do estudo e do ensino acadêmico. Você o encontra na lista de professores visitantes das Faculdades de Direito das Universidades de Pisa e Turim (ambas na Itália) e do Instituto de História do Direito de Ghent (Bélgica).

Não tente ir a fundo no seu perfil. É quase interminável. O homem é membro do Conselho Executivo da International Law Association (a Ila, com sede em Londres), é árbitro suplente do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul, é árbitro, ainda, da Court of Arbitration for Ar (a CAfA, de Rotterdam) e da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (a WIPO, de Genebra). A missão da ONU em Timor Leste o teve como consultor jurídico. E vamos parar por aqui.

Cinema Bio, Genebra
Pois bem, nos idos de 2008, por aí assim, Marcílio e Alessandra deixavam aquele cineminha com o coração aos pulos. E, então, mais orgulhosos do mar, das cores, dos sabores e de uma gente da qual o clima seco, o abandono institucional e o padecimento não retiraram um grama sequer do assombroso talento para a música, as letras e a poesia.

Inicialmente programado apenas para a televisão, “Paraíba, meu amor” logo chegaria à tela grande. Naquele ano, foi exibido na Alemanha e, também, no Festival de Montreux. Já em 2009, ganhou o Golden Reel Award de Melhor Musical, no Festival do Filme, de Tiburon, Califórnia.

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Assim mesmo, os xotes, os baiões e as toadas de Flávio José, Pinto do Acordeon, Aleijadinho de Pombal, os 3 do Nordeste, Amazan, Trio Tamanduá e Chico César nos palcos do mundo.

Com um medo desgraçado de avião, Dominguinhos recusou a viagem até a Europa. O jeito foi o francês Richard Galliano, acordeonista de fama mundial, vir até aqui, talvez, com um único desconforto: o testemunho de um quebra-pau dos diabos em forró de quinta categoria num desses pés de serra onde um sujeito deve ter mexido com a mulher do outro. Uma hora de filme e lá veio a consagração. Solenemente, Galliano pôs na cabeça o chapéu de couro entregue por Dominguinhos de quem também recebeu a missão: “Esse caboclo é, agora, embaixador do forró na Europa”. O documentário reúne esses dois sob o sol e a lua do Nordeste e intercala, do início ao fim, apresentações e entrevistas da Prata da Casa.

“Paraíba, meu amor” é fruto do encantamento do diretor suíço Bernard Robert-Charrue com os tons e os ritmos por ele conhecidos em 2005, quando se encontrava em Olinda. A produção – com auxílio de luxo do também suíço Pierre Landolt, ele mesmo convocado para uma fala curta – iniciou-se no ano seguinte.

F. Delay
Já falei por aqui de como eu conheci Pierre, no Alto Sertão paraibano, nos idos de 2015. O moço é caixa altíssima. À época, plantava romãs no Perímetro Irrigado de Sousa para o fabrico de remédio contra a depressão, com o perdão das nossas avós que sempre tiveram nesse fruto um santo remédio para as dores de garganta.

Pierre me falava com a autoridade de quem é sócio da Novartis, o quarto maior laboratório farmacêutico do planeta. Numa das edições de 2000, a Revista “Exame” contava que a Fundação Sandoz, criação familiar, controlava, em Genebra, o Banco Edouard Constant, a Interoute (empresa de telefonia atuante em onze países europeus) e a World Online International, um provedor de serviços de Internet criado na Holanda.

Patrocínio melhor para este saboroso documentário, então, não haveria. O patrocinador, além do dinheiro, tem um caso de amor bem antigo com a Paraíba, sua música e seus enredos. Algumas matérias de jornal o tratam como “o magnata dos Sertões”. As locações do filme, é bom lembrar, situam-se nas trilhas e veredas de Campina Grande, Pombal e Patos, há muito percorridas por esse europeu de alma sertaneja.


Ah, sim... Dias depois daquela sessão de cinema, Marcílio almoçava num restaurante local quando o garçom pediu, em voz alta, que alguém com o nome de Bernard se apresentasse a fim de atender o telefone. “Sou eu”, respondeu um homem que então se erguia da mesa ao lado para o atendimento requerido.

Era o próprio. De volta ao prato, o cineasta respondeu aos cumprimentos do fã paraibano e o conduziu à casa onde morava para o repasse de uns dez DVDs com cópias de “Paraíba, meu amor”. Não seria preciso dizer que vários conferencistas de renome internacional, gente digna dos grandes simpósios acadêmicos, passaram a receber parte dessas cópias de um Marcílio orgulhoso das origens: “Esta é a música da minha terra”.

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