Festejado por seus ensaios, crônicas, memórias, textos intimistas e artigos de crítica literária, Hildeberto Barbosa Filho 1 não é a...

O reino encantado de Hildeberto Barbosa Filho

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Festejado por seus ensaios, crônicas, memórias, textos intimistas e artigos de crítica literária, Hildeberto Barbosa Filho 1 não é apenas um consagrado prosador. Também escreve belos versos, através dos quais transmite aos seus muitos leitores os sentimentos e as mundividências que povoam sua fértil e inquieta imaginação.

O culto acadêmico já produziu mais de três dezenas de títulos de boa prosa e publicou aproximadamente vinte volumes de poesia. O tamanho de sua obra literária permite-me afirmar, sem temer contestações, que dedicou a maior parte de sua vida às letras.

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Hildeberto Barbosa Filho, poeta paraibano
Septuagenário e completamente lúcido, escreveu, em plena maturidade, e me franqueou a leitura do poema “Sarafim – reino encantado”, composto por dez estrofes que falam das lembranças de sua infância e adolescência.

Nos versos agora apresentados, encontramos os antepassados (pais e avós) do vate, seus primeiros amigos e amores, os animais de suas afeições, as paisagens das distantes auroras de sua existência no imóvel rural situado em Aroeiras, onde nasceu e viveu os primeiros anos.

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A terra natal do escritor fica no Cariri paraibano, uma região na qual a poesia teima em se apresentar, apesar da aridez da terra e da paisagem pedregosa. Provêm dali as memórias de seus primeiros anos de vida. Foi, efetivamente, do mágico ambiente do “Sarafim” que adveio sua inspiração para compor um poema recordando o sítio onde predominava, durante o dia, “a tirania do sol, reinando solitário, sobre a terra desolada”; o sítio transformado, durante a noite, numa “Odisseia estrelada” de livros fechados, que Hildeberto não lia, embora os vivenciasse em sonhos que permanecem vivos e influenciam seu lirismo. 3

O nome “Sarafim” carrega certo simbolismo. Pode ser compreendido como a cura final da alma do poeta, mas lembra também os serafins — ou seja, os arcanjos postos em torno do trono de Deus, para adorá-Lo incessantemente.

No poema, o “Sarafim” corresponde ao conjunto de imagens e representações da infância do poeta, das impressionantes descobertas que ele fez naquele período de sua vida, inclusive as relacionadas aos seus primeiros alumbramentos.

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Dessa forma, o “Sarafim” é o lugar que protege o reino encantado da infância e adolescência de Hildeberto, preservando-o vivo em sua memória.

No “Sarafim”, o poeta aprendeu algumas lições, pois descobriu que qualquer “Rosa”, apesar de seus encantos, carrega espinhos capazes de ferir e causar dores. No “Sarafim”, ele aprendeu que as pisaduras do amor podem ser suavizadas por atividades agradáveis. No “Sarafim”, montou no alazão “Soberano” e cavalgou até transformar a alimária em “poesia galopando ao vento” 4, com força suficiente para livrá-lo dos padecimentos amorosos.

Efetivamente, o poema revela que, na fazenda do avô, Hildeberto teve alegrias e tristezas, participou de festas e vivenciou momentos de solidão. Guardou na memória as emoções dessas experiências e manteve vivas essas lembranças. Agora as revela, explicando que:

“Tudo o que se foi e se perdeu / se fez o maior acontecimento.” 5

Artesão da linguagem, Hildeberto manejou bem as palavras, escreveu com cuidado os versos e os arrumou em estrofes, conseguindo
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elaborar um belo poema que emociona quem gosta de ler poesia.

Ensina-nos a Psicologia que a infância e o começo da adolescência são períodos cognitivos fundamentais. As interações e experiências dessas fases da vida influenciam a formação de nossa personalidade. As vivências de infantes e adolescentes ficam recolhidas em nosso inconsciente e sempre afloram como lembranças, boas ou más, de episódios inesquecíveis de nossa história pessoal.

Em nossa literatura, muitos poetas guardaram doces lembranças da infância e da adolescência, comunicando suas impressões aos leitores. Casimiro de Abreu, por exemplo, descreveu as saudades dos verdes anos de sua breve passagem pela Terra, destacando a beleza dos dias “do despontar da existência!”, quando sua alma ainda respirava “a inocência / como perfumes a flor...” 6

Hildeberto revelou saudades de seu reino encantado, saudades de seu “Sarafim”. Ao lembrar o sítio dos avós e os tempos de infante e adolescente, o poeta confessa a tristeza que sente porque nunca mais lá retornou; porque passou a ter medo de se “ver, ali, sufocado / pelo marasmo do meio-dia” do semiárido paraibano; porque o menino que foi “acabou tão depressa”; porque sua terra natal desapareceu tão depressa “na chuva, no vento, na escuridão do poema.” 7

REFERÊNCIAS 1 - Sócio efetivo da Academia Paraibana de Letras desde 19 de setembro de 1999, Hildeberto Barbosa Filho ocupa a Cadeira nº 6, patroneada por Aristides Lobo e fundada por Ivan Bichara Sobreira.
2 - Sócio efetivo da Academia Paraibana de Letras. Sucedeu Wills Leal na Cadeira nº 32, patroneada por Carlos Dias Fernandes e fundada por Ernani Sátiro.
3_7 - Trechos entre aspas são do poema de Hildeberto Barbosa Filho.
6 - Abreu, Casimiro. Meus Oito Anos. In: Os Melhores Poemas de Casimiro de Abreu. Seleção de Rubem Braga. São Paulo: Global Editora e Distribuidora Ltda., p. 34–36.


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  1. Excelente texto sobre o grande escritor, Hildeberto Barbosa Filho.

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  2. Texto à altura do autor e do homenageado. Parabéns, Eitel. Francisco Gil Messias.

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